Passos recandidata-se "a primeiro-ministro" com discurso de redenção

De passado resolvido e com os olhos no futuro, líder do PSD diz que quer voltar ao cargo que há pouco tempo era seu. Em jeito de recado aos críticos do passismo, sublinha que não se desviou da social-democracia
Publicado a

É da história: um candidato à liderança do PSD é sempre candidato a chefe do governo. E foi isso que Pedro Passos Coelho anunciou esta quinta-feira, em Lisboa, quando confirmou que quer estar mais dois anos ao leme do barco social-democrata. "Candidato-me à liderança do PSD e, portanto, sou naturalmente candidato a primeiro-ministro", afirmou o antecessor de António Costa em São Bento.

Bem resolvido com o passado, Passos ensaiou um discurso de redenção. Não como quem pede desculpa por um mal que deliberadamente cometera, mas de quem foi forçado a lançar mão de medidas duras a contragosto. Até em prejuízo da própria imagem. A austeridade, disse, não foi resultado da sua vontade política (ou dos seus), mas antes das circunstâncias em que encontrou o país.

No entanto, nos 15 minutos de discurso, reconheceu a "dureza" da sua governação: "Tenho plena consciência da imagem austeritária da figura política que me está associada."

O presidente do PSD foi mais longe admitindo que "à força de não querer falhar" possa ter "levado mais longe do que seria necessário a imagem de determinação que ficou associada a essa fase de austeridade" e os esforços exigidos aos portugueses no período de ajustamento - mesmo ciente de que isso lhe poderia custar uma reeleição.

"É o passado com que me apresento", atirou como quem fecha um capítulo e vaticina um novo tempo, ainda que "nem todos os portugueses" o tenham perdoado.

Contudo, e tendo como pano de fundo um cenário com o seu lema de candidatura às diretas de 5 de março ("Social-democracia, sempre!") e já depois das intervenções do presidente da distrital de Lisboa, Miguel Pinto Luz, e do mandatário da sua (re)candidatura, Fernando Ruas, Passos dirigiu-se à família "laranja" - estavam ex-ministros, antigos secretários de Estado e muitos deputados na sala - realçando que não se desviou da matriz do partido. E socorreu-se das linhais finais do programa do PSD, aprovado no último Congresso (2012), para questionar: "Alguém se sente mal com este programa? Alguém, olhando para o nosso passado, vê este programa ou esta orientação aviltada ou desviada da nossa ação política? Eu não vejo."

Ideia parecida já tinha veiculado pela manhã, num encontro informal com jornalistas: "Mesmo nas medidas de austeridade que adotámos fomos sempre sociais-democratas." Ou, dito de outra forma, ninguém lhe retirou o gene social-democrata. "Na austeridade e na bonança", como explicou.

Com ou sem desvio ideológico, Passos abriu caminho a um novo tempo. Mesmo sem pressas, como já pela manhã tinha notado, frisou não ter "nenhum conformismo" com a circunstância de ter sido empurrado para a oposição e espera voltar ao governo para concluir um mandato inacabado. "Tenho presente que o projeto com que me apresentei aos portugueses não se esgotava numa legislatura. (...) O projeto ficou a meio, no devido tempo os portugueses ajuizarão", sublinhou perante o "passismo" ali presente - dos notáveis do atual PSD, o líder parlamentar, Luís Montenegro, foi a ausência mais notada.

Para Passos, os oito anos eram também o desejo dos eleitores, motivo pelo qual lamentou que esteja a governar "quem perdeu as eleições".

Assim, pretende voltar ao jogo - ao combate eleitoral, leia-se -, acrescentando que não quer que nada corra mal ao executivo do PS (apoiado no Parlamento por BE, PCP e PEV), dado que esse cenário representaria um novo calvário para a população. "Para acreditar que voltaremos a merecer a confiança dos portugueses não precisamos de que as coisas corram mal ao atual governo e aos portugueses", explicou o líder do PSD.

Salientando que afasta, de todo, a "política do bota-abaixo e do quanto pior, melhor", reiterou que não acredita na "geringonça" - a expressão é de Paulo Portas, não de Passos - e observou ainda que "os riscos desnecessários que o excesso de voluntarismo e até de revanchismo governativos potenciam não ajudarão o país a viver melhor nem com mais segurança".

Mas, no seu entender, o país necessita agora mais do PSD do que precisava a 4 de outubro. Em que medida? Passos explicou a rematar: "O nosso país precisa ainda de reformas importantes para trazer mais prosperidade e justiça social. Sei que no dia em que o país precise de levar reformas para a frente com mais ambição e profundidade é no PSD, e não nos nossos adversários, é no nosso projeto, e não no dos outros, que encontrará força e determinação para realizar os seus sonhos e aspirações."

A noite terminou com o hino nacional. O próximo passo é um roadshow pelo país.

Diário de Notícias
www.dn.pt