Depois do caos durante o verão, em que houve serviços de urgência encerrados de norte a sul do país, por falta de recursos, a Direção Executiva do SNS lançou um Plano de Inverno, em novembro, onde apelava às Unidades Locais de Saúde (ULS) para assumirem compromissos de gestão com as Unidades de Saúde Familiar (USF - antigos centros de saúde) que tutelam, para darem resposta em termos de cuidados de proximidade e aliviarem as urgências hospitalares durante o período das festas natalícias e todo o inverno..A resposta está a ser dada e neste momento já há 231 centros de saúde que vão funcionar no modelo de horário prolongado, durante mais de dois meses, até às 20h00, 24h00, sábados, domingos e feriados. .Os horários definidos estão dependentes da “capacidade de resposta de cada USF e das necessidades de cada população”, explicaram ao DN. “O objetivo é dar resposta nos cuidados de proximidade aos utentes, quer residentes ou outros que tenham de se deslocar para outras zonas devido às festas, em época de infeções hospitalares, e não sobrecarregar as urgências”, destacou ao DN fonte da Saúde. .O DN sabe que até ao final de fevereiro há 231 centros de saúde que vão estar abertos ao sábado, 198 ao domingo, 189 nos feriados, 32 a funcionar após as 20h00 aos fins de semana, 48 após as 20h00 nos dias úteis, 15 abertos durante 24 horas aos fins de semana e, por fim, oito que estarão abertos as 24 horas nos dias úteis..Os modelos de funcionamento foram acordados entre as ULS e as USF que tutelam e que vão estar neste modelo, ficando as equipas a trabalhar em regime de horário prolongado e recebendo como tal. A mesma fonte reforça ao DN “a importância de o utente conhecer as alternativas e ligar previamente para a linha SNS 24 (808 24 24 24) para aconselhamento e encaminhamento para a unidade de saúde dos cuidados primários mais adequada”..Estes 231 centros de saúdes, que fazem parte de um conjunto de 940 unidades de cuidados primários existentes no país, sendo que 673 são USF e 267 Unidades de Cuidados Personalizados, já começaram a funcionar neste modelo esta semana. Mas a verdade é que já há algumas unidades que funcionam com este modelo durante o ano inteiro. Ou seja, e segundo explicaram ao DN, “haverá 231 centros de saúde a funcionar com horário prolongado, já que cerca de uma centena funcionam em horário prolongado até às 20h00 durante o ano inteiro, e aos fins de semana e 39 têm mesmo uma urgência básica”..O presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), Nuno Jacinto, confirma ao DN que a sua ULS, Alentejo Central, “já tem cuidados primários com horário alargado durante a semana e ao fim de semana durante o ano inteiro”. .No entanto, alerta para o seguinte: “O importante é que esta medida não seja imposta e nem seja alargada a todo ao país sem se planear a nível local. Quando se tomam estas decisões é preciso pensar nos recursos que existem em cada USF e na resposta que é necessária para cada população, que pode variar de acordo com a localização”, alerta Nuno Jacinto. Se não for assim, argumenta, “é mais uma solução que funcionará como um ‘penso rápido’”, questionando mesmo como é que as regiões com mais falta de recursos humanos, como Lisboa e Vale do Tejo e Algarve, conseguirão fazer face à necessidade de prolongar horários..Estuário do Tejo tenta dar resposta a mais de 100 mil utentes sem médico.Até ao fim de novembro havia no país 1,536 milhões de utentes sem médico de família, segundo dados oficiais - no verão, eram 1,7 milhões, mas, Nuno Jacinto explica que “o número pode ter diminuído devido ao número de colegas que entretanto foram colocados”..Mas como é que uma ULS da região de Lisboa e Vale do Tejo, como a do Estuário do Tejo, que integra cinco concelhos da Grande Lisboa - Vila Franca de Xira, Arruda dos Vinhos, Azambuja, Benavente e Alenquer -, sem recursos humanos consegue entrar neste modelo de horário prolongado ou dar resposta aos utentes sem médico de família? Medina do Rosário, diretor clínico dos cuidados primários desta ULS, responde, assumindo sem problema que, “infelizmente, somos a maior ULS do país com o maior número de utentes sem médico”, mas, salvaguarda, “estamos a pôr em prática várias soluções para dar resposta a quem necessita de cuidados”. .Medina do Rosário refere que a ULS do Estuário do Tejo “serve cinco concelhos, nos quais a totalidade de utentes inscritos atinge os 238 525, mas 119 670 não têm médico de família e a resposta a estes utentes é a nossa principal dificuldade, porque o não ter médico não pode significar que não têm cuidados”. .Por isso mesmo, definiram um plano de contingência para esta época e para o inverno e estão já a funcionar em modelo de horário prolongado, destacando que “aos utentes que têm médico de famílias as USF já conseguem dar resposta dentro do seu horário de trabalho, entre as 8h00 e as 20h00”, havendo até algumas que já funcionam durante o ano todo em prolongamento, como “Samora Correia, que tem um prolongamento de horário até às 22h00, e Vila Franca de Xira, que tem atendimento complementar. Em Benavente, este atendimento complementar funciona as 24 horas. Nos outros locais, o que estamos a fazer é que o atendimento complementar vai sendo definido de acordo com as necessidades: começámos com um atendimento das 9h00 às 13h00, já foi prolongado até às 15h00, vamos ter até às 18h00 e está previsto estendermos até às 22h00”, afirma, sustentando que “todas as respostas definidas no âmbito do plano de contingência para o inverno são adaptadas à afluência às urgência hospitalares e à gravidade das situações”..Ou seja, “aumentamos a resposta nos cuidados primários para conseguirmos libertar a urgência do hospital de Vila Franca de Xira quando esta está com um grande afluxo de utentes. Portanto, a resposta é flutuante, de acordo com as necessidades. E tudo é gerido diariamente e semanalmente nas reuniões de equipa hospitalares e dos cuidados primários para que haja uma melhor articulação do cuidados”. .Segundo o diretor clínico dos cudiados primários, a ULS de Estuário do Tejo também já pôs em prática um programa de videoconsultas para situações de doença aguda e até de consultas programadas para utentes sem médico de família, mas através da contratação de médicos prestadores de serviço”, pois “não temos recursos humanos na ULS”, embora especifique que “estes prestadores de serviços, que são contratados através de empresas, trabalham connosco há largos meses”..O médico faz ainda referência a outros protocolos, nomeadamente com as misericórdias, através dos quais têm o projeto Batas Brancas, também para dar apoio aos utentes sem médico. Por outro lado, diz, “estamos a contratualizar através de um mecanismo recente, que se chama Carteiras Adicionais, e que são acordos com as USF para que elas próprias assumam a contratualização de profissionais para dar resposta às suas necessidades. Portanto, da mesma maneira que pagamos a prestadores de serviços, está a fazer-se contratualização adicional que vai privilegiar o apoio aos utentes sem médico”. Em termos de balanço, o diretor clínico dos cuidados primários diz que desta forma “já conseguimos dar uma resposta acrescida de 375 consultas em doença aguda”, destacando que esta ULS já aderiu ao programa Ligue, Salve Vidas, que permite a referenciação para os cuidados primários dos doentes triados com pulseira azul e verde..Coimbra vai ter horário alargado, equipas reforçadas e dois CAC.Na região Centro, o presidente da Unidade Local de Saúde de Coimbra, Alexandre Lourenço, explica ao DN que “todos os 26 centros de saúde vão ter horário alargado”. O modelo definido inclui quatro horários e está relacionado com os níveis de gravidade das situações, nomeadamente infeções respiratórias, e do seu nível de propagação na região..“No nível 1, que é para responder a baixa propagação dos vírus respiratórios, vamos ter todos os centros de saúde abertos até às 20h00. No nível 2, já vão estar abertos até às 20h00 e aos sábados de manhã. No nível 3, estarão abertos até às 22h00 e aos sábados, no nível 4 acrescentamos o horário de domingo. Na prática, o nosso objetivo é ter o alargamento dos horários ajustado à procura e aos tempos de espera”, explica Alexandre Lourenço. .Questionado sobre se há recursos para isto, Alexandre Lourenço refere que “a organização da resposta está a ser feita através da contratualização de profissionais pelo programa Carteiras Adicionais, que a ULS acordou com as USF”, especificando: “A ULS contratualizou com as USF o alargamentos de horários ajustados à procura e as equipas vão ser pagas de acordo com a tabela para prolongamento de horário”. .O presidente da ULS Coimbra, a qual integra uma das maiores urgências hospitalares do país, que recebe em média cerca de 700 casos por dia, reconhece também que a maior dificuldade é a resposta aos utentes sem médico de família - “ainda temos cerca de 9%” -, já que dentro da própria cidade a esmagadora maioria dos utentes tem médico de família. “O problema são os outros concelhos”. .Por isso, foram abertos dois Centros de Atendimento Clínico (CAC), um em Cantanhede e outro em Avelar, e estabelecido um acordo com uma fundação em Oliveira do Hospital para fazer face a situações de doença aguda dos utentes. Nos dias 26 de dezembro e 2 de janeiro, as próprias urgências hospitalares são reforçadas em número de equipas. O administrador insiste também que o utente deve sempre ligar para primeiro para a Linha SNS 24 para “ser reencaminhado corretamente”, lembrando que com os CAC já estão a conseguir reduzir cerca de 100 consultas por dia nas urgências hospitalares..Recorde-se que a ministra da Saúde anunciou na quarta-feira que as ULS têm mecanismos para poderem contratar recursos humanos e encontrar soluções para responderem ao aumento da procura durante o inverno. E o diretor executivo continua a apelar à população para que ligar para a Linha SNS 24 antes de se dirigir a uma urgência.