"Ter irmãos torna-nos mais tolerantes e mais generosos"
Em Portugal, celebra-se o Dia dos Irmãos desde 2014, uma iniciativa que partiu da European Large Families Confederation. No nosso País, a principal promotora é a Associação Portuguesa de Famílias Numerosas, para quem "ter irmãos é uma vantagem até a nível profissional". "Há, desde tenra idade, a partilha das roupas, do material escolar, do computador. É toda uma gestão que se inicia logo à nascença, o que a nível de aprendizagem assume um papel importante. Aprendem a lidar com diferentes maneiras de ser e personalidades, o que torna quem tem irmãos pessoas, normalmente, mais tolerantes e mais generosos. Em termos profissionais, notam-se diferenças nas pessoas que têm irmãos. Um gestor de pessoal que tenha tido vários irmãos consegue olhar para a equipa de trabalho de forma diferente", explica ao DN Ana Cid, secretária-geral da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas.
A opinião é partilhada por Nuno Pinto Martins, fundador da Academia Educar pela Positiva. O especialista ressalva a existência de um maior "estímulo ao desenvolvimento de importantes habilidades sociais e para a vida, tais como cooperação, entreajuda, empatia, partilha". "É uma relação para a vida, que se for bem "regada" pode trazer frutos" a vários níveis, sublinha. Contudo, para Nuno Pinto Martins, "ter irmãos pode ser uma maravilhosa experiência, mas também um desafio". "Cada criança é única e tem a sua própria forma de encarar a chegada de um irmão. A personalidade de cada uma e a perceção que tem sobre si própria e sobre o seu papel no seio familiar poderão ser decisivas", explica. Embora não sendo "vinculativo", "muitos filhos únicos tendem a ser mais individualistas e a sentir dificuldades em partilhar e/ou em colocarem-se no lugar do outro, pois estão habituados a ser o centro das atenções", refere. Nuno Pinto Martins acredita que a falta de irmãos pode levar, muitas vezes, os filhos únicos a exigir "ao longo da vida o mesmo tipo de atenção e privilégios daqueles com quem se cruzam nos diversos contextos, da escola ao local de trabalho".
Maria Bragança é mãe de três filhos, um de oito e dois de cinco anos. A decisão de partir para uma segunda gravidez, teve por base não privar o filho mais velho de saber o que era ter irmãos. "Não queria que os meus filhos perdessem a oportunidade de receber aquele que considero o maior presente que a vida nos pode dar. O vínculo - em situações normais claro está - que se estabelece com os irmãos é de tal forma forte que nenhuma outra relação se assemelha. Ter um irmão é ter um ombro amigo que não espera nada em troca, mesmo nada. É ter uma pessoa que nos conhece de trás para a frente porque vive connosco desde o primeiro minuto, é ter o nosso passado presente, as nossas raízes ali. E quem nunca precisou, estou convicta, que é apenas porque nunca experimentou", afirma.
Contudo, a chegada de gémeos foi um desafio para o filho mais velho, habituado a ser o centro das atenções. "O início custou, até a mim me custou. Afinal, tínhamos uma ligação tremenda... Digo "tínhamos" no passado porque embora ainda tenhamos uma forte ligação a parte do "tremenda" passou à história. Porque, quando a casa enche, o nosso coração multiplica, mas o tempo não... E temos de saber dosear e dedicar um espaço nosso a cada um e a todos. Passada a fase da reação menos negativa, quando os irmãos começaram a crescer, foi inevitável o sentimento dele crescer também. Hoje em dia, não vivem uns sem os outros", refere.
As experiências boas e as "menos fáceis", levaram Maria Bragança, jornalista e fotógrafa de recém-nascidos, a criar o Aqui Há Mães. Um projeto de maternidade, onde especialistas da área da saúde falam sobre os mais variados temas e esclarecem as principais dúvidas dos pais. "O Aqui Há Mães é algo que me teria dado muito jeito no início desta grande aventura. Porque dúvidas todos temos e a informação é a nossa maior arma", conclui.
Cláudia Miranda é a mais velha de três irmãos. Tem uma irmã quatro anos mais nova e um irmão, cuja diferença de idade é de uma década. A relação entre eles é, por isso, muito diferente. "Quando a minha irmã nasceu foi um choque, deixei de ser a bebé da família. Fomos cão e gato até estarmos as duas na faculdade. O meu irmão, era o meu bebé. Ouvia várias vezes que ele já tinha uma mãe... Na infância, aprendi que não era a única, que tinha de partilhar as atenções e tudo o que tinha - até o quarto. Aprendi que há ligação de sangue forte, quando defendia a minha irmã no recreio - mesmo com ciúmes apertados dela em casa. Aprendi e cresci com a alegria de uma casa cheia, da confusão e do jogo de personalidades a que isso obriga", recorda. Hoje, as irmãs são "as melhores amigas", "cúmplices", que construíram um clã, com os filhos e sobrinhos uma da outra. "É a primeira pessoa que sei que está lá e me compreende. Um laço e amor de sangue, que as palavras não chegam para descrever! E é um amor que se estende às minhas sobrinhas", explica. Ser tia, sublinha, é uma das vantagens de não ser filha única e um "sentimento inexplicável". Por isso, Cláudia Miranda já aguarda com ansiedade o dia em que "o mais novo, ainda com vida de solteiro", venha a ter filhos e a alargar ainda mais a família Miranda em "saudáveis confusões" com "muitos mais sobrinhos".
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