Cuba no devido lugar

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Das três inversões bilaterais marcantes nos mandatos de Obama a relação com Cuba é a menos importante na geopolítica regional mas a mais relevante para a política interna americana. Quando digo três estou a olhar para o desanuviamento com o Irão - através do acordo sobre o programa nuclear, o alívio das sanções e o reconhecimento do seu papel decisivo no Médio Oriente - e a abertura à Birmânia. Aliás, a visita que Obama fez a Rangum em 2012, a primeira de um presidente americano, tem um impacto estratégico maior do que a que está a realizar a Havana.

Porquê? Primeiro, porque é entre o Índico e o Pacífico que estão concentrados os grandes dilemas de segurança contemporâneos (e não no Atlântico Norte). Segundo, porque a Birmânia tem sido foco de concorrência entre China e Índia na energia, no comércio, na circulação marítima e na tipologia de regime. O que os EUA fizeram - com Hillary à cabeça - foi intrometer-se nesse triângulo alterando não só a primazia histórica de Pequim mas abrindo internamente o regime a eleições, liberdades e investimentos. Não estou com isto a desvalorizar a visita a Cuba ou o que tem sido feito com o Irão, apenas a pensar a médio prazo e de forma objetiva: a China é o grande desafio geopolítico dos EUA e "conquistar" um proxy seu tem um impacto potencial estratégico brutal.

Mas se o exemplo da Birmânia está mais dentro da lógica dos equilíbrios geopolíticos, Cuba tem uma repercussão maior na política interna americana. É verdade que Obama cedo assumiu que prolongar o estatuto de Cuba como tesourinho deprimente da Guerra Fria não trazia vantagens aos EUA na América Latina. Hoje, o declínio de algumas das suas esquerdas obriga a acelerar o desenho de uma nova política para a região. Mas dado que as maiorias republicanas no Congresso não levantarão o embargo tão cedo, isso pode ser matéria eleitoral para os democratas insistirem nos bloqueios continuamente criados e responderem à sensibilidade antiembargo da comunidade cubana mais jovem da Florida (swing state vital), apoiante maioritária de Obama em 2008 e 2012. A visita de Obama pode ser histórica, mas a "nova" história com Cuba ainda mal começou.

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