Moscatel de Setúbal envelhecido em garrafa entre os trunfos da Sociedade Vinícola de Palmela 

Criada em 1964, empresa tem novos acionistas e nova gestão e produz vasta gama de vinhos, dos espumantes aos moscatéis, passando por tintos e brancos. Exportar mais é o objetivo.
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Enquanto fecho a refeição com um Botelharia Moscatel, um clássico com 21 anos surpreendentemente envelhecido em garrafa, penso em como o Hotel Estalagem do Sado faz jus ao nome ao oferecer uma deslumbrante vista sobre o rio que vem a Setúbal desaguar, entre o branco das areias de Tróia e o verde da Arrábida (a objetividade é total, mesmo que quem escreva seja setubalense). Mas faz todo o sentido o hotel também como palco para um almoço de apresentação das novidades da Sociedade Vinícola de Palmela porque do seu restaurante se avista o castelo da vila, desde há séculos altaneiro vigilante de terras famosas pelos vinhedos. A conquista definitiva por D. Afonso Henriques deu-se em 1165, mas a tradição do vinho ali nunca se interrompeu desde a era romana, pois o islão praticado no Al Andaluz era do género daquele relatado pelo rei-poeta Al Mutamid, que escreveu por volta do ano 1000 sobre os prazeres da vida, não esquecendo os vinhos cor de rubi.

Nascida da vontade de alguns pequenos e médios produtores do concelho de Palmela, a Sociedade Vinícola de Palmela data de 1964, mas nos últimos tempos passou a ter uma estrutura acionista diferente e sobretudo uma gestão mais arrojada. Vasco Guerreiro é hoje o acionista maioritário e CEO, numa parceria com a família Cardoso, acionistas de longa data e donos de grande parte dos mais de 200 hectares de vinha que alimentam a produção, que vai de espumantes aos moscatéis, passando por uma vasta gama de tintos e brancos. As castas predominantes são Sauvignon, Moscatel Roxo, Moscatel de Setúbal, Castelão, Fernão Pires, Arinto, Sauvignon Blanc, Trincadeira, Aragonês e Alicante Bouchet.

Já falei do Botelharia Moscatel (48 euros) que acompanhou a sobremesa do menu especialmente criado para o evento pelo chef Hugo Nascimento de modo a potenciar alguns dos trunfos da empresa, de preços muito diversos. Mas o almoço começou com um espumante Ameias (6 euros) a acompanhar umas ostras, seguiu-se um Botelharia Branco (48 euros) que fez parceria perfeita com salmonete, depois serviu-se um Grande Reserva 2019 (28 euros), em requintada harmonia com rabo de boi. Um bolo de canela com marmelo e queijo de Azeitão foi a sobremesa que fez par com o já referido moscatel, sendo também servido um segundo moscatel, envelhecido como é tradicional em barris de madeira, para se perceber a diferença: o Botelharia é mais claro, óbvio, e também, digo eu, menos adocicado. "É para um consumidor exigente, aberto à novidade, que gosta de experimentar", nota, sentado ao meu lado, Filipe Cardoso, da família que é acionista mas também o enólogo da casa. As apresentações dos vinhos foram repartidas entre ele e o outro enólogo da Sociedade Vinícola de Palmela, José Caninhas.

Há ambição neste relançamento da empresa e sobretudo da marca, como fez questão de explicar Vasco Guerreiro: "queremos lançar vinhos com identidade e complexidade, apostar no lançamento de garrafeiras, vinhos com muito tempo de estágio, quer na madeira, quer em garrafa, que serão lançados para o mercado quando a nossa equipa de enologia acreditar que estão no seu melhor momento e iremos começar a engarrafar, em edições muito limitadas, alguns dos nossos moscatéis mais antigos". "A Serra Mãe e o novo Botelharia são marcas criadas para elevarmos o padrão de qualidade, rigor, excelência e criatividade da oferta", acrescenta Filipe Cardoso. Exportar mais é um dos objetivos, sublinham ambos.

Não resisto, durante o almoço, a contar que cresci neste bairro da Reboreda onde fica o Hotel Estalagem do Sado. Aliás, os meus pais moram a uns 200 metros, na mesma casa com vista para o castelo de Palmela. E, claro, os vinhos da Sociedade Vinícola de Palmela, da qual me recordo como Sivipa, fazem parte de memórias antigas.

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