Entre as causas de morte das pessoas que tiveram mais obituários na imprensa nacional e internacional em 2024 houve vítimas de cancro, algumas mortes relacionadas com covid-19, acidentes e a idade avançada de pré ou pós-centenários. Mas uma das marcas do ano que agora termina é que ser inimigo dos regimes da Rússia e de Israel revelou ser fatal para alguns “notáveis”.No caso de Alexei Navalny, que terá morrido a 16 de fevereiro, com apenas 47 anos, a única parte incerta da notícia era, desde há muito, o “quando”. O ativista pró-democracia e denunciante da corrupção na Rússia teve de ser tratado em Berlim, no verão de 2020, ao ser envenenado com o agente químico Novichok, alegadamente pelos serviços secretos do seu país. Recuperado, voltou a Moscovo, e foi preso por violação da liberdade condicional. Estivera recentemente em parte incerta até o paradeiro voltar a ser conhecido. O vencedor do Prémio Sakharov em 2021 fora transferido para uma prisão próxima do Ártico, onde passou os últimos dias. Nenhuma causa foi atribuída à morte de quem, segundo as autoridades prisionais russas, se sentiu mal após um passeio..Já Israel assumiu a autoria de muitas mortes. Uma das quais só cinco meses depois: do palestiniano Ismail Haniyah, líder político do Hamas, morto a 31 de julho, aos 62 anos, pela detonação de explosivos na casa onde se encontrava, em Teerão, para assistir à posse do presidente iraniano. Antes disso, três filhos e quatro netos de quem era visto como moderado no seio do Hamas foram mortos num ataque da aviação israelita. Assumida de imediato foi a eliminação do clérigo xiíta Hassan Nasrallah, secretário-geral do partido e grupo terrorista Hezbollah desde 1992, a 27 de agosto. Nem estar num bunker subterrâneo, perto de Beirute, salvou o libanês de 64 anos, que era um dos extremistas mais carismáticos do Médio Oriente e ordenou lançamento de rockets e incursões de drones no norte de Israel, respondendo à retaliação dos ataques palestinianos de 7 de outubro de 2023. .Também com lugar de destaque nos alvos do governo de Netanyahu, o líder do Hamas na Faixa de Gaza, Yahya Sinwar, foi morto na casa em que se escondia, em Rafah, a 16 de outubro. A recolha de ADN confirmou ser ele o homem de 61 anos, encontrado morto com farda militar e uma metralhadora AK-47. Nas redes sociais foi possível ver como o palestiniano, já ferido, tentou atacar um drone..Campeões dos relvados.Logo em janeiro começaram a partir figuras históricas do futebol. Com dois dias de diferença, nos dias 5 e 7, morreram o brasileiro Mário Zagallo, de 92 anos, tetracampeão mundial (enquanto jogador, em 1958 e 1962, selecionador, em 1970, e treinador-adjunto, em 1994), e o alemão Franz Beckenbauer, de 78 anos. O ex-presidente do Bayern de Munique, que começou por ser médio e acabou central, foi campeão mundial como jogador (1974) e selecionador (1990), em ambos os casos pela República Federal da Alemanha. Aos 63 anos, também alemão e vencedor em 1990, morreu Andreas Brehme, a 20 de fevereiro, enquanto a 5 de maio faleceu o argentino César Luis Menotti, de 85 anos, que levou a Argentina ao seu primeiro título mundial em 1978. Longe desse patamar, mas com a honra de ser o primeiro estrangeiro à frente da seleção de Inglaterra, o sueco Sven-Goran Eriksson foi um exemplo de serenidade na luta contra o cancro no pâncreas. Morreu a 26 de agosto, aos 76 anos, quem ficou ligado ao futebol português por treinar o Benfica (1982-1984 e 1989-1992). Ganhou três campeonatos, uma Taça de Portugal e uma Supertaça, sendo finalista vencido na Taça UEFA (1983) e na Taça dos Campeões Europeus (1990). .Bem melhor foi o palmarés de Artur Jorge, que levou o FC Porto à conquista da Taça dos Campeões Europeus em 1987, sendo o primeiro treinador português a vencer a competição. Foi tricampeão pelos azuis e brancos, erguendo duas taças e três supertaças, antes do título francês pelo Paris Saint-Germain. Há muito afastado do futebol, morreu a 22 de fevereiro, aos 78 anos. A 8 de fevereiro, morrera João Oliveira Pinto, de apenas 52 anos, vítima de leucemia, cujo auge da carreira foi ser campeão mundial de sub-20, em 1991. E também cedo, aos 57 anos, a 20 de março, António Pacheco, protagonista de uma polémica transferência do Benfica para o Sporting. .Mais emblemáticos eram Minervino Pietra, falecido a 7 de março, aos 70 anos, que dedicou grande parte da vida ao Benfica, com quatro títulos de campeão e cinco taças de Portugal enquanto defesa, antes de integrar equipas técnicas. E um dos maiores pontas de lança portugueses de sempre, Manuel Fernandes, travado pelo cancro a 27 de junho, após ver o mais recente troféu de campeão do Sporting, do qual era um símbolo. Tinha 73 anos e, além de dois títulos de campeão, duas taças de Portugal e uma supertaça pelos leões, destacava-se pelos quatro golos na histórica goleada de 7-1 sobre o Benfica. .Emblemáticos e romântico.Entre as figuras da cultura desaparecidas em 2024 destacam-se dois homens emblemáticos. A 30 de abril, acabou a história do norte-americano Paul Auster, que ao longo de décadas foi considerado um dos melhores escritores do mundo. O autor da Trilogia de Nova Iorque tinha 77 anos, menos 11 do que o franco-suíço Alain Delon, morto a 18 de agosto. Sex symbol dos anos 60 e 70, fez filmes como Rocco e os seus Irmãos, O Leopardo e A Piscina.Também morreram os atores norte-americanos Louis Gossett Jr. (87 anos), Gena Rowlands (94 anos) e James Earl Jones (93 anos), o estilista italiano Roberto Cavalli (83 anos), a escritora canadiana Alice Munro, vencedora do Nobel da Literatura (92 anos), a cantora francesa Françoise Hardy (80 anos), o ator canadiano Donald Sutherland (88 anos), o escritor albanês Ismail Kadaré (88 anos), o magnata da televisão brasileiro Sílvio Santos (93 anos), a atriz britânica Maggie Smith (89 anos), o cantor britânico Liam Payne (31 anos), o produtor musical norte-americano Quincy Jones (91 anos), o escritor brasileiro Dalton Trevisan (99 anos) e ainda a atriz espanhola Marisa Paredes (78 anos). .Em Portugal, além do realizador António-Pedro Vasconcelos (84 anos), do poeta Nuno Júdice (74 anos), do pintor e ceramista Manuel Cargaleiro (73 anos), do músico Fausto Bordalo Dias (75 anos) e da atriz Graça Lobo (85 anos), o adeus mais intenso foi dado a João Simão da Silva, que morreu a 24 de outubro, aos 79 anos. Conhecido pelo nome artístico Marco Paulo, foi um dos principais cantores românticos nacionais e lutou até ao fim contra o cancro, continuando a apresentar o seu programa televisivo..Figuras da Revolução.No ano do 50.º aniversário do 25 de Abril de 1974, Portugal perdeu um dos símbolos da Revolução, com a morte de Celeste Caeiro, que ofereceu cravos do restaurante em que trabalhava aos militares que entraram em Lisboa para derrubar a ditadura. Morreu a 15 de novembro, aos 91 anos, mais um do que Camilo Mortágua, resistente contra o Estado Novo - que a 4 de fevereiro perdeu um dos seus últimos ministros, Rui Patrício, de 91 anos -, participando no sequestro do paquete Santa Maria, no qual morreu um dos pilotos, e o desvio de um avião da TAP. O pai das deputadas Joana e Mariana Mortágua morreu a 1 de novembro. E já a 18 de dezembro morreu Almada Contreiras, de 83 anos, que escolheu Grândola Vila Morena como a senha da operação militar que pôs fim ao regime. Grande impacto teve também a despedida da ex-procuradora-geral da República Joana Marques Vidal, falecida a 9 de julho, com apenas 68 anos, após semanas em estado de coma na sequência de uma cirurgia motivada por problemas oncológicos. Ligada ao combate à corrupção, deixou marca enquanto primeira mulher a assumir esse cargo..O jornalismo perdeu o ex-diretor-adjunto da TSF Pedro Cruz (53 anos), João Paulo Guerra (82 anos), Emídio Fernando (59 anos) e o antigo editor de fecho do DN, João Galamba (76 anos).