Ex-ministros consideram que professores "têm razão, mas não podem prejudicar os alunos dessa maneira"
"Vejo com com grande preocupação estes avanços. Os professores têm razão numa parte - nos 9 anos, 4 meses e dois dias - no entanto têm que compreender que o Governo não tem todos os meios ao seu alcance", disse ao DN o ex-ministro da Educação Roberto Carneiro, que participou esta quarta-feira em Pombal num Conselho de Pais e Professores, ao lado do "amigo e compadre", também ex-ministro, Guilherme de Oliveira Martins.
"O Governo também tem de estar aberto a isso e negociar. A negociação faz-se com boa vontade, e tem de ser de parte a parte", disse ainda Roberto Carneiro, sublinhando que, apesar de compreender as razões da greve dos professores e do endurecimento da luta que anunciaram, "não podem prejudicar os alunos, os pais e as famílias dessa maneira".
Recorde-se que os professores revelaram hoje que estão dispostos a formas de luta mais radicais: alunos do 12.º ano sem aulas no 3.º período ou um ano sem avaliações finais são medidas propostas pelos professores caso o Governo não negoceie a recuperação do tempo de serviço este período, revelou a Fenprof.
Roberto Carneiro foi o moderador do 2º conselho de pais e professores de Pombal, um dos municípios que está a implementar o Programa de Potenciação do Sucesso Escolar, numa parceria com a EPIS (Empresários pela Inclusão Social). E desta vez convidou para orador outro ex-ministro da Educação, ao tempo do Governo de António Guterres: Guilherme de Oliveira Martins. Questionado pelo DN, o professor recusa pronunciar-se "sobre questões específicas", mas enfatiza que "a educação é uma prioridade maior na sociedade, e deve ter em conta a dignificação de todos os seus membros, dos elementos que contribuem para a qualidade da aprendizagem: escola, família e comunidade".
Os dois ex-governantes (Carneiro pelo PSD, Martins pelo PS) mostraram um discurso alinhado no que toca às linhas orientadoras e à forma como encaram a Educação. Uma plateia diversificada, mas maioritariamente composta por professores do ensino básico, discutiu naquele fórum a dicotomia entre o papel e o digital, bem como o acesso aos meios tecnológicos. Oliveira Martins começou logo por desenganar a assistência, quando lembrou que "as crianças que agora estão na escola vão ter profissões que ainda não foram inventadas. Os percursos hoje são complexos, não estão de antemão definidos. Mas na escola só utilizaremos bem as tecnologias se formos capazes de perceber os alunos na sua identidade", advertiu. E perante as dúvidas e receios dos professores, face ao desinteresse dos mais novos pela leitura, em papel, em detrimento dos meios digitais, o orador lembrou que "incentivar a leitura obriga a uma estratégia inteligente".
A propósito, recordou as palavras que ouvira há muitos anos da escritora (e professora) Luísa Dacosta: "Quando entro na sala de aula eu não sei quem ganha mais, se sou eu se são eles". Para concluir, afinal, que "quando falamos da arte de educar, não há receitas. O professor lida com seres muito diferentes. É preciso ter tempo e capacidade para olhar as crianças nos olhos e perceber como elas estão. Na escola, o mais importante é saber perguntar", considera Oliveira Martins.
De acordo com o ex-ministro, as políticas de educação devem centrar-se, numa primeira fase, na educação pré-escolar. "É essencial para garantir a igualdade de oportunidades. Mas tem de se somar à correção das desigualdades".
Já Roberto Carneiro - que se lembrou de promover estas iniciativas para a EPIS depois de perceber que, nos Estados Unidos, onde vive o filho mais velho, a escola dos netos decidia tudo em conjunto com pais e professores - deixou a ideia de que "cada aluno é único, como cada filho". E na verdade sabe bem do fala: "Tenho 9 filhos e 18 netos únicos".