Alguma coisa está a acabar com as toupeiras-de-água em Portugal

As populações desta espécie, que só existe no sudoeste da Europa, estão em declínio. Biólogos da Universidade do Porto recomendam estatuto de conservação de "ameaçado" e medidas de conservação
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Tem estatuto de "vulnerável", mas esta avaliação já não espelha a situação difícil em que hoje se encontra a toupeira-de-água (Galemys Pyrenaicus), uma espécie do sudoeste europeu, que só existe no norte de Portugal, em alguns pontos do norte e centro Espanha, e nos Pirenéus, em Andorra e França. Em Portugal, descobriu-se agora, a espécie está em declínio acentuado e os biólogos que fizeram a avaliação recomendam que o seu estatuto seja revisto para "ameaçado".

O estudo foi realizado por investigadores do CIBIO-InBIO, da Universidade do Porto, e revela que, à semelhança do que sucede nos outros países onde ocorre, a espécie, também aqui, está a perder terreno: nas bacias dos rios Tua e Sabor, onde a avaliação foi feita, as populações desta toupeira caíram 63,5% nos últimos 20 anos.

A equipa de investigação, que foi coordenada pelo biólogo Lorenzo Quaglietta, publicou agora os seus resultados na revista científica Animal Conservation, e sugere que, face ao problema, o estatuto da espécie seja "redefinido internacionalmente para o estatuto de ameaçado", como explicou Lorenzo Quaglietta ao DN.

"Estudos anteriores feitos em Espanha e França também já tinham identificado quebras apreciáveis nas respetivas populações da espécie", adianta o biólogo do CIBIO-InBIO, sublinhando que "os autores desses estudos também recomendaram a revisão do seu estatuto de conservação".

A equipa do CIBIO reforça agora essa recomendação e Lorenzo Quaglietta explica que essa revisão de estatuto "seria importante" para se conseguirem "os recursos necessários" para a "conservação da toupeira-de-água", com o objectivo de "tentar deter a tendência atual do seu declínio".

Para fazer o retrato da situação da espécie no país, os investigadores do CIBIO-InBIO utilizaram os dados da distribuição geográfica da espécie e modelos estatísticos para prever a sua ocorrência em duas bacias hidrográficas, as do Sabor e do Tua, e depois foram para o terreno ao longo de 2014 e 2015 para fazer o recenseamento das populações daquela toupeira. E, comparando os dados com os de um estudo anterior sobre a espécie, realizado entre 1993 e 1996 nas mesmas duas bacias hidrográficas, verificaram que as notícias não são boas.

Enquanto na década de 1990 a toupeira-de-água foi encontrada em 85,1% dos locais avaliados, desta vez os biólogos só as encontraram em 31,1 % dos mesmos locais observados das duas vezes.

Perda de habitat, alterações climáticas e espécies invasoras

Os biólogos não sabem exatamente quais são as causas deste declínio, mas têm algumas hipóteses. Uma delas tem a ver com a degradação e a fragmentação do habitat, "pela construção de barragens, pela poluição das águas e até pelo fluxo variável dos rios, devido às secas, o que nos leva também ao problema das alterações climáticas", sublinha o coordenador do estudo. Outra hipótese ainda são os efeitos negativos as espécies invasoras. No caso, duas espécies de lagostins-americanos e um parente da lontra, o visão-americano, que já se tornaram comuns naquelas bacias hidrográficas.

"É possível que os lagostins estejam a competir com a toupeira pelo alimento e que o visão-americano esteja a predá-la, mas precisamos de mais estudos para perceber exatamente o que está a acontecer", diz Lorenzo Quaglietta.

Mais estudos para perceber o que está em causa, mas também para saber mais acerca da biologia da toupeira-de-água, "sobre a qual se sabe ainda muito pouco", alerta o biólogo. "Só conhecendo bem toda esta realidade poderemos concretizar ações de conservação eficazes", sublinha.

Por isso novos estudos vão avançar, mas há algumas coisas que já se podem dizer: preservar a naturalidade dos rios onde espécie ocorre, e recuperá-la onde ela foi destruída, são os caminhos óbvios, que o estudo, aliás, recomenda. Cruciais, são por exemplo as zonas chamadas de cabeceira, isto é, as área de nascentes em zonas montanhosas, "que podem funcionar como refúgios naturais, perante alguns dos factores que levam ao declínio da espécie", e que devem ser preservadas.

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