Conservar, proteger e sensibilizar. Estas são três das principais funções dos vigilantes da natureza, profissionais cujo escritório são os parques e as florestas espalhados de Norte a Sul do país. E trabalho não lhes falta num território que conta com 13 parques naturais, nove reservas naturais e um parque nacional, além de todas as paisagens e monumentos protegidos. Esta segunda-feira assinala-se o Dia Internacional do Vigilante da Natureza e o DN quis ir conhecer a realidade de quem todos os dias contribui para a sustentabilidade ambiental..Portugal tem três milhões de hectares de floresta, aproximadamente um terço de todo o território nacional, mas apenas cerca de duas centenas de guardiões deste património natural. Paulo Tenreiro, 57 anos, dedica-se à profissão desde 1988 por "paixão" e gosto de aprofundar conhecimentos sobre as espécies da fauna e da flora. Tanto assim é que até nos tempos livres aproveita para fazer observação, participar em artigos científicos e congressos. "Sempre gostei do que faço, de ler e de conversar com outras pessoas sobre estes temas. Tenho 50 artigos científicos publicados e isto não me dá nem mais um tostão ao fim do mês, mas vale muito para mim. Sinto muito prazer naquilo que faço", conta-nos, ao telefone, enquanto faz captura e anilhagem científica de aves no Paul do Taipal, em Montemor-o-Velho. É ali bem perto, na Reserva Natural do Paul de Arzila, que Paulo Tenreiro desenvolve a sua atividade profissional - ora a vigiar, ora a sensibilizar..Apesar de serem muitas vezes invisíveis aos olhos da população e do Estado, os vigilantes da natureza têm sobre si uma extensa lista de responsabilidades. O decreto-lei 470/99, que regula a carreira e que não voltou a ser atualizado desde a viragem do milénio, estabelece que estes trabalhadores devem assegurar "funções de vigilância, fiscalização e monitorização relativas ao ambiente e recursos naturais", a que se junta ainda a sensibilização para a importância dos habitats. "A monitorização é, na minha perspetiva, das mais importantes funções. Há uma série de animais, plantas e organismos que estão em risco e cabe-nos acompanhar o seu estado e comportamento", complementa João Diogo Mina, que desempenha atividade no Paul de Arzila. Aos 33 anos, o jovem doutorado em Biologia faz parte da nova geração que tem chegado à profissão nos últimos anos..Além destas tarefas, os guardiões da biodiversidade assumem um papel particularmente relevante em período crítico de incêndios, como no verão. "Estamos em pleno campeonato dos incêndios, por isso nesta altura fazemos muita vigilância preventiva", aponta Paulo Tomé, que com 60 anos de idade e 35 de profissão é hoje responsável pela gestão de uma equipa de quatro pessoas na Reserva Natural do Sapal de Castro Marim, no Algarve..Diz a sabedoria popular que "quem corre por gosto não cansa". Porém, os quatro vigilantes da natureza ouvidos pelo DN - todos a trabalhar no Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) - apontam o "cansaço", a "frustração" e o "desânimo" com a carreira que escolheram. Em causa estão as condições precárias em que desenvolvem a sua atividade, que não se refletem apenas nos baixos salários, mas também na falta de recursos disponíveis. "Fartei-me de pagar coisas do meu bolso", sublinha Paulo Tenreiro, que diz que os colegas se sentem "pouco valorizados". "Durante 30 anos fiz as contagens de aves aquáticas em nove zonas húmidas do Centro do país. Nunca me deram um par de binóculos, fui eu que tive de comprar os meus", assinala..Francisco Correia, que trabalha no Parque Natural de Sintra e é presidente da Associação Portuguesa de Guardas e Vigilantes da Natureza (APGVN), confirma os relatos e acrescenta críticas à forma como o Estado trata esta carreira especial da função pública em que o salário de entrada é o ordenado mínimo. "As pessoas podem gostar muito da profissão, mas com um ordenado mínimo não conseguem alugar uma casa, pagar a alimentação e acabam por desistir", conta. Das fardas aos binóculos, passando por material informático ou até pilhas, os quatro vigilantes ouvidos pelo DN queixam-se da falta de condições e apontam a crítica aos sucessivos governos, que acusam de terem "abandonado" esta carreira. E porque passam despercebidos ao longo de todo o ano, aproveitam o Dia Internacional do Vigilante da Natureza para pedir investimento público que permita executar a sua missão da melhor forma possível. "A reavaliação da carreira seria bastante importante para nós. A melhor palavra que descreve o sentimento da maior parte dos colegas é frustração", remata João Diogo Mina. .dnot@dn.pt