Mais de 5000 queixas por maus tratos a animais em 2016
A GNR recebeu 3694 denúncias relativas a maus tratos a animais de companhia em 2016, uma média de 10 por dia. A estas somam-se as 1323 denúncias registadas pela PSP. No total, os portugueses fizeram 5017 queixas, um número que deverá aumentar, com a entrada em vigor do novo estatuto jurídico dos animais. A partir de segunda-feira, deixam de ser considerados legalmente como "coisas" para serem reconhecidos como seres vivos dotados de sensibilidade.
"Quando passamos a ter uma realidade distinta e a lei passa a acompanhar a perceção social de que os animais não são coisas, acredito que haja uma predisposição para denunciar mais. Não quer dizer que haja um aumento dos crimes ou contraordenações, mas haverá mais sensibilidade social para, com maior naturalidade, as pessoas denunciarem", diz Inês de Sousa Real, ex-provedora dos animais de Lisboa e co-fundadora da Jus Animalium - Associação de Direito Animal.
Segundo a GNR, registaram-se menos 116 denúncias no ano passado do que em 2015, mas mais 112 crimes. No total, a GNR contabiliza 767 crimes e 5064 autos de contraordenação, "maioritariamente por falta de chip de identificação, vacinação e/ou falta de registo". Já este ano, a GNR registou 952 denúncias, 130 crimes de maus tratos, 59 de abandono e 1465 autos de contraordenação.
No ano passado, a PSP registou 345 ocorrências por crimes de abandono de animais de companhia e 568 por crimes de maus tratos. Foram levantados 2 185 autos de notícia por contraordenação. Em causa estavam condições de alojamento, amputações, comércio de cães a gatos, falta de seguro, entre outras irregularidades.
"Passo jurídico filosófico"
A legislação que altera o Código Civil, que considerava os animais como "coisas", resultou de projetos de lei do PS, PAN, PSD e BE. Ao DN, André Silva, deputado eleito pelo PAN, diz que este é um "passo jurídico filosófico", que vai "ao encontro do sentimento geral dos portugueses".
Além de os animais deixarem de ser "coisas", surgem várias mudanças. André Silva destaca três: o facto de uma pessoa que encontra um animal poder retê-lo em casa, se houver um fundado receio que é vítima de maus tratos; previsão de indemnização em caso de lesão ou morte de um animal, o que mostra "reconhecimento dos laços de proximidade e afetividade"; e os deveres por parte dos detentores, que ficam obrigados a garantir o acesso a água, alimentação, cuidados médico-veterinários.
Em caso de divórcio, os animais devem ser confiados a um ou a ambos os cônjuges, considerando os interesses de cada um, dos filhos e o bem-estar do animal. Quem se apropriar de um animal que não é seu, fica sujeito a pena de prisão até 1 ano ou de multa até 120 dias.
Para André Silva, ainda há muito a fazer em Portugal. "Há uma incoerência legal por concretizar, que é estender a criminalização dos maus tratos a animais que não os de companhia", sublinha, destacando que "não há diferenças entre o valor intrínseco de um cão e de um cavalo". Além disso, destaca, é preciso regular o comércio online de animais e garantir que é cumprida a lei que põe fim ao abate nos canis municipais.
Contactadas pelo DN, a Liga Portuguesa dos Direitos do Animal e a SOS Animal congratulam-se com a lei, mas pedem mais fiscalização.