Quase 33 mil professores são precários
Existem 32.939 professores contratados. Em 2016, eram 50 mil. Diminuição é reflexo de mais vinculações ao abrigo da norma-travão, mas também, da falta de diplomados em ensino.
Em 2016, havia 50 mil professores contratados em Portugal. No último concurso (ano letivo 2022/2023), eram 32.939. Um número significativamente mais baixo que, segundo Davide Martins, professor de Matemática e colaborador no blogue ArLindo (um dos mais lidos no setor da Educação), se explica pela vinculação de cerca de dois mil docentes a cada ano, ao abrigo da norma-travão em vigor, mas também pela falta de diplomados em ensino.
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Contas feitas, nos últimos seis anos, foram cerca de 12 mil os professores contratados que conseguiram vincular, mas o sistema perdeu mais de cinco mil novos candidatos para dar aulas. "Vão saindo docentes e não há novos a entrar. A lista está cada vez mais curta e, se tirarmos o Pré Escolar e os grupos de Educação Física, então o número é muito mais baixo. E dos professores precários disponíveis, apenas 6242 são jovens diplomados, sem nenhum dia de serviço", conta.
O ritmo acelerado de aposentações a cada ano traduz-se num saldo negativo. Em 2022, reformaram-se 2441 professores, mas a entrada de jovens está muito longe de compensar as saídas de docentes. Para atrair novos professores para a profissão, o Ministério da Educação (ME) tem implementado várias medidas e prometeu, nesta terceira ronda de negociações com os sindicatos, reduzir o número de precários.
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João Costa, ministro da Educação avançou com a vontade de vincular 10500 professores contratados. Um número que, a acontecer, significaria a redução de um terço dos docentes precários. Mas a informação dada por João Costa ainda carece de explicação na sua redação final. O que se sabe é que os professores terão de ter dado 1095 dias de aulas (corresponde a três anos de serviço) e terão de estar, neste ano letivo, colocados num horário completo. Por esclarecer estão ainda questões de "pormenor" que permitam perceber quem "encaixa" na medida, nomeadamente, se o horário completo tem de ser anual ou equiparado a anual (caso os docentes tenham ficado colocados até à Reserva de Recrutamento 3), ou se os horários podem ser ou não temporários.
Contudo, Davide Martins explica ao DN a dificuldade em encontrar o número avançado pelo responsável do Ministério da Educação (ME). "Se a condição for, para além dos 1095 dias, a colocação este ano, em horário completo e anual, existem 8753 docentes colocados pela lista nacional. Para os 10.500 teriam de existir quase dois mil colocados em Contratação de Escola até ao início do ano letivo. Há só 946 docentes nestas condições", refere. O especialista diz ainda que "não há uma maneira óbvia de chegar aos 10500, mesmo contabilizando os docentes colocados em contratos anuais até 15 de novembro de 2022".
Davide Martins alerta também para a continuidade da precariedade para docentes com 15 ou mais anos de serviço, pois muitos "podem não cumprir os requisitos por não estarem, este ano, em horário completo". "Se distribuir por Quadro de Zona Pedagógica (QZP), as zonas de Lisboa e Algarve têm praticamente 90 por cento de todos os horários possíveis para vincular pelas novas regras. A vincular, 90 por cento será a Sul. Aquele número de precários com 15 ou 20 anos de serviço vão manter-se a Norte e vão manter-se precários. No QZP 1 (zona do Porto), por exemplo, são apenas 600 os horários completos em todos os grupos de recrutamento", avança.
Norte também já regista acentuada falta de professores
Lisboa e Algarve são as zonas onde se regista a maior escassez de professores. Contudo, a zona Norte também já dá sinais de alerta e é nesta zona do país onde se regista o maior número de aposentações. "O problema está a bater à porta no Norte. Na RR 8 (a 21 de outubro de 2022) já havia 7 grupos de recrutamento sem candidatos no Norte e a tendência é para aumentar. Olhando para a lista de aposentados, são na maioria do Norte e, daqui a uns anos, teremos não só Norte, como o país todo com esse problema. Não tenho dúvidas. Há disciplinas muito problemáticas, como TIC, Português, as línguas e Educação Moral", explica.
Previsão de enchente na manifestação
Segundo os docentes contactados pelo DN, as alterações no concurso, onde se incluem as novas regras para vincular professores contratados, vão provocar "muitas injustiças", com ultrapassagens na vinculação por parte de professores com menos tempo de serviço. Esta situação soma-se às dezenas de queixas dos docentes, que estão em protesto e greve desde dezembro. E muitas das razões que têm motivado as queixas dos professores ganharam forma no Relatório Estado da Educação 2021 (Edição 2022), do Conselho Nacional de Educação (CNE), que traça, à semelhança do ano anterior, um cenário complicado da escola pública em Portugal, nomeadamente no que se refere à falta de docentes.
Dificuldades na carreira e na atratividade da mesma que levam hoje a uma nova manifestação de docentes e não docentes, em Lisboa. Convocada pelo Sindicato de Todos os Profissionais de Educação (STOP), que mantém uma greve por tempo indeterminado, a marcha contará também com alunos e encarregados de educação. Para Davide Martins, apesar de o ME e os sindicatos estarem em negociações, "a manifestação faz sentido porque tem de estar bem presente na cabeça do ministro que os professores não vão aceitar negociações escondidas". "Gato escaldado de água fria tem medo. Neste momento, mesmo que haja boa-fé, os professores já não confiam no ministro. Até haver decisões concretas e claras, não podemos baixar a guarda e a luta deve continuar", conclui.
Recorde-se que, na última manifestação convocada pelo STOP - a 14 de janeiro - milhares de pessoas marcharam entre o Marquês e o ME. O STOP afirma que foram mais de 100 mil pessoas, a Polícia contrapôs com 20 mil. Está também marcada outra manifestação, a 11 de fevereiro, convocada pela FENPROF, estrutura sindical que tem em marcha greves diárias por distrito.
dnot@dn.pt