O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, imitando o que outros ministros europeus fizeram na sequência da morte, tremendamente suspeita, de Alexei Navalny, opositor do presidente russo Vladimir Putin, chamou o embaixador da Rússia ao seu ministério para que fossem prestados esclarecimentos... Muito bem!.O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, que se saiba, ainda não chamou ao seu ministério o embaixador de Israel no nosso país para pedir esclarecimentos sobre a morte de 10 mil a 30 mil civis (conforme as fontes) e o valor de quase dois milhões de deslocados, imensas vítimas inocentes provocadas pela retaliação de Israel ao ataque do Hamas de 7 de outubro que, por seu lado e perante indignação geral, matou 1200 pessoas... Muito mal!.Note-se que, no caso da Palestina, aos mortos e deslocados acrescenta-se uma situação humanitária catastrófica em Gaza: faltam ali medicamentos, comida, água, combustível e os hospitais estão em colapso, como vemos, todos os dias, nas TV..A União Europeia (e Portugal por arrasto) está a tornar banal a utilização contraditória do argumento da Defesa dos Direitos Humanos para tornar efetivas as decisões políticas mais desumanas da sua história, contrariando claramente a sua retórica oficial..Para além das sanções e das denuncias de violações de Direitos Humanos só se fazerem se forem cometidas pelos “inimigos do Ocidente” e se ignorarem ou escamotearem as que são cometidas por “Aliados” - e o caso da brandura inconsequente com que os Governos europeus analisam o que Israel tem feito é o exemplo mais pungente de como a hipocrisia política mata -, a própria União Europeia começa a tornar legal, dentro do seu próprio território, a violação de Direitos Humanos..Temos agora o exemplo noticiado há dias de um texto que está pronto para ser aprovado em abril pelo Parlamento Europeu e que preconiza uma série de medidas severas para conter a imigração..Uma dessas medidas chega ao ponto de prever que crianças, de qualquer idade, acompanhadas ou não pelas famílias, e que sejam requerentes de asilo, podem ser presas durante três meses desde que os estados que as recebam as declarem “perigos para a segurança nacional”, numa violação que a muita gente parece clara da Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Crianças..Numa notícia sobre isso que li no jornal Público diz-se que esse Pacto sobre Migração e Asilo prevê ainda a recolha de dados biométricos, como impressões digitais, a partir dos 6 anos de idade, e permite o recurso à “coação” contra crianças que se recusem a deixar recolher os seus dados..Mais: as crianças podem ser devolvidas livremente ao país de origem desde que ele seja considerado um “país seguro” e nessa lista incluem-se países com problemas de perseguição a minorias ou com situações de violência social frequente, como a Tunísia, Turquia, Albânia ou Índia..Outro dado inaceitável: os irmãos já não contarão para figurar em processos de reunificação de famílias, só os pais - se estes não estiverem presentes, os irmãos podem ser separados..Estamos, portanto, a autorizar que um dia possa haver na União Europeia campos de concentração de crianças refugiadas ou requerentes de asilo... o antigo presidente norte-americano Donald Trump deve estar a rir-se do que os europeus disseram dele quando tentou fazer algo similar na fronteira com o México..É tristemente significativo que nos debates eleitorais das últimas semanas as grandes questões internacionais, apesar de o mundo estar a arriscar-se a um conflito global, tenham ficado quase completamente ausentes das discussões entre líderes partidários - o medo de analisar seriamente o desvario atual é a prova da reduzida estatura política da maioria dos intervenientes..Por outro lado, o fechar de olhos e a recusa em vetar os cada vez mais frequentes abusos da União Europeia em matéria de Direitos Humanos - com que a mesma UE enche a boca para condenar o resto do mundo - é a demonstração da cobardia prevalecente nos palácios do poder, nossos e da restante Europa “democrática”.