O presidente do SFJ, António Marçal.
O presidente do SFJ, António Marçal.Maria João Gala / Global Imagens

Sindicato dos Funcionários Judiciais diz que tutela tem "deriva esclavagista"

Na abertura do Congresso Nacional do sindicato, o presidente, António Marçal, fez o diagnóstico: o setor está em "rutura" e a greve, apesar das consequências, "é como um grito de desespero".
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A carreira de funcionário judicial é "a única" do mundo ocidental "onde se quer obrigar os trabalhadores a prestar trabalho suplementar e a ter disponibilidade permanente sem qualquer contrapartida". Isto, disse António Marçal, presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais, é uma "deriva esclavagista" da tutela.

Discursando na abertura do IX Congresso Nacional, que acontece em Anadia até domingo, o dirigente referiu ainda que devem ser feitas reformas "na contingentação dos processos atribuídos a cada juiz" e que, além disso, os magistrados devem ser dotados do "apoio devido para a realização das tarefas administrativas, burocráticas e de expediente". Isto pode levar à criação de duas figuras: o "gabinete do magistrado, com um assessor" ou de um "secretário do magistrado", bem como uma eventual "afetação de um funcionário de justiça a cada juiz".

E, disse, "a greve" dos funcionários judiciais "é como um grito de desespero" e que, não obstante "as consequências na vida da sociedade", "é o único recurso possível para o que o poder político" possa entendar um fator: "Não se pode falar de justiça, sem que justiça seja feita aos funcionários judiciais."

As perdas de recursos humanos, justificou, prendem-se muito com questões salariais, que pioram "a cada mês, a cada ano". Isto torna a carreira pouco atrativa para quem entra na profissão ou para reter quem já está no setor.

O estado da justiça, alertou António Marçal, é de "rutura" nos serviços. O motivo? "Muita incompetência junta."

Olhando então para o sistema judicial português, o sindicalista deixou críticas: "Abundam as leis que promovem não a justiça, mas a injustiça, em especial nas que regulam as relações laborais." Recordou depois as palavras de Edmund Burke, filósofo e político irlandês: "As más leis são a pior espécie de tirania."

"Há, de alguns anos a esta parte, uma visão mercantilista do sistema de justiça", apontou, esquecendo que "sendo um dos setores-chave em qualquer sociedade livre e desenvolvida". "A Justiça não se coaduna com métodos de organização ou de gestão empresariais", relembrou, uma vez que "o lucro de uma boa, eficiente, justiça" mede-se "pelo impacto positivo no desenvolvimento da comunidade que serve e pelo grau de satisfação dos que a procuram". E, "infelizmente", a satisfação das pessoas "não é grande". 

No passado, muitos diagnósticos sobre o setor foram feitos, "mas a terapêutica tarda em chegar, tal é barafunda que vai reinando na profusão legislativa e propostas de organização ou reorganização".

No discurso, António Marçal apontou ainda que "o reforço do financiamento do sistema de justiça é uma prioridade suprapartidária, um dever do Estado que é urgente cumprir, uma prioridade de regime". E questionou então: "Onde está um planeamento estratégico para a Justiça? Pergunto-me se existe mesmo, um existiu algum plano estratégico para o país. Começo a duvidar."

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