Tarefa inacabada

Publicado a
Atualizado a

O senador norte-americano Daniel Moynihan (1927-2003) dizia, sabiamente, que "todos temos direito à nossa opinião, mas não aos nossos próprios factos". Um acontecimento histórico como o 25 de Abril de 1974 é muito mais do que uma coleção de factos sobre os quais a historiografia contemporânea conseguiu estabelecer um razoável consenso. Estou seguro de que, tanto o leitor quanto eu, teríamos em 2006 opiniões mais prontas sobre o balanço do 25 de Abril, do que temos hoje, em 2016. Parece um paradoxo, mas não é. O tempo histórico não é linear. A grandeza do 25 de Abril reside na profundidade e no alcance estrutural das mudanças. Não se tratou apenas de construir uma verdadeira democracia representativa em Portugal. Ele foi um acontecimento universal, que afetou muitos milhões de seres humanos, que em África e na Ásia se encontravam sob a nossa bandeira e administração. Bem sabemos que o processo democrático, essencialmente pacífico que se desenrolou no rincão europeu, foi acompanhado por sangrentas guerras civis em Angola e Moçambique, além da catástrofe de Timor-Leste. Também na descolonização, foram os colonizados quem pagou o preço maior. Contudo, em 1974, pela primeira vez desde 1415, Portugal anichou-se na Europa como habitat vital. Mudámos não só de regime, mas de destinação estratégica. Não admira, por isso, que quando a União Europeia se arrasta perigosamente perto da desintegração, sintamos, pessoal e coletivamente, a nossa segurança e liberdade existenciais ameaçadas. Em 2006 parecia estarmos fundeados num porto seguro. Agora somos apenas um navio, no meio de uma armada à deriva, sacudidos por uma tempestade secular. O 25 de Abril não é só uma soma de factos e uma multidão de opiniões. O 25 de Abril é também uma promessa de futuro comum, decente e justo, que continua porcumprir.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt