Jovem de 15 anos pediu asilo político em Portugal, por medo de ser morto no Senegal.
Jovem de 15 anos pediu asilo político em Portugal, por medo de ser morto no Senegal.Foto: Amanda Lima

AIMA deixa dois menores imigrantes desacompanhados na rua

Tradutora e advogada afirmam que, durante o atendimento, foi assegurado que iriam para um centro de acolhimento.
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Dois menores desacompanhados foram deixados na rua em Lisboa, ontem, após entrevista conduzida pela Agência para as Migrações, Integração e Asilo (AIMA). De acordo com a legislação, todos os requerentes de asilo menores de 18 anos precisam de receber acolhimento. Em causa estão dois menores senegaleses de 15 e 16  anos (o aniversário do mais velho foi há 3 dias), que fugiram do país por conta da instabilidade política. 

A advogada Erica Acosta, que atua voluntariamente em favor dos refugiados, afirma que “nunca havia visto nada igual”. A profissional relata ter acompanhado a entrevista na tenda montada pelas autoridades no largo da Igreja dos Anjos, em Arroios. “Foi dada a garantia de que eles teriam um acolhimento hoje [ontem] e nós até nos colocamos à disposição para ir acompanhar, porque eles estão muito traumatizados”, conta ao DN. No entanto, às 17h, as técnicas foram embora e deixaram os menores sem resposta e sem acolhimento.

Segundo Erica, estavam na hora do atendimento duas técnicas da AIMA, duas da Santa Casa de Misericórdia e a tradutora voluntária Sadjo Nanque. Sadjo foi chamada pela advogada, porque a AIMA só ofereceu uma tradutora de francês via telefone e numa linha instável que “caía a toda hora”. De acordo com Erica, o único idioma que os senegaleses dominam é o wolof, principal  língua falada no país. 

O DN já havia questionado a AIMA sobre a presença de tradutores na condução dos atendimentos, mas não teve resposta. As voluntárias afirmam que é “essencial” a entrevista num idioma que o utente domine. “Vimos aqui na tenda muitos casos de entrevistas sem tradutores, eles não entendem e isso põe em causa as respostas  e o resultado do pedido”, explica Erica.  

Comer, dormir e estudar


Segundo o relato feito à tradutora voluntária, os jovens alegaram que ficar no Senegal não era uma opção. “Eles enfrentavam perigo lá pela violência política e arriscaram vir de barco até a Europa”, relata Sadjo.

Os jovens conheceram-se em Lisboa e estão sem abrigo no largo da igreja há cerca de dois meses, juntamente com outras dezenas de imigrantes de várias nacionalidades. “Um deles disse-me que só quer comer, dormir e estudar”, afirma a tradutora.  Os jovens ficam o dia todo sem comer, sendo a única refeição oferecida por voluntários que visitam o local todas as noites com comida. Ambos relatam estar com medo e que não querem mais ficar na rua. 

A advogada dos casos diz que os dois menores já haviam feito pedidos de asilo como se fossem adultos, “por medo” e sem acompanhamento jurídico. Agora, com assistência profissional, relataram que são menores e mostraram a certidão de nascimento, uma delas vista pelo DN. 

Em resposta ao jornal, a AIMA refere a situação da disparidade dos pedidos, nomeadamente em relação às idades, e que já haviam sido feitos dois pedidos, em janeiro e maio. A entidade também adiantou que na noite de ontem iria remeter as informações “às autoridades competentes para apuramento de eventual prática de infrações de natureza criminal”.

Sobre o acolhimento, a AIMA explica que é um procedimento assegurado pela Segurança Social, “num trabalho conjunto e articulado com várias entidades, onde se inclui a AIMA”. Numa cartilha publicada pelo antigo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), com base na legislação ainda em vigor, pode ser solicitada uma perícia para atestar a idade em caso de dúvidas e deve ser assegurado o acolhimento durante o trâmite do processo. A mesma lei refere que menores com idade superior ou igual a 16 anos podem ficar em centros com adultos. Até ao fecho desta reportagem, voluntários no largo da igreja buscavam alternativas para que os jovens não dormissem na rua.

amanda.lima@globalmediagroup.pt

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