Donald Tusk
Donald TuskBrendan SMIALOWSKI / AFP

Tusk avisa que Europa está em pré-guerra: “Não vivíamos uma situação assim desde 1945”

Numa entrevista a vários jornais europeus, primeiro-ministro polaco diz que não exagera no cenário que traça, defendendo que é preciso deixar de discutir, ajudar os ucranianos e prepararmo-nos para o que a Rússia pode fazer.
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O primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, alertou numa entrevista a vários jornais europeus que a Europa vive “numa situação de pré-guerra” e atravessa o seu momento mais crítico desde o final da II Guerra Mundial. “Não vivíamos uma situação assim desde 1945”, afirmou, deixando claro que não está a exagerar e que não há razão para os europeus não cumprirem a meta da NATO de gastar 2% do seu PIB em Defesa (a Polónia gasta 4%). O alerta de Tusk surge numa altura em que a Rússia retomou em força os bombardeamentos contra as infraestruturas ucranianas e insiste em acusar Kiev de ser responsável pelo atentado, reivindicado pelo Estado Islâmico, que matou 143 pessoas em Moscovo.

“No último Conselho Europeu mantive uma interessante discussão com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez. Pediu-nos que deixássemos de utilizar a palavra guerra nas declarações. Argumentou que as pessoas não querem sentir-se ameaçadas desta maneira, que na Europa soa abstrato”, contou Tusk. “Respondi-lhe que na minha parte da Europa a guerra não é uma abstração e que o nosso dever não é discutir, mas agir e prepararmo-nos para nos defendermos”, indicou. A entrevista foi dada ao consórcio da Aliança Europeia de Jornais Líderes (LENA, na sigla em inglês), do qual fazem parte oito jornais, entre eles o espanhol El País, o francês Le Figaro ou o italiano La Repubblica.

“Não vivíamos uma situação assim desde 1945. Sei que soa devastador, sobretudo para a geração mais jovem, mas temos de nos acostumar mentalmente a uma nova era. Estamos numa época de pré-guerra. Não exagero. Cada dia é mais claro.” O primeiro-ministro recordou a foto que tinha na sua casa de infância em Sopot, onde se via a praia do Mar Báltico cheia de pessoas sorridentes. A foto foi tirada a 31 de agosto de 1939: “Uma dezena de horas depois, a cinco quilómetros, começou a II Guerra Mundial.”

Tusk defendeu ainda que o mundo tem de abandonar a ideia de pensar o que vai acontecer se a Ucrânia perder a guerra. “A nossa principal tarefa deve ser proteger a Ucrânia da invasão russa e manter o país como um Estado independente e integral. De nós depende que se possam evitar os cenários pessimistas”, explicou. Mas acabou por falar desse cenário: “Se não podemos apoiar a Ucrânia com equipamento e munições suficientes, se a Ucrânia perde, ninguém na Europa poderá sentir-se seguro.”

A hipótese de Moscovo ter ideias expansionistas para lá da Ucrânia não é nova, com o presidente russo, Vladimir Putin, a dizer que é “completamente absurdo” pensar que quer atacar qualquer país da NATO. Mas mesmo antes de invadir a Ucrânia, a Rússia insistia que as denúncias nesse sentido eram apenas “propaganda ocidental”.

O primeiro-ministro polaco, que regressou em dezembro ao cargo que já tinha ocupado entre 2007 e 2014 e que abandonou para ser presidente do Conselho Europeu até 2019, admitiu que possa ser necessário pensar na guerra a longo prazo e que “os próximos dois anos vão decidir tudo”. Tusk deixou ainda claro que “não há nenhuma razão para que os europeus” não gastem um mínimo de 2% do PIB em Defesa, como prevê a NATO.

Independentemente de quem ganhar as presidenciais de novembro nos EUA, “é a Europa que tem de fazer mais em matéria de Defesa”, afirmou Tusk. “Não para conseguir autonomia militar frente aos EUA, nem para criar estruturas paralelas frente à NATO, mas para aproveitar melhor o nosso potencial, as nossas capacidades e a nossa força.”

Seis para um

A Ucrânia admitiu ontem que as suas forças estão aquém das russas. “Há alguns dias, a vantagem do inimigo em termos de munições disparadas era de cerca de seis para uma”, disse o novo comandante-em-chefe das Forças Armadas ucranianas, Oleksandr Syrskyi. “As forças de defesa estão agora a desempenhar tarefas ao longo de toda a longa linha da frente, com poucas ou nenhumas armas e munições”, alertou, dizendo que a situação era “tensa” em algumas zonas.

Numa entrevista à Ukrinform, Syrskyi disse ainda que os russos “aumentaram significativamente a atividade da aviação”, usando também bombas guiadas para destruir as posições ucranianas. O comandante-em-chefe admitiu que a Ucrânia perdeu território que podia ter mantido com mais apoio. “Não conseguimos ter maior sucesso na ofensiva de Kharkiv porque não tínhamos recursos”, referiu, dizendo esperar receber dos parceiros mais sistemas de defesa aérea e mísseis. “Ficaríamos ainda mais gratos se esta ajuda chegasse rapidamente e em quantidade suficiente.”

O Congresso dos EUA, controlado pelos republicanos, ainda não aprovou o pacote de ajuda prometido pelo presidente Joe Biden a Kiev, no valor de 60 mil milhões de dólares. Entretanto, a Rússia prossegue os bombardeamentos, tendo atingido ontem hidroelétricas ucranianas com drones e mísseis.

susana.f.salvador@dn.pt

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