Padrasto de Rodrigo pode ser julgado por homicídio no Brasil

A extradição do brasileiro não é possível mas Portugal pode pedir a transferência do inquérito, com todas as provas recolhidas, para Cuiabá, onde está o suspeito Joaquim Lara Pinto
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O padrasto de Rodrigo Lapa pode ser julgado no Brasil pelo homicídio do jovem de 15 anos, apesar de a sua extradição para Portugal não ser possível, por ser um cidadão brasileiro (é uma garantia constitucional dada aos seus nacionais pelo Brasil).

Há duas formas de este crime de sangue não ficar impune e de se demonstrar a culpa (ou não), em julgamento, de Joaquim Lara Pinto, apontado como o principal suspeito do homicídio do jovem. "Ou Portugal pede a transferência do processo de cá para lá, com toda a prova recolhida a ser enviada. Ou aplica-se a lei penal brasileira e é aberto um inquérito crime no Brasil por homicídio", explicou, em declarações ao DN, a advogada Vânia Costa Ramos, especialista em Direito Penal internacional. Ou seja, quando o inquérito estiver concluído, a Polícia Judiciária portuguesa pode remetê-lo para as autoridades de Curiabá. Esta cidade de 575 mil habitantes é a capital do estado brasileiro de Mato Grosso, para onde Joaquim Lara Pinto viajou a 22 de fevereiro, o dia em que mãe de Rodrigo comunicou o desaparecimento do filho à polícia.

Em tese, Joaquim Lara Pinto pode vir a ser detido no Brasil e pode até cumprir pena no seu país pelo homicídio qualificado do jovem. O Código Penal brasileiro pune este crime com 12 a 30 anos de prisão (em Portugal é de 12 a 25 anos).

O blog do penalista brasileiro Vladimir Aras resume muito bem a importância de se usar o instrumento da transferência penal para contornar a impossibilidade de extraditar os brasileiros: "A garantia da sociedade (nacional e estrangeira) é a de que este indivíduo - refere-se aqui a qualquer cidadão do país - será processado em território brasileiro, pelo crime que cometeu em solo alienígena. A inextrabilidade do nacional não é uma cláusula de garantia de impunidade(...)".

Rodrigo Lapa foi assassinado de forma violenta e disso a PJ não tem dúvidas. O seu corpo foi encontrado na quarta-feira num ermo perto de casa, em Malheiro, Portimão, exibindo sinais de arrastamento, de ter sido transportado para ali. Apresentava um cabo elétrico enrolado à volta do pescoço, os pés e mãos atados e uma lesão na cabeça. O cadáver foi descoberto mais de uma semana depois de ter sido reportado o desaparecimento do jovem.

Toxicologia e ADN pedidos

A autópsia foi concluída ontem, às 11.00, no gabinete Médico-Legal e Forense do Barlavento, em Portimão. Mas ainda não há relatório final porque foram pedidos exames complementares de toxicologia, genética (ADN) e histologia (tecidos biológicos), adiantou ao DN o porta-voz do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML). "O relatório final da autópsia só estará pronto dentro de um mês e meio", esclareceu ainda Mário Martins.

Até a meio da tarde de ontem, ainda nenhum familiar tinha vindo reclamar o corpo de Rodrigo no Gabinete de Portimão. A mãe do jovem, Célia Barreto, que por enquanto ainda tem o estatuto de testemunha no processo, passou o dia de ontem em casa de uma amiga, para onde já tinha ido na quarta-feira, depois de ter sido levada duas vezes pela Polícia Judiciária para inquirições. A mulher apresentou algumas contradições no seu depoimento e só depois de o corpo do filho ter sido encontrado é que contou à PJ que Rodrigo e o padrasto tinham discutido na manhã em que o jovem desapareceu. Joaquim Lara Pinto terá ido atrás de Rodrigo quando este saiu de casa para ir para a escola.

No início de fevereiro, o padrasto brasileiro já tinha comprado o bilhete para a sua terra natal e partiu no dia 22, segunda-feira da semana passada, precisamente no dia em que Rodrigo desapareceu. A mãe de Rodrigo, que tem uma filha bebé com o brasileiro Joaquim, terá ouvido barulho em casa nessa segunda-feira de manhã.

O crime pode ter acontecido dentro da residência mas ainda permanece nebuloso o conhecimento que Célia Barreto teve dos factos. À medida que a investigação da Polícia Judiciária prossegue, o seu estatuto ainda pode vir a mudar, de testemunha para arguida, caso se demonstre ter sido cúmplice no encobrimento do crime com o ex-companheiro.

Sinalizado na Comissão

Célia e Joaquim tinham uma relação de pouco mais de um ano. O relacionamento entre Rodrigo e o padrasto brasileiro sempre terá sido difícil. O jovem estava sinalizado pela Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Lagoa desde o divórcio dos pais há cinco anos. Era em Lagoa que Rodrigo residia com o pai. O processo transitou para a comissão de Portimão, depois da mudança de residência dojovem para a casa da mãe.

Na internet foi criada a página "Até sempre Rodrigo Lapa", onde se multiplicam as mensagens de pesar de amigos e conhecidos do jovem e as críticas à mãe de Rodrigo por ter falhado na sua proteção. Nas redes sociais está a ser convocada para sábado, às 21.00, uma homenagem ao jovem, na zona ribeirinha de Portimão, para a qual as pessoas são convidadas a levar uma peça de roupa branca e uma flor branca. Às 21.30 está previsto que se cumpra um minuto de silêncio e se atirem as flores ao rio Arade.

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