Os jovens "cientistas" que descobriram pegadas de Stegopodus em Alcobaça
A descoberta, pela primeira vez em Portugal, de uma pegada de um dinossauro Stegopodus, em Alcobaça, é um achado que se poderia presumir ter sido feito por um paleontólogo de renome. Mas, neste caso, o crédito da descoberta inédita é de dois jovens alunos de 14 anos, do Agrupamento de Escolas de Paço de Arcos, e valeu-lhes o segundo lugar num concurso internacional para jovens cientistas, em Itália.
João Grenho e João Diogo partilham o interesse pelos dinossauros desde pequenos e foi isso que os motivou a entrar para o grupo de Paleontologia na escola. Mas estavam longe de imaginar que uma visita de campo no âmbito das atividades do grupo iria resultar na valiosa descoberta, documentada no projeto "Pegadas de stegossáurios - o enigma", coordenado pelo professor Celestino Coutinho, que acompanhou todo o trabalho de campo na Serra do Bouro.
Com a supervisão do docente, os jovens desenvolveram uma escala de classificação e conseguiram identificar a única pegada de Stegopodus em Portugal, localizada na zona de Alcobaça. As pegadas fossilizadas fornecem informação sobre animais extintos que não pode ser encontrada nos ossos e dentes. Foi a partir daqui que os jovens de Paço de Arcos desenvolveram a escala para distinguirem a origem de pegadas tridáctilas de dinossauros e conseguiram identificar duas pegadas tridáctilas, reconhecendo o primeiro exemplo de Stegopodus em Portugal e o segundo (muito assimétrico) na Europa. Anteriormente, tinha sido descoberto, na mesma superfície, uma pegada distinta - Deltapodus - também com provável origem em stegoossáurios. É a primeira vez, a nível mundial, que ocorre esta coexistência de dois tipos de pegadas destes herbívoros.
Atualmente no 9.º ano, João Grenho e João Diogo são amigos da mesma turma e juntaram-se também no grupo de Paleontologia da escola. " Sempre gostei de dinossauros desde pequeno. Quando fui para o 5.º ano, os meus pais já me tinham chamado a atenção para o clube de Paleontologia. Só no 6.º ano é que entrei porque não nos deixavam entrar antes. E desde essa altura fui sempre aprendendo imensas coisas", explica ao DN, João Grenho.
Já João Diogo, entrou para o clube por sugestão do professor. "Nunca acreditámos que entrássemos, muito menos que viríamos a ganhar um prémio", conta. Após a entrada no grupo de Paleontologia e a junção ao projeto, os alunos partiram para o trabalho de campo, mas para seguir outra pista. "Nós nunca fomos àquela zona por causa das pegadas de Stegosaurus, mas sim por uma pista que íamos estudar. Só que, nos dois anos em que fomos lá, encontrámos as duas pegadas e decidimos fazer o trabalho sobre elas", explicam. João Diogo sublinha o trabalho de dedicação, que resultou na descoberta. "É uma experiência muito diferente. Aprendemos de uma forma muito diferente em comparação com as nossas aulas normais. Somos nós que temos que procurar, investigar, descrever, fazemos saídas de campo e lemos muitos trabalhos científicos já publicados. Em 2020, numa saída de campo, descobrimos a primeira pegada de estegossauro e a segunda foi em 2021. Portanto, parece-me que posso afirmar que foi um processo demorado, mas muito entusiasmante. Conforme descobrimos pegadas novas, queríamos saber mais sobre o assunto", sublinha.
Coube ao professor Celestino Coutinho o anúncio da importância da descoberta, recebida com admiração e entusiasmo. " Pensar que descobrimos algo que aparece pela primeira vez dá-me uma enorme satisfação. Sinto imenso orgulho de fazer parte deste clube e do projeto. Não posso deixar de dizer que se não fosse o professor Celestino não havia projeto", destaca João Grenho.
O mesmo entusiasmo e admiração foram sentidos com a conquista da medalha de prata, no Italian Contest for Young Scientists, um dos principais concursos de ciência para jovens na Europa. Um feito "inesquecível" que demorou a ser assimilado. "Acho que só mais tarde é que pensei verdadeiramente no que tínhamos conseguido", confessa João Grenho. João Diogo também ficou surpreendido com a conquista da medalha. "Não estava à espera, para ser sincero; quando disseram o nome do projeto senti-me extasiado", recorda. O que não deixa dúvidas aos dois jovens é a vontade de apostar na área de ciências no futuro. Um futuro que poderá não incluir o achado de novas pegadas, mas que promete muitas descobertas.
O Italian Contest for Young Scientists teve lugar em Milão, Itália, tendo estado a concurso 33 projetos de toda a Europa, Ásia, América do Norte e do Sul. O projeto "Pegadas de stegossáurios - o enigma!" foi também um dos vencedores do Concurso Nacional de Jovens Cientistas, em 2022. A iniciativa, organizada pela Fundação da Juventude, junta centenas de projetos desenvolvidos por jovens de todo o país, no contexto académico. Além dos prémios monetários, a Fundação da Juventude dá a oportunidade de os vencedores participarem nos principais concursos e mostras de ciência a nível europeu e mundial, com viagem, alojamento e inscrição incluídos.
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