Rede é suspeita de lavar quase 200 milhões de tráfico de droga
Ministério Público acusou 29 pessoas por branqueamento de capitais. Judiciária desmantelou maior rede de lavagem de dinheiro da droga que tinha origem na empresa "Money One"
Durante três anos, uma organização sedeada em Portugal terá lavado quase 200 milhões de euros em numerário de dinheiro da droga ou, como os próprios intervenientes denominavam, da "indústria da farinha". Esta semana, o Ministério Público acusou 29 pessoas e duas empresas por crimes de associação criminosa, falsificação e branqueamento de capitais, no que, até ao momento, é o maior processo de branqueamento de capitais ligado ao tráfico de droga. No centro da acusação está a empresa "Money One", que terá servido de "lavandaria" para os milhões do tráfico de droga comandado por um grupo de leste.
Segundo o despacho de acusação da 9ª secção do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa (DIAP), o esquema terá começado em 2011, quando o principal arguido, J.M., já com experiência profissional no setor das remessas de dinheiro internacionais tentou montar uma Instituição de Pagamento em Portugal, contando com "o apoio de grupos de grandes dimensões e altamente organizados, como uma "organização dos Balcãs", que "importavam do Brasil e da América do Sul produto estupefaciente", o qual era "vendido na Europa". Este grupos movimentavam, por isso, "grandes quantias em numerário".
J.N. não conseguiu criar a sua própria empresa, associando-se, posteriormente, à Money One. isto apesar de contar com a colaboração remunerada de um funcionário do Banco de Portugal (acusado por corrupção) que lhe terá transmitido várias informações do interior do supervisor a troco de, por exemplo, "2500 litros de combustível" ou de umas férias no valor de 1795 euros. Num ano (2012, o funcionário do Banco de Portugal terá recebido 19.750 euros de J.N.
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Em 2012, terá sido feito o contato com os sócios da "Money One" e com um Técnico Oficial de Contas, também acusados no processo por fraude fiscal, associação criminosa e branqueamento de capitais, de forma a montar uma estrutura capaz de branquear dinheiro do tráfico de droga.
Ao grupo inicial juntaram-se cinco funcionários do Banco BIC, com o objetivo, relata o MP, "de fazerem passar pelas contas abertas no BOC, tituladas pelas sociedades que dominavam e controlavam, os valores em numerário que lhes eram entregues, provenientes das vantagens obtidas com a venda de produto estupefaciente". De acordo com a investigação da Unidade Nacional Contra a Corrupção (UNCC) da Polícia Judiciária, os intervenientes ganhavam uma comissão de 5 a 7% pelos valores movimentados.
A investigação da UNCC detetou ainda que os envolvidos tinham várias formas de operar. Por um lado, em matéria de comunicações entre si, optavam pelo sistema de mensagens encriptadas dos "Blackberry", contavam ainda com um serviço de transporte do numerário entre Espanha, Itália, Holanda e Portugal. Tal serviço seria disponibilizado, em algumas ocasiões, pela empresa "Notas Animadas". Os próprios transportes do numerário tinham "batedores", que avisam os transportadores da existência de "operações stop" ou outro tipo de movimentações das polícias no vários países. O grupo terá ainda montado um esquema de simulação de trocas comerciais entre empresas fictícias na Bélgica, através da emissão de faturas que atestariam os pagamentos. Em vez de depositado em Portugal, o dinheiro terá começado a ser transportado para a Bélgica, de onde era reenviado para Lisboa também sob a capa de pagamentos a empresa subcontratadas.
Nas buscas efetuadas aos suspeitos, a Judiciária encontrou ainda uma lista de pessoas que entregariam o dinheiro para branquear. Todos eram identificados ou por alcunhas ou por nomes fictícios: "Pandero", "Caminhão", "Caminhão do Panamá", "Renegado", "Ed Gringo", "Caminhão Perú" - estes foram alguns dos nomes encontrados, os quais também recebiam uma comissão.
De acordo com o valor apurado - sendo que a investigação considera que houve muito dinheiro branqueado, ao qual não foi possível detetar o rasto - este esquema terá permitido "lavar" quase 200 milhões de euros. Estes terão passado por contas da "Money One", sobretudo no BIC, banco que acabou por congelar o esquema através do seu sistema de "compliance". Para remeter o dinheiro para o exterior, a "Money One" terá recorrido à utilização dos seus próprios clientes "normais" para dar uma capa de legalidade.