Luís Carrilho, esta terça-feira, na cerimónia comemorativa do 16.º aniversário da Unidade Especial de Polícia da PSP. -- Foto: JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA
Luís Carrilho, esta terça-feira, na cerimónia comemorativa do 16.º aniversário da Unidade Especial de Polícia da PSP. -- Foto: JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

Luís Carrilho. Dos cenários de guerra à segurança dos presidentes, um low profile “muito hábil”

É o rosto do espírito de missão e dever de obediência. Low-profile, usa a diplomacia como arma negocial, mas não terá vida fácil: em plena luta de classe, a Luís Carrilho, recém-nomeado Diretor Nacional da PSP, os comandados exigem que seja o primeiro da corporação e não o último da tutela.
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O que se pede a um Diretor Nacional da PSP? O comissário Bruno Pereira não hesita. “Que seja justo, leal e camarada.” O líder do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia diz mais. “Que seja cumpridor firme do código de ética a que estamos fortemente vinculados e um defensor da Constituição, se preciso for dando a vida por ambos. Que esteja ao serviço dos seus homens.” Em plena reivindicação por condições salariais iguais às dos agentes da Polícia Judiciária, um outro sindicalista, Paulo Jorge Santos, da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), também não hesita. “Que seja o nosso diretor e não um diretor do Governo.”

Espera Luís Carrilho, recém-nomeado diretor nacional da PSP, vida difícil. Aqueles que vai comandar exigem-lhe que seja o primeiro da corporação e não o último da tutela. Sem meios termos, sabendo que têm pela frente uma natureza “suave”, avessa a medidas radicais e braços-de-ferro. “Estamos expectantes”, diz Paulo Jorge Santos, muito interessado em ouvir “as explicações” da ministra, apesar de Blasco, ontem, ter afirmado que a aposta em Luís Carrilho se prende com “a reestruturação profunda da PSP” que o Governo pretende fazer.

“Por que razão não poderia Barros Correia protagonizar as tais mudanças de perspetiva que o Governo defende”, questiona, fazendo referência ao exonerado diretor nacional, marcadamente aliado dos protestos policiais. “Não se percebe”..

A troca foi vista com maus olhos. “Queremos uma explicação da ministra”, insiste também Bruno Pereira, lembrando que não há coincidências – ao fracasso das primeiras reuniões com Margarida Blasco sucedeu, de imediato, a mudança de comando.

Não conte Luís Carrilho com o estado de graça. Contrariando a tradição, chega ao topo sem o grau de Superintendente-Chefe, e de entre os Superintendentes não é sequer o mais antigo.

Low profile revelado na diplomacia, no trato e sorrisos desarmantes, Carrilho terá de provar que a moderação será forte aliada negocial. “Que não sirva para calar as hostes”, avisa Bruno Pereira, reconhecendo, no entanto, ao novo líder “desenvoltura linguística e argumentativa”, assim como “grande facilidade a mover-se nos corredores do poder”. Um antigo colega de curso fala em “habilidade”. “Essa poderá ser a maneira de convencer o poder político”.

Próximo ideologicamente do Executivo, Carrilho alia ao forte espírito de missão a defesa intransigente do dever de obediência. Teme-se que esteja do “lado errado das negociações”, dizem algumas fontes contactadas. Lembram a resposta do então comandante da Unidade Especial de Polícia da PSP ao Grupo de Intervenção que recorreu a baixa médica antes do Benfica-Gil Vicente, como forma de protesto por melhores salários e condições de trabalho. Carrilho extinguiu o grupo, distribuindo os efetivos por outras unidades.

“Excelente profissional, muito atento aos pormenores, dedicado, humano, empático. Recolhe simpatia dos pares e das bases. Nunca escondeu que queria ser diretor nacional”, acrescenta um outro ex-colega de curso. Porém, reconhece a dificuldade da tarefa: “Vai cair de paraquedas no caldo negocial. Se for para enfraquecer o processo negocial, faz sentido.”

Ilhéu

Considera-se “ilhéu por definição” (DN, 2017), apesar de ter nascido em Vila do Porto, na ilha açoriana de Santa Maria, por mero acaso. Os pais são de Sobreira Formosa, terra beirã, destino falhado, ao contrário das pisadas paternas: filho de polícia quis ser polícia. Estava escrito, apesar do interesse pela Engenharia Civil, curso que chegaria a frequentar.

As ilhas, obra do imprevisto, acompanham-no. Aos 5 anos: Cabo Verde. Aos 34 anos: Timor-Leste, na Administração Transitória das Nações Unidas, onde fez duas missões da ONU e foi o primeiro diretor da Academia da Polícia Nacional daquele país. Aos 47 anos: Haiti, dois anos, também em missão das Nações Unidas.  

Passos de um caminho internacional, reconhecido e prestigiado, que o levaria depois à República Centro-Africana e ao lugar de conselheiro de Polícia das Nações Unidas e diretor da Divisão de Polícia no Departamento de Operações de Paz da ONU em 2017, tendo coordenado em 2018 e 2022 as reuniões do UNCOPS – United Nations Chiefs of Police Summit”.

No gabinete do 22.º andar do edifício-sede da ONU, em Manhattan, ou em cenários de guerra, na mochila traz um terço católico, oferta de Francisco por altura da visita papal à República Centro-Africana (RCA), em novembro de 2015, quando o oficial português ainda comandava a polícia da ONU naquele país.

“Dele sei que é muito conhecido no estrangeiro”, comenta Paulo Jorge Santos. Mas Carrilho foi também chefe do Serviço de Segurança e oficial da Segurança do Presidente da República de Portugal, comandante do Corpo de Segurança Pessoal da Polícia de Segurança Pública e responsável, em diversas circunstâncias, pela segurança direta do PM e de altas entidades estrangeiras que visitavam o país.

Luís Carrilho é  licenciado pela Escola Superior de Polícia – ESP – (atual Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna – ISCPSI) da PSP, pertencendo ao 3.° CFOP – Curso de Formação de Oficiais de Polícia. Pós-graduação em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais. Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, mereceu o Outstanding Role Model Award atribuído pelo Secretário-Geral da ONU em 2015.

Defensor do aumento do número de mulheres polícias em missões, sobretudo as que decorrem em cenário de conflitos armados, não gostaria que as duas filhas seguissem as pisadas do pai e do avô.

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