O governo brasileiro apresentou esta semana um enorme plano de privatizações. São mais de 58 projetos para privatizar ou concessionar em cinco anos. Nesta lista, o nome mais sonante é o da Eletrobras..A empresa do setor energético controla 40% da produção elétrica do Brasil e quase 57% da rede de distribuição de energia, tendo mais de 25 mil trabalhadores. É um colosso, construído ao longo de mais de meio século de investimento público e responsável por um salto de gigante na segurança energética do país..A privatização da Eletrobras era já um sonho de Collor de Mello, tentado na década de 1990. Incapaz de concretizar esse projeto, foi Fernando Henrique Cardoso quem iniciou a "desestatização". Nesse período foram alienados 33% do capital social da empresa a privados através de uma dispersão em bolsa, o que obrigou até a uma mudança constitucional para poder ser realizado..O terramoto político da primeira eleição de Lula teve, como uma das consequências, o resgate da Eletrobras do processo de privatização. Não recuperou o capital social que havia sido privatizado, mas, ainda assim, manteve 67% da empresa, direta ou indiretamente, nas mãos do governo federal. Sol de pouca dura, pois o golpe de Temer ameaça agora cumprir o sonho de Collor de Mello..Temer está a agir como um animal encurralado. Procura uma fuga para a frente que lhe garanta o apoio da elite económica, que por sua vez é quem determina o tempo de vida de Temer no governo depois das acusações de corrupção. É também esse dinheiro a cola governamental, tais os interesses representados à mesa do poder. Do fundo do baú, Eça de Queirós é mestre a descrever este governo golpista que "tem a falta absoluta de qualidades que o ilustrariam, e a abundância de defeitos que o desonram"..Argumento interessante é o de advogarem que as privatizações são a melhor forma de combater a corrupção. Vindo da boca de corruptos encartados, poder-se-ia pensar que falam do que sabem. Mas, não se enganem, estes não estão à procura da redenção: é conversa de bandido. Procuram apenas mais negócio, para que uns poucos ganhem muito à custa de todos os outros..O contra-relógio de Temer passa pela privatização da Eletrobras através de um aumento de capital, diluindo a presença pública na empresa, a acontecer até finais 2018. Dizem que o governo federal continuará a ter poder de veto nas decisões estratégicas, numa espécie de golden share. Mas basta ver o que tem acontecido às golden share pela Europa fora para perceber que é mais uma parte do conto do vigário. Neste processo, o erário público perde poder e não recebe nada, zero, coisa nenhuma. Não é apenas uma privatização, é um roubo. Como um mal nunca vem só, o governo federal propõe, paralelamente, a realização de um megadespedimento, pretendendo cortar 50% dos postos de trabalho da empresa..E em que pé fica a importância estratégica da principal empresa elétrica do país? Como é garantida a soberania do povo brasileiro sobre o seu sistema elétrico? Em que estado fica a segurança energética de uma nação tão grande? Perguntas-chave a que Temer e os seus colegas respondem, porque não sabem responder. Na verdade, não são as suas preocupações. Apenas lhe interessa o negócio, rápido antes que o poder mude de mãos..Aliás, em nenhuma linha do programa de Dilma que elegeu Temer estava esta privatização. É duplamente ilegítima porque não resulta da vontade popular, apenas do golpe no congresso..Mas sabe-se bem que a Eletrobras é apenas um ensaio para algo maior. Os milhões da empresa elétrica passam a tostões quando comparados com a dimensão da Petrobras, a empresa petrolífera brasileira. O ouro negro é o mais cobiçado da atualidade e por isso a empresa é o grande motivo de disputa..As tentativas para desvalorizar a Petrobras estão em curso. Ainda há semanas a ordem do governo foi para que a petrolífera não se apresentasse a concurso de novas explorações no pré-sal. O objetivo foi deixar para privados o que poderia ser disputado pela empresa pública e com isso engordar outras empresas na tentativa de emagrecer a Petrobras. A seguir viriam as propostas para a segmentação da empresa e, posteriormente, a privatização total ou parcial conforme a disponibilidade financeira da elite brasileira..O plano golpista em curso está a acelerar, consciente de que o poder se aproxima do fim. A privatização da Petrobras é o sonho que querem cumprir antes de perderem o lugar. À esquerda, fica a certeza de que a luta está a levar o medo à casa dos golpistas e que é possível travar o saque que está em curso.