Mais de duas mil toneladas de peixes, para cima de 300 tartarugas e 500 manatins, dezenas de golfinhos, um número incontável de aves marinhas, montanhas de caranguejos e outros crustáceos mortos, praias interditas, pesca perdidas. Numa vasta extensão da costa oeste da Florida, a vida marinha esvai-se, afogada num dos mais graves e prolongados episódios de proliferação de micro-algas tóxicas de que ali há memória. Mas o mais inquietante é que ninguém sabe prever quando aquele inferno pode terminar..Provocada pela proliferação anormal de uma alga microscópica, a Karenia brevis, que liberta substâncias tóxicas, a maré vermelha - é essa a cor que a aglomeração daquele minúsculo organismo imprime à água -, com o seu rasto de morte, move-se ao sabor dos ventos e das correntes, ao de mais de 200 quilómetros de costa..As toxinas que liberta na água causam mortandades generalizadas nos seres marinhos, mas o seu efeito não se fica por aí. Junto às praias e às rochas, impulsionada pela rebentação das ondas, as toxinas produzidas pelas micro-algas são libertadas no ar e podem causar problemas respiratórios graves nas pessoas mais vulneráveis..Estas marés vermelhas tornaram-se sazonais nas águas do golfo, junto à costa da Florida. Pelo menos desde 1950 que se observa a sua ocorrência numa base mais ou menos anual, cuja persistência se intensificou nas últimas décadas..Elas surgem invariavelmente no outono, duram algumas semanas ou meses e depois, assim como chegaram, desaparecem. Este ano, porém, a maré tóxica tem sido especialmente persistente, com efeitos desastrosos na vida marinha, nas pescas e no turismo da região, atividade que já soma perdas de mais de 90 milhões de dólares (77,3 milhões de euros) desde que o problema começou, em novembro do ano passado..A somar aos seus efeitos, este ano há também os da excessiva proliferação de algas verdes em massa de água doce naquele estado, como está a acontecer no lago Okeechobee. São provocados por organismos diferentes, mas não é por acaso que coincidem no tempo, já que as causas são comuns: a temperatura das águas ganhou mais um ou dois graus e tem maior abundância de nutrientes e fertilizantes. Os dois fatores juntos potenciam estas proliferações descontroladas, sufocando os outros seres vivos por perto..Embora esta não seja a mais grave maré vermelha de sempre em termos absolutos - a de 2006 acabou por se prolongar por ano e meio -, pelo menos para já, fica na mesma a questão no ar: afinal, o que está por trás deste fenómeno tão prolongado?.Não existe uma resposta definitiva, mas os cientistas que monitorizam o fenómeno em permanência, acreditam que existe uma conjugação de fatores, incluindo a severidade do furacão Irma, que dois meses antes desta maré vermelha ter começado, em novembro de ano passado, inundou o estado da Florida..Para fazer face à emergência, as autoridades viram-se obrigadas a libertar para o mar enormes quantidades de água carregadas de fertilizantes do lago Okeechobee. Isso, conjugado com a temperatura este ano um a dois graus mais elevada do oceano, provavelmente um efeito das alterações climáticas, criou o caldo perfeito para o que está a acontecer. E deixa no ar a perspetiva inquietante de que no futuro contexto climático estas situações tenderão a repetir-se com maior frequência e gravidade.Para já, no entanto, a questão fundamental é a de como pôr termo a isto. E, mais uma vez, não há respostas definitivas. Enquanto as condições que estão a propiciar o fenómeno se mantiverem, pouco mais há a fazer do que esperar, e continuar a monitorizar a sua evolução.