Chumbo à vista na legalização da canábis
O PSD, o CDS e o PCP sinalizaram esta tarde claramente que vão votar contra os projetos do Bloco de Esquerda e do PAN que visam a legalização do comércio recreativo da canábis.
O debate fez-se esta tarde no Parlamento e as votações serão amanhã de manhã. Só os partidos proponentes votaram a favor. O PEV vai-se abster, o PS também. Contudo, entre os socialistas há liberdade de voto, esperando-se pelo menos uma vintena de votos a favor dos diplomas do BE e do PAN.
Através de Ricardo Batista Leite, o PSD disse que votará contra pelo facto de os projetos preverem o auto cultivo da canábis. Isso, na visão do deputado social-democrata, introduz um problema de controlo de qualidade, "da semente ao produto final", podendo portanto criar problemas de saúde pública.
O CDS e o PCP foram mais duros. Pelo CDS, Isabel Galriça Neto disse que a canábis é uma "substância claramente perigosa" que "pode comprometer de forma irreversível a saúde dos consumidores", registando-se casos de "vidas verdadeiramente destruídas". Assegurando que a posição do seu partido "não se baseia nem em preconceito nem em capricho", a deputada centrista preferiu sublinhar a "preocupação" do seu partido "com a saúde pública", invocando em sua defesa posições públicas já manifestadas pela Ordem dos Médicos e pela Direção Geral de Saúde.
Já Carla Cruz, do PCP, começou por criticar o BE ao afirmar que os bloquistas queriam na verdade "abrir caminho" para a legalização do comércio da canábis para uso recreativo quando propuseram a sua legalização - entretanto aprovada - para uso médico.
Segundo a parlamentar comunista, "o consumo não é inócuo", "provoca passividade" e, a prazo, tem efeito psíquicos nocivos. E os estudos feitos a partir de experiências já em curso nos EUA são não só "escassos" como até "contraditórios" nas suas conclusões. "A consequência da aprovação dos projetos do BE e do PAN seria a liberalização do comércio e a expansão do consumo" e "o que temos de conseguir é a diminuição dos consumos".
No entender de Paula Cruz, prioritário mesmo é o reforço dos serviços do Estado que combatem "comportamentos aditivos".
Pelo PS, subiu ao palanque o deputado Alexandre Quintanilha. O deputado socialista elogiou os projetos do BE e do PAN por serem "claros e rigorosos" na sua exposição de motivos. Contudo, salientou que "alguns dos efeitos a médio e longo prazo [do uso da canábis] continuam desconhecidos". E as experiências em curso, por exemplo nos EUA, são ainda "muito recentes". "Gostaríamos de ser mais prudentes", pelo que "este principio da precaução merece ser invocado", sustentando assim a posição de abstenção do PS (mas com liberdade de voto para quem a entender usar).
Também Heloísa Apolónia, do PEV, invocou o princípio da precaução para sustentar a posição de abstenção que amanhã os dois deputados da bancada assumirão. "Há argumentos válidos para um lado e para o outro" e sobre os efeitos na saúde "há estudos para todos os gostos".
Moisés Ferreira defendeu o projeto do BE e André Silva o projeto do PAN. Para o BE, a situação atual de ilegalidade do comércio "é o paraíso dos traficantes", enquanto que "a legalidade é a segurança e da saúde pública". Segundo Moisés Ferreira, as experiências que estão a ser feitas nos EUA "falam por si". "Não houve aumento do consumo, não houve emergências médicas significativas relacionadas com a exposição a canábis; houve, aliás, uma redução do consumo e de mortes relacionadas com o consumo de opiáceos."
O BE afirmou-se disponível para alterar o seu projeto durante a discussão na generalidade mas para amanhã a intenção é mesmo levar o diploma a votos - o que, pela disposição contrária conjugada do PSD, CDS e PCP implicará o seu chumbo (o mesmo se aplicando ao projeto do PAN).
André Silva, do PAN, também argumentou que o comércio ilegal beneficia o narcotráfico, implicando "riscos acrescidos na saúde pública". Ao mesmo tempo sublinhou as precauções que o seu projeto prevê, por exemplo a venda legal apenas a maiores de 18 anos e em farmácias.