Maré de algas invadiu praias do Algarve

Fenómeno natural causou estranheza e preocupação entre os banhistas. Não existem riscos para a saúde, diz especialista. Situação está "mais ou menos debelada".
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Além de ter encontrado a água do mar mais fria do que o habitual, Carla Ferreira deparou-se neste ano com um fenómeno ao qual não estava habituada na região do Algarve: "As praias foram invadidas por algas, o que se tornava desagradável. Gostamos de ver a água limpa." Enquanto as crianças "até achavam piada porque brincavam com as algas", os adultos reclamavam. "Não só não é agradável à vista e ao toque, como não se sabe o que está no meio das algas."

Em mais de 20 anos de férias na região na primeira quinzena de agosto, a técnica administrativa, de 43 anos, nunca viu uma concentração tão elevada destes organismos nas praias durante tanto tempo: "Na praia do Barril, por exemplo, eram mais verdes e gelatinosas, enquanto nas praias de Albufeira eram mais escuras."

No início do mês, a zona costeira do Algarve, sobretudo o sotavento algarvio, foi invadida por uma elevada concentração de algas, que foram motivo de preocupação para os banhistas. "Não é uma situação normal, mas acontece. Há uma série de anos que não se via um desenvolvimento tão grande, mas é algo que já aconteceu muitas vezes", explica Rui Santos, professor na Universidade do Algarve.

As algas acumulavam-se na zona da rebentação das ondas e ficavam espalhadas pelo areal. Segundo o também investigador do Centro do Ciências do Mar (CCMar) da Universidade do Algarve, as algas verdes (Ulva sp.), que se encontravam no sotavento algarvio, são organismos que "se desenvolvem dentro da ria quando existem condições propícias". Refere-se a concentrações elevadas de nutrientes e às condições ideais de luz e temperatura.

"Há anos em que se desenvolvem bastante na ria, crescem e são exportadas e depositadas pelas correntes nas praias." Tanto acontece na costa algarvia como no sul de Espanha. "Tem tudo que ver com a carga de nutrientes [azoto, nitratos]. A ria é um recetor dos efluentes urbanos, das ETAR [estações de tratamento de resíduos urbanos], que têm cargas elevadas de nutrientes", esclarece Rui Santos.

Na zona de Albufeira, por exemplo, as algas eram mais escuras, o que, de acordo com o investigador, está relacionado com o facto de serem provenientes "das zonas rochosas". Tal como as da ria, desenvolvem-se quando há uma concentração elevada de nutrientes.

A temperatura da água, que neste mês tem estado mais fria do que o habitual, também pode ajudar a explicar o fenómeno. O vento que soprou intensamente durante muitos dias seguidos fez que as águas mais profundas subissem à superfície perto da costa. E estas águas são "mais frias e têm mais nutrientes, o que é propício para o desenvolvimento das algas".

É difícil prever qual a evolução da situação, mas, segundo Rui Santos, a subida da temperatura esperada para estes dias "é capaz de ser benéfica para não fomentar o crescimento das algas", uma vez que haverá menos condições para a água fria vir para a superfície junto à costa.

Elidérico Viegas, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), adianta que a situação nesta altura está "mais ou menos debelada". "As algas causam estranheza e preocupação, até que as análises confirmem que não provocam danos à saúde", refere o representante, ressalvando que as autoridades de saúde confirmaram que estes organismos não representavam riscos para a saúde pública.

Do ponto de vista do turismo, apesar de serem motivo de reclamações, as algas "não têm muito impacto negativo na imagem da região. Não criam descontentamento generalizado ou pânico".

Além do impacto do ponto de vista estético, Rui Santos refere que "quando se depositam [no areal], as algas apodrecem e, ao entrar em decomposição, cheiram mal porque libertam gás sulfídrico". Se for em quantidades muito elevadas, esta acumulação pode até ser tóxica. Contudo, diz o docente universitário, seria necessária uma quantidade muito grande para causar problemas.

Municípios intensificam limpeza

Para ajudar a resolver a situação, alguns municípios, como o de Vila Real de Santo António, reforçaram a limpeza das praias nos últimos dias. "Apesar de o aparecimento de algas nas praias ser um fenómeno frequente e natural, sem consequências para a saúde pública, trata-se de uma situação que, por vezes, se pode tornar desagradável, pelo que a autarquia de Vila Real de Santo António tem implementado diversas medidas para que estas ocorrências causem o mínimo de incómodos", lê-se num comunicado publicado pela autarquia.

Segundo a mesma fonte, o município "assegura diariamente, e durante a época balnear, a limpeza manual das praias", que é complementada com uma limpeza mecânica, que no caso das praias de Santo António e Monte Gordo - entre as mais afetadas - é efetuada, em média, de três em três dias, devido à grande extensão de areal.

"A remoção das algas que se encontram no areal, dadas as características da zona, meios necessários envolvidos e a grande afluência de pessoas, só é possível no período noturno e quando a maré o permite", diz a autarquia. Mas mesmo quando as algas são removidas durante a noite, "após a maré encher novamente são, frequentemente, arrastadas novas algas e a situação permanece idêntica."

Em junho, uma maré vermelha de algas obrigou a interditar algumas praias do Algarve, entre Faro e Vilamoura. A espécie em causa era a Lingulodinium polyedrum.

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