Como falar sobre a pandemia com as crianças? Oito conselhos a seguir
Se a pandemia de covid-19 gera ansiedade nos adultos, como se deve conversar com as crianças, mais vulneráveis a uma nova realidade, sobre a doença e as medidas de contenção, ainda mais quando ao ambiente escolar está sob grande pressão ou até já foi alvo de medidas de encerramento? A Unicef divulgou um guia com oito pontos para os pais saberem como devem abordar o assunto, sabendo que os mais novos podem ficar confusos com a realidade atual. Especialistas de pediatria e psicologia explicam como proceder para não criar mais ansiedade.
O primeiro conselho é convidar a criança a falar do assunto, para perceber o que já sabe. "Aproveite a oportunidade para lembrar sobre boas práticas de higiene, sem introduzir novos medos." Diz a Unicef, numa compilação de conselhos feita por Jacob Hunt, especialista de comunciação da organização, que "desenhos, histórias e outras atividades podem ajudar a abrir uma discussão".
Maria do Carmo Vale, pediatra, disse à agência Lusa que esta é uma doença que deve ser explicada aos mais novos, mas "dentro das suas possibilidades de entendimento". "É importante que se explique que neste momento há um agente infeccioso que está a passar de pessoa para pessoa de uma maneira um bocadinho mais acelerada do que é normal", realçou. Se a escola encerrar, os pais devem transmitir às crianças que essa é uma medida preventiva, para garantir a sua segurança.
Os pais devem ter cuidado com a informação que transmitem aos filhos. "As crianças têm direito a informações verdadeiras sobre o que está a acontecer no mundo, mas os adultos também têm a responsabilidade de mantê-las protegidas de problemas. Use uma linguagem apropriada para a idade, observe as reações e seja sensível ao seu nível de ansiedade." Mas tenha em atenção que deve responder com informação fidedigna: se não souber, não invente. E deve explicar que algumas informações online não são precisas nem verdadeiras e que é melhor confiar nos especialistas.
"O melhor é sempre dizer a verdade, não vale a pena inventar grandes histórias", considerou Joana Sarmento Moreira, especialista em psicologia infantil, ouvida pela agência Lusa, alertando que também é importante "não entrar em grandes detalhes" para evitar ansiedades.
Os cuidados de higiene são fáceis de transmitir. Ensine como devem lavar as mãos regularmente e "pode mostrar às crianças como ao tossir ou espirrar devem usar o cotovelo. Deve explicar que é melhor não ficar muito perto das pessoas que apresentam os sintomas e pedir-lhes para dizer de imediato se começarem a sentir febre, tosse ou dificuldade em respirar".
É certo que muitas crianças já têm esses hábitos. "Assisto muitas crianças que vêm às consultas e quando tossem encostam sempre a boca ao antebraço", diz Maria do Carmo Vale, sublinhando que esse é um hábito que já está muito interiorizado. A pediatra considera que, mesmo assim, é muito importante que os pais reforcem a importância destes cuidados, chamando igualmente a atenção para o contacto com os outros, em particular nos casos de crianças que têm irmãos mais novos. "Deve-se explicar que existem outras formas de demonstrar carinho e que não se devem dar muitos beijinhos", refere.
A Unicef aponta também que deve proteger as crianças da avalanche de informação e de imagens, por vezes, perturbadoras para os mais novos que podem pensar que a crise está perto. "As crianças podem não distinguir entre imagens na televisão ou online e a própria realidade pessoal, podem acreditar que estão em perigo iminente". Por isso, "ajude os seus filhos a lidar com o stresse, criando oportunidades para brincarem, sempre que possível. Mantenha rotinas e agendas regulares o máximo possível, principalmente antes de dormir".
Se estiver numa região com focos de covid-19, lembre aos seus filhos que as crianças não são propensas a contrair a doença, que a "maioria das pessoas que têm coronavírus não fica muito doente e que muitos adultos trabalham arduamente para manter a sua família segura".
Joana Sarmento Moreira aconselha um diálogo mais aprofundado com os jovens. "Os mais velhos já acompanham muito a comunicação social, e alguns podem não compreender o que se está a passar e achar que está a haver excesso de zelo", admitiu a psicóloga, para quem os pais devem explicar, o melhor possível, a situação e alertar para a incerteza que ainda existe em torno do novo coronavírus.
Desde o início deste surto de coronavírus, há vários relatos de discriminação em todo o mundo. "É importante verificar se os seus filhos não estão a enfrentar ou a contribuir para o bullying", diz o guia da Unicef. O conselho aos pais é que expliquem que o coronavírus "não tem nada a ver com a aparência ou origem de alguém, de onde é ou em que idioma fala". Em caso de agressões verbais ou intimidações na escola, as crianças devem sentir-se à vontade para contar a um adulto em quem confiam.
A entreajuda, a solidariedade e a generosidade são importantes nestes momentos. Explique às crianças que isso está a acontecer na sociedade. "Partilhe histórias de profissionais da saúde, cientistas e jovens, entre outros, que estão a trabalhar para travar o surto e manter a comunidade segura", diz a Unicef.
Mantenha a calma e dê o exemplo. O controlo é essencial para as crianças perceberem que a situação pode ser resolvida. "Se estiver ansioso ou chateado, reserve um tempo para si e procure outro familiar, amigos e pessoas de confiança na sua comunidade para lidar com as crianças."
É importante que não deixe a conversa a meio ou com questões importantes por responder. "Tente avaliar o nível de ansiedade, observe a linguagem corporal e verifique se o seu filho está a usar o tom de voz habitual ou está angustiado. Lembre aos seus filhos que podem ter outras conversas difíceis a qualquer momento, que está disponível sempre que se sentirem preocupados."
Para evitar que a epidemia se espalhe a DGS reforça os conselhos relativos à prevenção: evitar contacto próximo com pessoas que demonstrem sinais de infeção respiratória aguda, lavar frequentemente as mãos, evitar contacto com animais, tapar o nariz e a boca quando espirra ou tosse e lavar as mãos de seguida pelo menos durante 20 segundos. Para a comunidade escolar podem ser encontradas mais informações aqui.
Em caso de apresentar sintomas coincidentes com os do vírus (febre, tosse, dificuldade respiratória), a autoridade de saúde pede que não se desloque às urgências, mas para ligar para a Linha SNS 24 (808 24 24 24). De acordo com o último boletim informativo, tosse é o sintoma mais frequente (65%) entre os casos confirmados, seguida de febre (46%), dores musculares (40%), cefaleia (37%), fraqueza generalizada (24%) e, por último, dificuldades respiratórias (10%).