Peritos defendem manutenção da matriz de risco das linhas vermelhas

Especialista indicou que a incidência "traduz menor probabilidade de transmissão e menor probabilidade de aparecimento de variantes" e é "o indicador precoce que permite atuar adequadamente e atempadamente.

O grupo de peritos que aconselha o Governo sobre a epidemia da covid-19 defendeu esta sexta-feira que deve manter-se a matriz de risco das "linhas vermelhas" de avaliação da incidência acumulada de casos e de índice de transmissibilidade (Rt).

"O grupo de peritos propõe manter a atual matriz de risco", afirmou a especialista Andreia Leite, da Escola de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, na reunião periódica de análise da situação epidemiológica do país, que junta no Infarmed, em Lisboa, especialistas, membros do Governo e o Presidente da República, sustentando que a incidência de casos de contágio é o indicador mais sensível para a progressão da pandemia.

Andreia Leite indicou que a incidência "traduz menor probabilidade de transmissão e menor probabilidade de aparecimento de variantes" e é "o indicador precoce que permite atuar adequadamente e atempadamente.

Permite também perceber se ao levantar medidas de restrição há "recrudescimento da transmissão e identificar se existe alguma alteração das características do vírus ou da resposta das vacinas a novas variantes", frisou.

Falando em nome de uma equipa que inclui investigadores de várias instituições, como o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, Direção-Geral da Saúde e faculdades de ciências de Lisboa e Porto, defendeu ainda que se deve "adicionar a monitorização da efetividade das vacinas" aos indicadores a ter em conta.

"A vacinação deverá contribuir para manter valores controlados de infeção, logo não se justifica [a modificação da matriz de risco]", considera a equipa.

"A matriz permite dar o alerta e os outros indicadores [mortalidade, variantes de preocupação ou proporção de vacinados] devem ser considerados numa avaliação de risco mais detalhada" para decidir medidas, mas numa fase subsequente, defendem os peritos.

A equipa teve em conta os critérios internacionais de reconhecimento de risco adotados por outros países europeus, cujo exemplo serviu para fazer a matriz de risco adotada em Portugal.

Andreia Leite apontou ainda que o modelo das "linhas vermelhas", adotado em março deste ano para o início da fase de desconfinamento, "já é conhecido de todos" e salientou a importância de manter "uma comunicação estável e clara".

Especialistas propõem três novos patamares no desconfinamento

O plano de desconfinamento da pandemia de covid-19 pode passar a contar com três novos níveis, se for acolhida a proposta esta sexta-feira apresentada pela equipa de especialistas liderada pela investigadora Raquel Duarte, da Universidade do Porto.

"A nova proposta assenta em pilares que deverão ser mantidos: primeiro, a velocidade a que a população está a ser vacinada, a política de testagem alargada, que é a única forma de garantirmos que os números que temos são reais e que os casos são detetados de forma precoce; a vigilância serológica das variantes; a monitorização dos indicadores; o cumprimento das medidas de proteção individual e a ventilação eficaz dos espaços interiores", enfatizou.

Nesse sentido, a especialista designou estes patamares como C, B e A, sendo este o último o máximo de desconfinamento, no qual se observam apenas as medidas gerais. Estes níveis são a única alteração, já que Raquel Duarte vincou a importância da continuidade da matriz vigente, considerando que "é preciso garantir estabilidade e previsibilidade para a população".

Ao nível das regras gerais, frisou a promoção da abertura frequente de janelas e portas, a atividade ao ar livre, se possível; o cumprimento da distância física com a identificação das pessoas por metro quadrado; a testagem alargada; a utilização obrigatória da máscara de acordo com as indicações; o desfasamento dos horários, a higienização individual e as 'bolhas'.

Em termos de faseamento das medidas, foi sublinhada a aproximação aos níveis de mobilidade pré-pandémica e a necessidade de conciliar a recuperação da liberdade com a segurança.

"No comércio e retalho, assim como nas cerimónias fúnebres, aquilo que nós propomos é que haja a partir do nível C apenas a aplicação das medidas gerais; na área da restauração, há regras gerais que aconselhamos que sejam mantidas de forma estrita - as pessoas devem estar sentadas à mesa, deve manter-se o distanciamento entre mesas de dois metros, deve estar definido o número de pessoas por metro quadrado e a utilização obrigatória da máscara exceto no momento da refeição", indicou.

E continuou com a revisão dos números máximos de pessoas juntas à mesa neste setor: "No nível C ainda propomos que haja um máximo de seis pessoas juntas no interior, enquanto se alarga no exterior para um máximo de 15 pessoas juntas; no nível B passamos de oito pessoas no interior para 20 no exterior; e no nível A já propomos que sejam apenas aplicadas as medidas gerais".

Raquel Duarte defendeu ainda que na hotelaria seja proposto a partir do nível C somente as medidas gerais de proteção.

Ao nível das recomendações, Raquel Duarte acentuou, por fim, a necessidade de recuar o "caráter impositivo" das medidas, o investimento numa estratégia de comunicação de crise eficaz e a "organização concertada, organizada e controlada" de pequenos e médios eventos com a garantia do cumprimento das medidas de proteção individual.

Lisboa com 3,28 vezes mais casos que o esperado nas últimas três semanas

O concelho de Lisboa teve nas últimas três semanas 3,28 vezes mais casos de infeção pelo coronavírus SARS-CoV-2 do que o esperado, afirmou a investigadora Carla Nunes, da Escola Nacional de Saúde Pública.

A epidemiologista salientou que, como em Lisboa, se registaram na última semana sete clusters de casos no território nacional, quatro deles com alguma dimensão na diferença entre o que foi observado e o que era esperado tendo em conta a tendência nacional.

O concelho da Golegã teve 9,14 vezes mais casos observados do que o esperado e Salvaterra de Magos 3,58 vezes mais casos, apontou, salientando que "os números de casos por detrás da identificação destas áreas são completamente diferentes".

Para avaliar a gravidade efetiva do estado destes concelhos, terá que se ter em conta outros indicadores, como a incidência de casos ou a tendência temporal mais alargada, adiantou.

A percentagem de portugueses que não confia na resposta do sistema de saúde a doenças não-covid-19 diminuiu de quase 80 por cento em fevereiro para menos de 40% atualmente e a percentagem de pessoas que afirmam não confiar de todo nos serviços de saúde para outras doenças além da covid-19 diminuiu de 79,4% em 22 de janeiro para 38,7% na quinzena atual, disse a investigadora da Escola Nacional de Saúde Pública.

Carla Nunes apontou uma "franca recuperação" nos indicadores de confiança dos portugueses na saúde, referindo que a falta total ou quase total de confiança na resposta do sistema à pandemia desceu de 32,7% em meados de fevereiro para 14,1% atualmente.

O número de pessoas que declararam ter ido a consultas presenciais aumentou também de 72,3% para 84,2%.

Em fevereiro, a percentagem de pessoas que declarava ter saído de casa nos 14 dias anteriores sem ser para trabalhar era de cerca de 14% e agora esse indicador está nos 48%.

Quando questionadas sobre estado "ansioso, agitado, em baixo ou triste" por causa das medidas de distanciamento físico e isolamento, em fevereiro 28,3% das pessoas declarava sentir-se assim todos os dias ou quase, enquanto agora a percentagem está em 17,9%.

Carla Nunes referiu que ao longo do período da pandemia, este indicador teve um pico de 30% em maio de 2020 e o valor mais baixo foi registado em julho do ano passado, com 11,5%.

Epidemiologista diz que infeção poderá já estar a passar a doença endémica

Portugal pode estar a viver um momento de viragem na pandemia de covid-19 para uma situação de doença endémica, disse esta sexta-feira o epidemiologista Henrique Barros, que salientou que atualmente a infeção já tem uma menor circulação na população.

"Podemos pensar se esta doença, que emergiu há cerca de ano e meio, de uma fase de evidente epidemia e pandemia, estará ou não a entrar num momento de endemia e de que maneira é que aquilo que identificamos - o facto de a infeção ter um curso agudo - se está a desenvolver como uma síndrome pós-covid ou covid longa pela presença de sintomas e de doenças para lá de 12 semanas após a resolução da fase aguda", afirmou Henrique Barros.

Numa intervenção por videoconferência na reunião periódica de análise da situação epidemiológica do país, que junta no Infarmed, em Lisboa, especialistas, membros do Governo e o Presidente da República, o especialista da Universidade do Porto reforçou que endemia significa que "o vírus chegou para viver entre nós".

"A infeção circula muito menos, a carga de infeção é muito mais baixa, mas temos de estar atentos à natureza cíclica destes fenómenos. Tudo leva a crer que a infeção se tornou endémica, ou pelo menos tornou-se endémica socialmente", acrescentou.

Segundo Henrique Barros, a mudança na abordagem à covid-19 pode ser vista não apenas pela sua disseminação ou nível infeccioso, mas também na forma como as pessoas olham para a doença, com uma diminuição dos níveis de ansiedade ou de receio de um eventual contágio com o vírus SARS-CoV-2.

"Muita coisa mudou ao longo do tempo na nossa perceção da doença", sintetizou o epidemiologista, notando também que a probabilidade de morrer é agora muito mais reduzida entre a população mais idosa, ao passar de um em cada cinco doentes para uma probabilidade atual de um em cada 20 infetados.

Variante indiana representa quase 5% dos casos

A variante do SARS-CoV-2 associada à Índia representa quase 5% dos casos de covid-19 em Portugal, estando já em nove distritos e 13 concelhos do país, revelou esta sexta-feira o investigador do INSA João Paulo Gomes.

A variante associada à Índia, considerada de preocupação, apareceu "numa altura em que a população portuguesa já tinha um considerável grau de imunidade" e foi "um bocadinho surpreendente para todos", disse o investigador, adiantando que, não havendo casos em abril, de repente, em maio, está "com quase 5% dos casos covid-19 em Portugal".

João Paulo Gomes falava na reunião de peritos do Infarmed, em Lisboa, à qual assistem o Presidente da República, o primeiro-ministro e membros do executivo, a primeira depois do fim do estado de emergência.

Segundo João Paulo Gomes, dos 800 genomas já sequenciados em maio, 4,6% estão associados a esta variante indiana, o que representa 37 casos confirmados, mas segundo estimativas podem atingir os 160 casos.

Apesar de serem estimativas, o investigador considerou que são "bastante robustas", sendo "expectável que esta variante esteja a ser disseminada na comunidade e que exista já transmissão comunitária".

"Estes 37 casos são apenas os confirmados laboratorialmente. Naturalmente, estamos a falar de muito mais", disse, acreditando que a variante esteja em "muito mais distritos" dos que os nove apontados, o que indica "a necessidade de um controlo rigoroso de fronteiras".

De acordo com o investigador, os casos desta variante estão sempre associados a viagens à Índia, Nepal e Bangladesh, defendendo por isso um controlo rigoroso das fronteiras.

João Paulo Gomes explicou que existem três variantes detetadas na índia, mas a que está a circular maioritariamente é a única apelidada de "variante de preocupação" pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças (ECDC, sigla em inglês).

Há ainda nove casos associados a outra variante detetada na Índia que "também causa preocupação", mas não ao mesmo nível da anterior .

"O número de introduções foi muito elevado e dá para perceber também que estas introduções foram causadas por pessoas que foram à Índia e ao Nepal", salientou o investigador.

João Paulo Gomes advertiu que "as novas variantes vão continuar a existir, principalmente, enquanto a situação de alguns países não estiver mais controlada e com a abertura das fronteiras" essas variantes irão circular também em Portugal.

Variante detetada no Reino Unido regista ligeiro decréscimo em maio

Nove em cada 10 casos de covid-19 ocorridos em Portugal são causados pela variante detetada Reino Unido, segundo dados do INSA, que apontam para "um ligeiro decréscimo" da presença desta variante no país.

A variante detetada do Reino Unido começou "em força" em janeiro, com 16% do total de casos, em fevereiro subiu para quase 60% e em abril atingiu o máximo, com 91%, descreveu o investigador João Paulo Gomes na reunião do Infarmed, em Lisboa, que analisa a situação epidemiológica no país, sendo a primeira após o fim do estado de emergência.

De acordo com os dados disponíveis, observou-se "um ligeiro decréscimo", situando-se nos 87,2%, disse o coordenador do estudo sobre a diversidade genética do novo coronavírus em Portugal.

No que respeita à variante de Manaus (Brasil), o investigador disse que começou com "níveis basais", teve um pico em abril com 4,3%, e em maio há uma estabilização deste valor nos 3%, o que corresponde a uma disseminação por 16 distritos e 48 concelhos do país.

A variante associada à África do Sul começou também de "uma forma relativamente modesta" no país e teve o seu pico em março, com 2,5% de todos os casos de covid-19 no país, e decresceu em abril para 1,3% e em maio ronda os 2%.

"Dá a sensação que, tanto a variante de Manaus como a variante associada à África do Sul, andam entre os 2 e os 4%", o que indica que estão numa situação "relativamente estável".

Segundo o investigador, a variante detetada na África do Sul foi já encontrada em 13 distritos e em 41 concelhos.

Já a variante associada à Índia, representou em maio 4,6% do total de casos, estando já em nove distritos e 13 concelhos do país, adiantou João Paulo Gomes.

"A situação atual das principais variantes reflete, por um lado, a adaptação do vírus" e "a situação imunológica da população a qual melhora todas as semanas", salientou.

Em Portugal, a covid-19 já provocou 17.022 mortes entre os 847.006 casos confirmados de infeção com o coronavírus SARS-CoV-2, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.

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