Portas terá a tentação de "corrigir" ou "interferir" no CDS

O ex-líder do CDS Manuel Monteiro olha para o novo ciclo centrista com alguma apreensão. No projeto político enunciado por Assunção Cristas, de mero pragmatismo, encontra riscos de erosão do partido
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"A ideia de um partido de total pragmatismo, sem conteúdo ideológico, apenas preocupado com a resposta imediata aos problemas das pessoas, sem uma identidade de marca, é prejudicial", diz ao DN.

Afastado do CDS há mais de uma década, Monteiro reconhece que o posicionamento do partido ao centro começou já no governo de coligação, mas sublinha que o facto de ter tido uma liderança marcante e carismática, a de Paulo Portas, "atenuou essa lógica do abraço do urso". Um abraço em que o PSD, partido maior, teria "esmagado" o mais pequeno, o CDS.

Entende, por isso, que num momento de transição de uma liderança forte para a de uma que ainda terá que se afirmar, seria preciso "dar substância política ao CDS". O agora professor universitário, que ainda se afirma "soberanista", é um adepto de partido mais conservador ao jeito do inglês.

Em tom de aviso, numa alusão ao fim da coligação PSD/CDS, recorda que, quando a AD acabou no final de 1982, o CDS começou a definhar. Nas legislativas de 1987, o partido só conseguiu eleger quatro deputados e nas eleições de 1991 outros cinco, o que lhe deu a designação de "partido do táxi".

"É um desafio para a líder ter consciência dessa memória, porque ela não fez parte do passado do CDS", afirma Monteiro . Um desafio tão grande como o de resistir à eventual tentação que Paulo Portas terá para "corrigir" ou até "interferir" na vida do CDS. A Assunção Cristas, diz, também vai enfrentar esse desafio imediato, o de ganhar a liderança, porque ser eleita presidente do partido não garante essa conquista. "Ela vai ser presidente porque um líder não quis continuar [Portas] e outro militante não quis avançar [Nuno Melo]", acentua.

Manuel Monteiro - que liderou o CDS entre 1992 e 1998 (altura em que entrou em rutura com Paulo Portas e com o qual se cruzou a última vez quando ainda era ministro da Defesa de Durão Barroso) - parece não acreditar no afastamento total do ex-vice-primeiro-ministro da política. "Não sei o que quer fazer, mas ele é daquelas pessoas que tem uma inteligente capacidade de assumir que estava errado aquilo que convictamente defendeu no passado".

Na sua ótica, Portas abandonou a liderança do CDS porque percebeu que a permanência de António Costa no poder não dependia da sua capacidade de oposição, mas apenas de eventuais desentendimentos internos [entre parceiros do acordo de governo] ou por pressão da Europa. Defende ainda que o líder cessante do CDS "procurou condicionar Passos Coelho, dando-lhe um sinal evidente de que se daqui a um ano, ano e meio, não conseguir reconquistar o poder terá que abandonar também a liderança do PSD. "E na altura escrever-se-á que Passos seguiu o caminho de Portas".

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