“Uma medida salazarista, retrógrada, que destrói o acesso à habitação pelas gerações mais jovens, empobrece as cidades, o seu edificado e os proprietários que aplicaram as poupanças de uma vida em imóveis de rendimento”; “uma política obsoleta que não é abolida por falta de coragem”, e obriga, “há mais de 110 anos e sem justa compensação, (…) sucessivas gerações de milhares de proprietários de imóveis a assumir (…) um papel social que cabe apenas ao Estado”, estando “a levar à extinção do senhorio ‘tradicional’ (…), deixando o terreno aberto para fundos de investimento imobiliário, sem rosto”..É assim que a petição “Pelo Fim Imediato do Congelamento de Rendas em Portugal”, online desde esta segunda-feira e promovida pela Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), caracteriza o congelamento das rendas habitacionais anteriores a 1990, tornado definitivo em 2023 pelo Programa Mais Habitação, do anterior executivo. Um congelamento definitivo que, lembra, “o Governo da AD - Aliança Democrática, liderado por Luís Montenegro”, tinha prometido, no programa eleitoral, revogar - o que não se verificou..Face àquilo que classifica como “falta de coragem política”, a petição vem exigir, para 2025, uma atualização extraordinária dessas rendas, cujo universo estima alcançar “mais de 150 mil arrendamentos, representando uma fatia de 16% do total do mercado de arrendamento nacional”. Atualização que preconiza efectivar-se de “forma justa e equitativa, aproximando-as do valor de mercado de arrendamento acessível, que hoje conta com o apoio Estatal”, “cabendo ao Estado apoiar os inquilinos com carência económica comprovada que tenham taxas de esforço superiores a 35% com esta atualização da sua renda”..O documento propõe assim a alteração do critério que até agora vigorou, nos termos do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), para a avaliação da capacidade financeira dos inquilinos com arrendamentos habitacionais anteriores a 1990 - um critério que classifica como “insuficiência económica” rendimentos mensais brutos corrigidos até cinco retribuições mínimas garantidas..“Não é aceitável que os privados, o Estado e os impostos de todos os contribuintes estejam a proteger inquilinos que auferem rendimentos mensais até €4.433,33, como agora está consagrado na proteção aos contratos anteriores a 1990”, argumenta a associação de senhorios. “Reclamamos que só possam ser elegíveis à não transição para o NRAU e protegidos com contratos vinculísticos [como eram todos os contratos de arrendamento até 1990, quando se deu a liberalização do mercado] os agregados de arrendatários que aufiram até 2,5 Retribuições Mínimas Nacionais Anuais (cerca de três salários mínimos mensais), e cuja renda suportada signifique uma taxa de esforço superior a 35% do rendimento do agregado”..Refira-se que a regra da taxa de esforço máxima de 35% é a que vigora para todos os apoios do Estado à habitação - do acesso a habitação pública ao programa de arrendamento acessível, passando pelo “apoio extraordinário à renda” -, mas não a que subjaz à legislação através da qual o Estado impõe aos senhorios privados, no regime vinculístico dos contratos de arrendamento anteriores a 1990, que apoiem os seus inquilinos..Quanto à anunciada “compensação aos senhorios” pelo congelamento definitivo das rendas nos contratos anteriores a 1990, a petição lembra o cálculo do estudo de 2023 do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, o qual orça em mais de 600 milhões de euros anuais a diferença entre as rendas congeladas e aquelas que os senhorios poderiam auferir “a preços de mercado”, já que “cerca de 80% dos contratos com rendas congeladas têm (…) valores [mensais] inferiores a 200 euros, de acordo com as estatísticas oficiais do INE”. E sublinha que o limite de renda fixado para tal compensação, “até ao 1/15 do Valor Patrimonial Tributário do imóvel (…) traduz-se frequentemente em valores de metade até 40 vezes inferiores aos preços de mercado de “arrendamento acessível”. Explica porquê: “A imputar a renda apurada por este critério está a variável do coeficiente de vetustez a que está agregado. Todos os contratos anteriores a 1990, por definição, têm um coeficiente de vetustez máximo de 0,75, resultando em rendas de valores irrisórios. Por absurdo, são os senhorios que há mais tempo suportam o congelamento de rendas, aqueles que são mais penalizados com rendas baixíssimas, por via do coeficiente de vetustez, já que os seus imóveis são também necessariamente os mais antigos.”.Também a complexidade burocrática imposta no requerimento da referida compensação (que foi já objeto de notícias do DN) é referida pela ALP como mais uma indignidade a que os senhorios em causa são sujeitos: “[O Estado] inverteu as regras e passou para os proprietários de imóveis um complexo processo burocrático de acesso a um parco subsídio. Dezenas de milhares de senhorios – a esmagadora maioria idosos e com parcos recursos – foram arrastados para um limbo burocrático (…). Os senhorios não pediram qualquer subsídio ao Estado – querem apenas ter direito à sua propriedade, algo de que muitos, desde a Primeira República, estão privados.”.Entre as medidas exigidas pela ALP, porém, está uma forma de compensação financeira a estes proprietários: o acesso a fundos do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, “para apoio à reabilitação e reconversão de imóveis que décadas a fio estiveram amarrados ao congelamento de rendas. Esse apoio deve ser majorado progressivamente pelo número de anos que os senhorios tiveram de suportar rendas congeladas”.