Morreu Evgueni Ievtuchenko, um poeta do seu tempo. Passou por Lisboa há exatos 50 anos. Era russo, da Sibéria, filho daqueles anos 60 que chegaram até à URSS. Anos que procuravam, não sabendo o quê. Entre 1956 (crítica do XX Congresso comunista a Estaline) e 1968 (invasão da Checoslováquia), a Rússia viveu um pouco disso. O livro Doutor Jivago, de Boris Pasternak, nasceu dessa procura, e o poeta Ievtuchenko, também. Pouco? Ievtuchenko fez esta frase: "Um poeta na Rússia é mais do que um poeta." Um dia, a URSS, condescendente, deixou-o sair. Foi à Espanha de Franco, também condescendente, que o deixou dar um recital, sem anúncios, na igreja dos Capuchinhos, em Barcelona. De lá, Ievtuchenko veio até Fátima, estava cá o Papa Paulo VI. Fez um poema, com versos assim: "O povo arrastava-se", "de joelhos ligados"... Snu Abecassis, que lançava a editora Dom Quixote, convidou-o para um recital de poesia, no teatro Capitólio, em 17 de maio de 1967. Salazar, também condescendente, deixou um papão russo declamar. Ficou um livro dos poemas ditos e um ligeiro incómodo nos comunistas locais, não sabendo bem se o russo estava dentro das normas. Não estava. Quando a URSS ruiu, Evgueni Ievtuchenko apoiou Gorbachev e foi viver para os EUA. No ano passado, voltou a Barcelona e disse: "Quando me perguntam se a Rússia está bem, lembro que ainda há pouco sete mil pessoas ouviram um recital de poesia." Ievtuchenko pediu para ser enterrado ao lado de Pasternak.