O Sr. Juiz Carlos Alexandre, juiz de instrução no denominado processo Marquês, deu ontem [quinta-feira] uma entrevista à cadeia de televisão SIC onde referiu que "não tem contas bancárias em nome de amigos". Tal alusão, que nada vinha a propósito, não pode deixar de ser entendida - como o foi por todos os que a viram - como uma cobarde e injusta insinuação baseada na imputação que o Ministério Publico me fez no referido processo. Essa imputação, como já disse inúmeras vezes, é falsa, é injusta e é absurda. Nunca tive contas bancárias em nome de amigos. Todas as provas existentes no processo - testemunhais e documentais - confirmam que essa imputação não tem qualquer fundamento..A imparcialidade é a condição essencial da autoridade e da legitimidade da ação de um juiz. Ela significa não tomar partido, estar acima das partes, mostrar sempre a mais rigorosa e escrupulosa independência, seja da acusação seja da defesa. Ao fazer tão grave e falsa insinuação o Sr. juiz evidenciou não ter a imparcialidade que é exigível a um juiz de instrução na condução deste processo. Na entrevista de ontem e, mais escandalosamente, sem que tivesse sido deduzida qualquer acusação por parte do Ministério Público, o Sr. juiz decidiu expressar publicamente que, afinal, sempre teve partido..A primeira garantia que o Estado deve a qualquer cidadão é dar-lhe a conhecer "sem demora" a acusação (pela evidente razão de que só nos podemos defender do que conhecemos). Ao abuso do Ministério Publico, que a não apresenta, vem agora juntar-se o abuso de um juiz que, sem que haja sequer acusação, decide corroborar publicamente as injustas e falsas teses da acusação. O Sr. juiz de instrução faltou, assim, aos seus deveres de magistrado emitindo em público, embora com recurso à insinuação, um evidente juízo de culpabilidade sem que haja acusação formada, sem que tenha havido julgamento e sem que haja alguma sentença transitada em julgado. Pesando as palavras, o que se pretende é condenar alguém sem julgamento..Julgo que nada mais é preciso acrescentar. Esta atuação do Sr. juiz de instrução configura um inqualificável abuso de poder. Parece que se diz que o juiz de instrução é, no nosso ordenamento jurídico, o juiz dos direitos. Pois se assim é, este comportamento vem confirmar que nunca no decorrer deste processo existiu um juiz de instrução imparcial, autónomo da investigação e que pudesse velar pelos direitos civis dos cidadãos preservando-os dos excessos e do arbítrio do Estado. Em síntese, este processo nunca foi um processo justo. Dei instruções aos meus advogados para apresentarem as respetivas queixas aos órgãos judiciais competentes..O artigo de opinião de José Sócrates, que o DN publica, foi proposto pelo antigo primeiro-ministro.