O estudo sobre o sistema financeiro europeu revelado hoje pelo DN e assinado por Nicolas Verón, investigador sénior do Bruegel, o think tank económico baseado em Bruxelas, chega a uma conclusão que não pode deixar de soar a ironia quando lida aqui em Portugal. No essencial, o economista afirma que: 1) entre os cem maiores bancos da zona euro, mais de 40% estão sob controlo público - a maioria são alemães; 2) mais de 60% dessas instituições financeiras estão expostas a interferências políticas; e 3) só 35% desses bancos podem ser encarados como instituições verdadeiramente transparentes..Aliás, analisando os dados deste estudo chegamos à conclusão de que a Caixa Geral de Depósitos e a participação do Estado português no Novo Banco são um grão de areia numa praia financeira em que quem manda, de facto, são os diversos Estados da zona euro. Dito por outras palavras e voltando a citar o autor, entre os bancos supervisionados diretamente pelo BCE, os tais cem maiores, "os cotados, com acionistas diversificados, são a exceção em vez da regra". Nicolas Verón nota ainda um dado curioso, que ajuda a explicar o discurso político nesta matéria: "Os decisores europeus e os analistas tendem a partir do princípio de que a maioria dos bancos são entidades cotadas, com estruturas dispersas entre vários investidores.".Conhecemos bem este discurso, certo? Tem sido a base para a conversa sazonal nalguns setores da política e das escolas de economia que foi repetindo, nos últimos anos, que ter um banco público era uma bizarria portuguesa que só podia dar errado. E não é que andámos todo este tempo enganados?! Atenção. O estudo é crítico deste estado de coisas, já que as estruturas acionistas dominadas por governos ou por um único acionista assente em dinheiros públicos são frágeis porque expostas a influências políticas. São, de resto e na opinião do autor, potenciadoras do ciclo vicioso entre banca e dívida pública..A ironia está num outro ponto desta história. Ao fim de anos a fio de um discurso que nos tentou convencer que o Estado ser dono de um banco era algo de terceiro-mundista e de absolutamente avesso às saudáveis regras do capitalismo moderno, que manter a CGD na esfera pública era um atentado à concorrência e à boa saúde da economia portuguesa e, já agora, que a entrada do Estado num qualquer banco privado em aflição só poderia dar em desastre... ao fim de anos de conversa punitiva em relação à coisa pública, um discurso que ia buscar inspiração e exemplos ao centro da Europa, chega este estudo. O pecado, afinal, não mora apenas aqui. Só na Alemanha há dez bancos do setor público e outros três onde o maior acionista é uma entidade pública. Numa outra contabilidade, 45% dos ativos da banca alemã estão sob controlo do Estado. Estamos conversados sobre exemplos?