Lucília Gago: até o sindicato do MP pede que a PGR se pronuncie.
Lucília Gago: até o sindicato do MP pede que a PGR se pronuncie.Gerardo Santos / Global Imagens

Madeira. PGR cada vez mais pressionada a dar explicações

Enquanto o diretor nacional da PJ dá explicações, a procuradora-geral da República, Lucília Gago, mantém-se em silêncio, face à absoluta discrepância entre a medida máxima que o MP pediu para os arguidos no inquérito na Madeira e a medida mínima decidida pelo juiz de instrução.
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Às pressões de advogados e do PSD, logo na quarta-feira, para a Procuradoria-Geral da República (PGR) dar explicações sobre o processo da Madeira, somaram-se ontem as dos sindicatos dos magistrados judiciais e do Ministério Público (MP). 

“A circunstância aconselharia, exigiria, a que a procuradora-geral da República aparecesse.” Ontem, Manuel Soares, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, defendeu, em declarações à Lusa e depois também na SIC-Notícias, que a cúpula do Ministério Público tem a obrigação de dar explicações sobre o que aconteceu no processo relativo às supostas relações perigosas entre o poder político e o poder empresarial na Madeira. 

Três arguidos - um políticos e dois empresários - estiveram 21 dias detidos em Lisboa sob suspeita de vários crimes (entre os quais corrupções mas também outros, conexos). Depois de interrogados, o MP pediu para eles prisão preventiva, mas o juiz de instrução, numa decisão radicalmente oposta, libertou-os, considerando que nos interrogatórios nada indiciou da parte dos três arguidos a prática de “qualquer crime”. 

“Deve ou não o MP, da forma que entender conveniente, explicar o que é que aconteceu? A meu ver, sim!”, declarou o desembargador Manuel Soares, argumentando em favor desta tese o facto de o diretor da PJ já ter por duas vezes explicado a espetacularidade das buscas efetuadas em 24 de janeiro na Madeira (dezenas de agentes da corporação viajaram entre Lisboa e o Funchal em dois C-130 da Força Aérea). Face à decisão judicial de quarta-feira, no seu entender “suscetível de criar alarme” social, era “importante que o MP tranquilizasse” as pessoas sobre a sua atuação com uma qualquer “intervenção comunicacional”, considerou ainda o presidente da Associação Sindical de Juízes.

Já o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Adão Carvalho, considerou, ouvido na SIC-Notícias, que não se pode ver a decisão do juiz de instrução - que desconsiderou em absoluto os argumentos do MP - como uma “vitória ou derrota”. 
“Não partilho essa maneira de ver a aditividade do MP ou dos juízes como vitórias ou derrotas”, considerou aquele magistrado, sublinhando que o processo está numa fase “muito preliminar” e que “uma decisão do juiz não é melhor nem pior do que uma decisão do MP nem do que uma da PJ”. E, além disso, acrescentou, “o Ministério Público é absolutamente escrutinado”: “Não há qualquer decisão do MP num processo que não seja escrutinada, mais do que esse escrutínio é difícil. E ainda existe o foro disciplinar e o foro classificativo, no Conselho Superior do Ministério Público. Não há dúvida nenhuma de que o Ministério Público é objeto de escrutínio.”

Contudo, um pouco mais tarde, em declarações à Lusa, Adão Carvalho acrescentaria: “O nosso entendimento tem sido de que se existe burburinho, se existe ruído, é importante que quem tem esse dever de informar no Ministério Público o faça.”

De resto, os dois magistrados manifestaram-se perplexos, em uníssono, com o facto de os três arguidos - o político do PSD Pedro Calado e os empresários Avelino Farinha e Custódio Ferreira - terem estado detidos 21 dias (no estabelecimento prisional da PJ em Lisboa) até o juiz de instrução lhes determinar a libertação. “Não é normal”, considerou o presidente do Sindicato do MP, enquanto o presidente da Associação Sindical dos Juízes falava do facto como sendo “perturbador”. Aliás, acrescentou, a lei até prevê que um interrogatório pode decorrer com os arguidos em liberdade (com pulseira eletrónica, por exemplo).

PJ defende-se

Quem também acha que são devidas explicações é o advogado Ricardo Sá Fernandes. Falando ao DN, acrescentou, no entanto, que as explicações tanto são devidas pelo MP - para explicar a discrepância entre a medida máxima que pediu e a medida mínima que o juiz decidiu - como pelo Conselho Superior da Magistratura, por causa da “absolutamente inaceitável” duração do período de interrogatório.

Apesar de pressionada - e logo na quarta-feira foi-o pelo PSD e por advogados - a procuradora-geral da República, Lucília Gago, manteve-se em absoluto silêncio.

O mesmo, porém, já não fez o diretor nacional da Polícia Judiciária. Luís Neves afirmou que a investigação policial no caso das suspeitas de corrupção na Madeira não fica “em xeque”, mas admitiu preocupação “face ao que era expectável”.

“Não, não coloca em xeque o nosso trabalho, sabemos o que estamos a fazer, estamos seguros no que estamos a fazer, estamos convictos e muito motivados no trabalho que temos vindo a realizar há anos nesta investigação. O que quero dizer e transmitir enquanto diretor nacional é a minha total confiança na equipa que investiga estes factos”, disse o diretor nacional da PJ, Luís Neves, em declarações aos jornalistas à margem da cerimónia de posse de 84 novos inspetores da PJ, que ontem decorreu na sede nacional da corporação, em Lisboa.

O diretor nacional da PJ expressou a sua “total confiança, segurança e serenidade” na investigação -, mas admitiu preocupação: “Estamos preocupados, naturalmente, face à operação que desencadeámos, face ao que era expectável, as decisões dos tribunais são para ser respeitadas, há mecanismos e o que é certo é que a investigação continua, sendo certo que não haverá aqui nenhuma decisão transitada em julgado.”.

Recordando que o MP já anunciou recurso das medidas de coação, disse também que o inquérito não está nem encerrado nem arquivado. “Isto acontece nas investigações e nos percursos. Investigar é um caminho, esse caminho vai ser feito sem que a PJ se desvie um milímetro dos seus objetivos, que é esclarecer a verdade”.

Segundo acrescentou, face ao que “sabe hoje”, voltaria a desencadear a operação na Madeira sem mudar nada, fazendo tudo “de igual forma”, uma vez que, defendeu, “os objetivos foram alcançados”. “Quero reiterar que fizemo-lo com total sigilo, com total segurança e com eficácia de documentação que foi apreendida e que é muito relevante”, disse ainda o diretor nacional da Polícia Judiciária.

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