Portugal vai criar o primeiro banco genético de espécies marinhas do século XXI. “Vai ser uma evolução assinalável face aos métodos usados no século XIX, quando se colocavam os animais em formol”, revelou ao DN o presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), a entidade gestora do projeto.O objetivo é “preservar e estudar o património genético da costa portuguesa e fazê-lo com a tecnologia mais avançada que existe, num verdadeiro salto quântico”, disse José Guerreiro. Em causa está um investimento total da ordem dos 40 milhões de euros. .Numa primeira fase, o IPMA definiu “duas macrozonas”, nas regiões centro e norte, para fazer a prospeção dos recursos genéticos marinhos e os trabalhos vão começar junto à costa na Figueira da Foz e em Leixões, avançou José Guerreiro.. Para essa missão o IPMA vai contar com o seu navio oceanográfico Mário Ruivo, que foi recentemente apetrechado com equipamento adequado. “É tecnologia de ponta com capacidade para estudar 2 mil km2 de mundo marinho com robótica submarina”, explicou José Guerreiro. Aquele navio de investigação, inicialmente construído para operações de defesa e salvamento submarino, está agora capacitado para operações de geotecnia marinha, oceanografia, operação com robôs, mas também pesca de arrasto, construção de um laboratório seco e um túnel de congelação. A sua primeira missão ocorreu em 2024 na sub-região marinha da Madeira..Paralelamente a este projeto está também já em fase de obra o HUB Azul, junto às instalações do IPMA em Algés, no município de Oeiras, que vai ser constituído por edifícios com capacidade para acolher tanques para testes, ensaios e gabinetes para os investigadores. É uma aposta sem precedentes na chamada economia azul, numa altura em que é cada vez mais evidente a importância dos oceanos para a sustentabilidade do planeta.. O IPMA ganhou a competência de toda a gestão dos recursos marinhos em Portugal desde a fusão do antigo Instituto de Meteorologia com o antigo Instituto Nacional de Investigação das Pescas. Portanto, “para além da componente da atmosfera e a componente do mar, compete-lhe o aconselhamento técnico-científico, desenvolvimento científico e tecnológico na área dos recursos vivos marinhos e também dos recursos geológicos”, explicou o seu presidente.Apanha de bivalves vale 11 milhõesÉ igualmente no quadro destas competências mais recentes que o instituto está envolvido na gestão de stocks de bivalves. O setor da apanha de bivalves envolve cerca de 1400 pessoas e movimentou negócios de 11 milhões de euros em 2024. Isto se contabilizarmos apenas a apanha legal, sabendo-se que é uma atividade aberta a uma grande informalidade e também exposta à apanha intensiva por mão-de-obra migrante clandestina. .“É um setor muito importante para as comunidades locais, dá emprego e cria valor, nomeadamente para o setor conserveiro. Por isso, temos de ter instrumentos para fazer uma boa gestão dos stocks e controle sanitário para poder ir para o mercado”, explicou o dirigente.. “No âmbito de um programa de 1,8 milhões de euros financiado pelo MAR2030, que estamos a lançar agora, e que abrange rias, lagoas e estuários em vários pontos do país, estamos, por exemplo, a fazer o acompanhamento e monitorização da pesca de bivalves na Lagoa de Óbidos”, adiantou aquele responsável.A atividade do IPMA vai mais além, nomeadamente, intervindo também ao nível da certificação de alguns espécimes. Em curso está, por exemplo, o processo de certificação do percebes das ilhas Berlengas, mas também o da sardinha, que não estava certificada, revelou José Guerreiro.Para apoiar estas atividades “vamos ter um laboratório de estudo de referência e contamos para isso com um investimento de 4 milhões de euros, ao abrigo do programa MAR2030, para a avaliação de stocks”.Aquele organismo está igualmente a desenvolver a Rede Nacional das Áreas Marinhas Protegidas, em conjunto com a DGRN (Direção Geral de Recursos Naturais). “Só na área do mar estamos a investir um total de 20 milhões de euros, entre fundos nacionais e comunitários”, exemplificou. Só 4% das áreas marinhas são protegidasA expansão das áreas marinhas protegidas consta das 23 metas fixadas no Acordo de Biodiversidade Kunming-Montreal a alcançar até 2030 e com as quais Portugal se comprometeu. Atualmente, só perto de 4% do total de área marinha sob jurisdição nacional está sob proteção. Recentemente, foi instituído pelo governo da AD o Parque Natural Marinho do Recife do Algarve – Pedra do Valado, com a criação de um mecanismo de compensação financeira destinado aos pescadores das comunidades de Albufeira, Lagoa e Silves. Também foi apoiada a intenção dos Açores preservarem 30% do seu mar e foi assumido o objetivo de salvaguardar novas áreas na Madeira.Este tema é particularmente crítico para Portugal, tendo em conta que a sua Zona Económica Exclusiva tem uma área 18 vezes superior ao território continental e se o país conseguir levar avante a sua pretensão de a aumentar, passará a representar cerca de 40 vezes o tamanho de Portugal. A complexidade de gestão, que já é assinalável, tornar-se-á ainda maior, pois o oceano não só é difícil de estudar como os mecanismos de controlo para a sua conservação também são muito dispendiosos.