Covid-19: porque é que os testes de diagnóstico têm de ir até ao fundo do nariz?

Método foi implementado a partir da pandemia de gripe A (H1N1) de 2009 para o diagnóstico de doenças vírus respiratórios. Saiba por que é mais eficaz do que um teste de saliva
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É uma imagem que suscita imediatamente apreensão sempre que se considera a hipótese de fazer um teste de diagnóstico à covid-19: como todos nos habituámos a ver nos últimos meses, para diagnosticar uma infeção pelo novo coronavírus, o procedimento requer a coleta de células das membranas mucosas do trato respiratório com "zaragatoas".

Ora, se basta uma única gota de saliva para infetar várias pessoas, porque é que é preciso enfiar uma cotonete no nariz até à parte de trás da cabeça para coletar uma amostra que nos indique a presença ou não do vírus, podemos indagar-nos (e indagam-se vários internautas nas redes sociais, por exemplo).

A dúvida levou o jornal francês Le Monde a publicar esta sexta-feira um artigo sobre a necessidade de os testes PCR [nome dos testes de diagnóstico] irem até ao fundo do nariz à procura da presença do vírus. E, lembra o jornal, a dúvida parte de um mal-entendido sobre o funcionamento do vírus e sua transmissão: ele aloja-se em primeiro lugar no trato respiratório e não é transmitido principalmente pela saliva.

Um método estabelecido em 2009

O método do teste PCR não é novidade. Estes testes são "feitos por profissionais de saúde que recolhem uma amostra de produto (exsudado) através do nariz (até à nasofaringe), com recurso a uma zaragatoa, (um cotonete grande); esta amostra é posteriormente analisada num laboratório certificado para o efeito", como escreve o médico internista Paulo Bettencourt no site da CUF

A técnica é defendida desde o surgimento da gripe H1N1, em 2009, para o diagnóstico de doenças por vírus respiratórios, como é agora o caso da Covid-19.


E porque se fazem estes testes através do nariz? Há dois benefícios, lembra o jornal Le Monde.

1 - Diagnósticos mais confiáveis
O primeiro é a maior fiabilidade destes testes. "É o melhor", disse ao jornal francês Laurent Andreoletti, professor de virologia da faculdade de medicina de Reims e chefe de uma unidade de diagnóstico Covid-19. "Embora o vírus possa ser encontrado na saliva e na garganta, é mais comum nas células ciliadas (receptores sensoriais dos sistemas auditivo) do sistema respiratório. Isso limita a percentagem de falsos negativos", ou seja, pessoas com o vírus que não conseguem ser diagnosticadas. Concretamente, acrescenta o clínico, a fiabilidade um teste PCR através das fossas nasais bem executado é de cerca de 80 a 90%, em comparação com 60 a 70% no teste de saliva.

2 - Detecção precoce
A outra vantagem é que, sendo o SARS-CoV-2 principalmente um vírus respiratório, é no trato respiratório que ele se aloja. E é aqui que podemos detetá-lo primeiro, antes que ele se desenvolva noutras partes do corpo.

"Nós não sabemos exatamente quando ele se aloja na saliva; mas sabemos que ele, se estiver no organismo, será encontrado nas membranas mucosas, que são o principal local de infeção", explica Bernard Binetruy, diretor de pesquisa da Inserm, Instituto Nacional da Saúde e Investigação Médica de Paris.

"Se apenas fizéssemos testes de saliva, estaríamos a perder a hipótese de detetar pessoas que têm o vírus mas estão nos estágios iniciais da infeção, pelo que ainda não seriam detetáveis."

Ar expirado, o principal fator de transmissão

Desse ponto de vista, "a ideia de que uma única gota de saliva pode infetar uma vila inteira, é completamente falsa", disse Laurent Andreoletti. ao Le Monde.

"A saliva não é um bom meio de transporte para o vírus, que prefere as células do trato respiratório. A transmissão ocorre principalmente através do vapor de água presente na respiração", explica o professor de virologia.

É por isso que é recomendável usar a máscara não apenas na frente da boca, mas também na frente do nariz. Algumas pessoas desenvolvem o vírus mais no trato respiratório e, portanto, expiram mais, explicando os casos de supercontaminação, acrescenta Laurent Andreoletti.

No início deste mês, mais de 250 cientistas enviaram uma carta à Organização Mundial da Saúde (OMS) informando que o vírus é transmitido pelo ar. A agência da ONU admitiu em 7 de julho que "a transmissão aérea do vírus não pode ser descartada".

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