SEF falha financiamento europeu e obriga a fazer ajuste direto de 25 milhões de euros
O governo em gestão autorizou um ajuste direto de 25 milhões de euros para adquirir um novo sistema de segurança para as fronteiras, cujo financiamento estava aprovado pela Comissão Europeia mas não foi executado pelo extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
A decisão foi aprovada numa Resolução de Conselho de Ministros (RCM) publicada em Diário da República na segunda-feira, 4 de março, depois de ter sido assinada pelo primeiro-ministro em funções, António Costa, a 22 de fevereiro, autorizando “a despesa com a aquisição de hardware e software necessários à implementação do projeto Smart Boarders”.
O governo argumenta que “no atual contexto, a União Europeia (UE) encontra-se numa fase crucial de implementação dos sistemas de informação integrados no âmbito do projeto das fronteiras inteligentes (Smart Borders) do Espaço Schengen, entre os quais se incluem os Sistema de Entrada/Saída (SES) e o Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS), e que visam reforçar a segurança interna e a gestão dos fluxos migratórios na União Europeia”.
O ETIAS deverá ser lançado em 2025, depois de sucessivos adiamentos (já esteve previsto para 2020, 2022 e 2023). Será obrigatório para nacionais de países terceiros isentos de visto para o espaço europeu, válido por três anos, que passam a ter de preencher antecipadamente um formulário online, cujos dados são verificados e cruzados com bases de dados da União Europeia (UE) e da Interpol para determinar se existem motivos para a recusa de entrada.
Um visto Schengen, em contraste, é exigido para viajantes de países não isentos de visto, envolve um processo detalhado de solicitação consular e é normalmente válido para viagens específicas de 90 dias.”
O SES é um sistema eletrónico que registará e armazenará as informações sobre a entrada, a saída e a recusa de entrada destas pessoas, através de um controlo automático que substituirá os carimbos manuais nos passaportes.
Esta nova legislação faz parte do pacote “fronteiras inteligentes”, que realça o papel dos sistemas de informação no reforço da gestão das fronteiras externas, na segurança interna e na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada. A Agência Europeia para a Gestão Operacional de Sistemas Informáticos de Grande Escala no Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça (eu-LISA) é a entidade responsável pela sua execução.
Os custos para cada estado-membro desenvolver os componentes nacionais do ETIAS e do SES foram suportados pelo orçamento geral da UE, sendo que as verbas começaram a ser disponibilizadas no âmbito do quadro plurianual do Fundo de Segurança Interna (FSI) para o período 2014-2020. Os montantes diferenciaram-se em função de fatores como a extensão da fronteira externa, o número de pontos de passagem de fronteira ou o número de pessoas que os atravessam.
Portugal viu aprovado, logo em 2020, o valor de 9.625.064 milhões de euros, uma comparticipação a 100% para as candidaturas apresentadas pelo ex-SEF para o ETIAS (3.216.564 euros) e o para o SES (6.412.500), mas que nunca chegaram a ser executados, deixando o país numa situação de atraso para o desenvolvimento destes sistemas.
O DN questionou o ministério da Administração Interna, cuja secretaria-geral é responsável pela gestão dos fundos comunitários, designadamente este FSI, sobre o motivo desta falha, mas não obteve qualquer resposta. O valor terá de ser devolvido na totalidade a Bruxelas.
O organismo que herdou a responsabilidade desenvolver as “fronteiras inteligentes” foi o Sistema de Segurança Interna (SSI), que juntou na Unidade de Coordenação de Estrangeiros e Fronteiras (UCFE) todos estes sistemas que eram do SEF, ficando a UCFE com a responsabilidade pela gestão das bases de dados e sistemas de informação.
Quando em outubro de 2023 o SEF foi oficialmente extinto, o financiamento europeu para o ETIAS e o SES não tinha sido executado e nada tinha avançado no desenvolvimento dos sistemas.
Reconhece a RCM que a referida fase de implementação “apenas em outubro de 2023 e fruto de diversos condicionalismos, entre os quais os decorrentes da pandemia da doença COVID-19, viu confirmado o seu novo calendário e os requisitos finais para a respetiva interoperabilidade” e que “este processo veio também coincidir com a reestruturação do sistema português de controlo de fronteiras”.
Por entender ser “crucial que Portugal continue a garantir no Espaço Schengen a capacidade de controlo das fronteiras externas da UE” e por considerar ser “manifesta a urgência a realização da despesa, com a aquisição de hardware e software com vista à implementação e ou atualização dos sistemas europeus de informação em matéria de fronteiras e estrangeiros”, o executivo autorizou que a secretaria-geral da Presidência do Conselho de Ministros gastasse 25 milhões de euros - um valor duas vezes e meia mais elevado que o aprovado pela UE para o SEF - por ajuste direto.
Segundo a RCM, a Comissão Europeia está agora “a avaliar a possibilidade de conceder a Portugal um contributo financeiro, através do mecanismo Top-Up, para o lançamento e implementação nacional daqueles sistemas, decisão que deverá ser tomada em breve”.
Ao que o DN soube junto a fontes que trabalham com fundos europeus, este mecanismo é excecional, não é garantido a 100% e depende do entendimento da Comissão sobre se está em causa uma matéria de interesse estratégico europeu.
Questionada também a representação da Comissão Europeia em Portugal sobre qual poderia ser o “contributo” esperado do mecanismo Top-Up, não respondeu em tempo útil.