Dilma e Cunha não deixam de jogar nem no intervalo

Com a política parada por causa das férias de verão, a presidente apostará no marketing e o presidente da Câmara dos Deputados, seu inimigo político, nos bastidores
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No Brasil, entre meados de dezembro e o fim de janeiro, por causa do chamado "recesso", o país político para. Ou nem tanto. Em ano de crise, a presidente Dilma Rousseff vai aproveitar as férias oficiais dos parlamentares, onde se reúne boa parte da oposição ao seu governo, e da justiça, onde opera a operação policial Lava-Jato, que tantas dores de cabeça tem dado ao Partido dos Trabalhadores (PT), para mostrar serviço através de uma pesada campanha de marketing pessoal. E Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados, promete trocar o descanso pelas movimentações políticas.

Em Brasília, por falta de assunto, não se fala noutra coisa: o Palácio do Planalto vai lançar uma ofensiva mediática sem tréguas ao longo do mês de janeiro, época de verão no hemisfério sul. A ideia é melhorar a imagem da presidente Dilma Rousseff, que levou estrondoso abalo ao longo de 2014 e, sobretudo, em 2015 mas deu sinais de ligeiro alento nas últimas semanas - a sondagem Datafolha de 19 de dezembro mostrou a presidente a inverter a tendência de queda, com 65% dos brasileiros a considerar má/péssima a sua gestão contra 67% da pesquisa anterior; e 12% a considerá-la boa/ótima face a apenas 10%, em agosto.

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Como na Praça dos Três Poderes, o Supremo Tribunal Federal chumbou o regulamento que a Câmara dos Deputados, liderada por Eduardo Cunha, pretendia utilizar para avaliar o seu impeachment indo ao encontro das pretensões do executivo, no Planalto há o consenso de que a maré é boa. Por isso, Dilma, que cancelou a habitual temporada de praia no Nordeste brasileiro e se contentou com uma semana de descanso junto à família no Sul do país, andará pelas televisões, rádios e jornais, todas elas à míngua de noticiário por esta altura. "A leitura é que com o Congresso e o Judiciário em recesso, haverá espaço para que a presidente apareça mais no noticiário inaugurando obras e participando de agendas positivas", escreve Murilo Ramos, na revista 'Época'.

No site oficial do Planalto, a presidente já surge de helicóptero com expressão preocupada a sobrevoar regiões alagadas no Rio Grande do Sul, a visitar residências integradas no programa social Minha Casa, Minha Vida, na Bahia, ou a inaugurar obras de transposição do rio São Francisco, em Pernambuco. No entanto, cancelou à última hora visita ao Rio de Janeiro, em evento relacionado com os Jogos Olímpicos de 2016, mal rebentou a crise que afeta o setor de saúde da cidade. Dilma quer dar boas notícias e, dadas as férias, falar sozinha e sem oposição. "O meu compromisso é vencer a crise, nós vemos 2016 como a chegada de tempos melhores", afirmou em Pernambuco, dando tom ao discurso que aí vem.

Mas enquanto Aécio Neves, presidente do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), maior partido da oposição, deverá perder protagonismo em janeiro para recuperar energias, o principal rosto - de facto - anti-Dilma não vai cessar atividades. Tido como workaholic, Eduardo Cunha convidou jornalistas para um pequeno-almoço entalado entre Natal e passagem de ano, onde atacou os seus inimigos, cujo número foi crescendo durante 2015.

Na ocasião, começou por criticar Dilma Rousseff, como de costume, e acabou em Renan Calheiros, presidente do Senado, a outra casa que constitui o Congresso, e seu correligionário no PMDB (Partido do Movimento da Democracia Brasileira). Pelo meio, atacou o procurador-geral da República, que pediu a sua renúncia como líder na Câmara, insinuando que Rodrigo Janot protege Dilma e Calheiros. "Esse pedido é uma peça teatral", reagiu Cunha sobre o pedido de Janot.

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Cunha vai pois aproveitar janeiro para se defender das acusações de que é alvo na Lava-Jato e reforçar a ala do seu partido, em tese aliado do PT mas na prática dividido, que quer romper com o governo. Grosso modo, no multifacetado PMDB, tanto Cunha, declaradamente, como o vice-presidente Michel Temer, veladamente, conspiram contra Dilma. Já Renan Calheiros e a poderosa ala carioca do partido, composta pelo presidenciável em 2018 Eduardo Paes, prefeito do Rio, e por Leonardo Picciani, líder parlamentar na Câmara, são favoráveis ao governo e contrários ao 'impeachment'.

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