O alargamento do número de beneficiários da tarifa social dos atuais 110 mil para um milhão de famílias, tal como anunciado pelo governo na segunda-feira, não será pago pelos restantes consumidores, mas pelas empresas. Ou seja, fica tudo como está agora..O problema pode ser o Apoio Social Extraordinário ao Consumidor de Energia (ASECE), que, segundo a proposta do Bloco de Esquerda (BE), deixaria de estar inscrito no Orçamento do Estado (OE) e passaria a ser pago pelas empresas. Ou apenas pela EDP, como referiu a líder do Bloco, Catarina Martins..Mas vamos por partes. Hoje, a tarifa social já é paga pelos privados, mais precisamente pelos produtores de eletricidade, ou seja, pela EDP e pela espanhola Endesa, que são as duas únicas que têm centrais elétricas no país. E por isso é que o montante a pagar não é diluído pelos restantes clientes que não têm tarifa social: os produtores estão num mercado ibérico e se aumentassem o custo da energia corria-se o risco de se começar a comprar mais eletricidade a Espanha..Se fossem as comercializadoras de eletricidade, tanto a da Endesa como a EDP Serviço Universal e a EDP Comercial, a pagar diretamente a tarifa social, então esta já poderia ser cobrada aos restantes consumidores..E é precisamente por isso que é preciso saber de que forma é que o governo pensa passar o ASECE - que segundo o BE pesa seis milhões nos cofres públicos - da esfera do Estado para os privados. Se ela for paga pelos produtores como a tarifa social então não há margem para passar para os restantes consumidores, mas se for pago pelos comercializadores já pode passar, como se explica antes..Mais resolvida está a questão dos beneficiários da tarifa social de gás, que eram 12 579 no final de 2015, segundo dados do regulador. Neste caso, as empresas não pagam nada e quem paga, na conta mensal, são todos os outros contribuintes que não são beneficiários deste apoio..EDP é a que paga mais.O tema da tarifa social deverá ser hoje debatido e esclarecido na especialidade na comissão de economia, mas de acordo com as declarações de Catarina Martins tudo indica que não haverá quaisquer repercussões para o público, apenas para as empresas e a EDP seria a mais penalizada. Não só porque passaria a pagar o ASECE, mas porque na tarifa social o montante a pagar é proporcional à quota de mercado, ou seja, quem tem mais potência instalada paga mais, e neste caso é a EDP..Contactada, a empresa liderada por António Mexia não faz quaisquer comentários, mas o analista Jorge Guimarães, do banco de investimento Haitong (ex--BESI), desvaloriza o impacto. "Mesmo que os seis milhões [do ASECE] sejam pagos inteiramente pela EDP, isso representaria apenas 0,65% das nossas estimativas para os lucros de 2016", disse numa nota de análise publicada ontem. O problema é que não só é preciso juntar o alargamento do número de beneficiários como estes seis milhões de euros também aumentam se aumentarem o número de beneficiários..Pelas contas do DN/Dinheiro Vivo, no ano passado os cerca de 109 mil beneficiários da tarifa social de eletricidade terão custado às empresas perto de sete milhões de euros, dos quais cerca de 6,4 milhões foram cobrados à EDP, que tem cerca de cem mil clientes nesta situação..Ora, segundo a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), se se chegasse aos 500 mil beneficiários que estavam previstos pelo governo anterior isso custaria às empresas 32 milhões de euros em 2016. E, pelas contas do Bloco, se se chegar a um milhão o impacto será de cem milhões de euros.