IGAS aponta dedo aos serviços do ministério na avaliação à greve dos técnicos do INEM em novembro
“O INEM, I.P., não recebeu atempadamente a comunicação de pré-avisos das greves gerais convocadas para os dias 31 de outubro e 4 de novembro, pelo que, não tendo conhecimento dos detalhes neles constantes quanto ao tipo e duração das greves, bem como dos serviços mínimos propostos, ficou inviabilizada a possibilidade de eventual contestação dos serviços mínimos tendente à sua negociação, o que apenas poderia ter sido feito nas primeiras 24 horas seguintes à respetiva emissão de cada pré-aviso”.
Esta é uma das conclusões constantes no relatório preliminar da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) sobre o processo de inspeção instaurado por esta entidade a 11 de novembro à atividade do INEM durante a greve dos técnicos às horas extras, depois de se ter conhecido que tinham sido registadas 10 mortes de doentes por suspeita de falta de socorro pré-hospitalar, nos dias 31 de outubro e 4 de novembro.
Três meses depois, a IGAS vem dizer que não se pode responsabilizar o INEM pela não definição de serviços mínimos nos dois dias em que a decorria em simultâneo a greve dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) e uma greve geral da função pública, apontando o dedo aos serviços do Ministério da Saúde, nomeadamente à Secretaria Geral, que não cumpriu o procedimento legal de informar a estrutura do instituto de emergência.
Neste processo de inspeção, que se centrou na verificação do cumprimento das normas de organização do trabalho e da capacidade operacional dos Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) do INEM, nos períodos das greves decretadas em outubro e novembro de 2024, e no impacto destas no socorro aos utentes, a IGAS identificou o seguinte: “Os pré-avisos das greves gerais decretadas (i) pela Federação Nacional de Sindicatos Independentes da Administração Pública e de Entidades com Fins Públicos (FESINAP) e pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Serviços e de Entidades com Fins Públicos (STTS), integrado na FESINAP, para o dia 31 de outubro e (ii) pela FESINAP, para o dia 4 de novembro, não foram comunicados diretamente ao INEM, I.P., mas sim à Secretaria-Geral do Ministério da Saúde (SGMS) e aos gabinetes dos membros do governo (que, no caso da saúde, os remeteram à SGMS no dia 24 de outubro)”.
Ou seja, tanto a SGMS como os gabinetes da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, como os das duas secretárias de Estado, nomeadamente a da Gestão da Saúde, Cristina André, que tinha na altura a tutela do INEM, não informaram o INEM desta greve, não acautelando a sua atividade.
Atividade do INEM não foi acautelada
No relatório preliminar, que esta quarta-feira foi dado a conhecer ao Ministério da Saúde, é ainda referido que “além das carências operacionais existentes e da procura extraordinariamente elevada registada no dia 4 de novembro de 2024, a mitigação do impacto da sobreposição da greve dos TEPH ao trabalho suplementar com as greves gerais da administração pública, em especial no dia referido, a capacidade operacional dos CODU não foi acautelada, por não terem sido acionados os mecanismos e formalidades legalmente previstos para contestar e negociar os serviços mínimos, nem para fixar o cumprimento dos serviços mínimos previstos no acordo coletivo de trabalho vigente”, pode ler-se na nota feita para a Comunicação Social.
Ainda assim, refere a IGAS, “durante a greve de 4 novembro foram implementadas medidas adequadas para, dentro das limitações existentes, minimizar o seu impacto”.
Das três greves convocadas, entre outubro e novembro, a IGAS destaca que “apenas a greve ao trabalho suplementar/horas extraordinárias, decretada pelo Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH), com início às 00:00 horas do dia 30 de outubro de 2024, por tempo indeterminado, foi comunicada ao INEM, I.P., através do pré-aviso de greve, remetido pela respetiva entidade sindical que a convocou”.
Segundo concluiu a IGAS, o INEM “apenas teve conhecimento da greve de dia 31 de outubro, no próprio dia, constatando-se terem sido atingidos 80% dos trabalhadores escalados”.
No que toca à greve de 4 de novembro, “ainda que tivessem tomado conhecimento antecipado da sua realização, não foi seguido nenhum procedimento para a convocação dos trabalhadores escalados para a prestação dos serviços mínimos em períodos de greve, dado que esse procedimento não foi desenvolvimento pelas entidades sindicais até 24 horas antes do início da greve”, refere o documento. Contudo, destaca, que só se “verificou incumprimento dos serviços mínimos no turno da tarde, entre as 16h e as 24horas”, tendo sido, no dia 4 de novembro, “desencadeadas medidas de contingência que se revelaram dentro do possível adequadas”.
Após a greve do dia 4, no dia 6 de novembro, por deliberação do Conselho Diretivo, “foram então desencadeadas ações que estabilizaram o funcionamento dos CODU e permitiram debelar as fragilidades procedimentais no planeamento e preparação da greve geral da administração pública ocorrida no dia 6 de dezembro, garantindo, nesse dia, uma resposta mais adequada”.
Recomendações ao INEM e à SGMS
Perante esta situação, a IGAS no seu relatório preliminar emitiu cinco recomendações, “quatro dirigidas ao INEM, I.P. e uma à SGMS”.
Em relação ao INEM, a IGAS recomenda que desenvolva “um procedimento formal para a revisão periódica dos rácios de pessoal de acordo com a evolução da procura pelos CODU e com a evolução da sua performance face às alterações organizacionais com impacto operacional”.
Mais. O INEM deve ainda “definir e monitorizar um objetivo para o indicador relacionado com o tempo até ao atendimento das chamadas de emergência”; “apresentar nos documentos de gestão informação sobre o volume e o peso do trabalho suplementar na atividade dos CODU; e definir um procedimento de atuação para o planeamento e organização do trabalho em caso de greve, que contemple uma pronta avaliação tendente à eventual contestação e negociação dos serviços mínimos propostos, bem como a fixação dos serviços mínimos e convocatória formal dos trabalhadores escalados para o seu cumprimento, quando não definido pelas entidades sindicais até 24 horas antes do início de cada período de greve”.
Em relação à Secretaria Geral do Ministério da Saúde, a IGAS recomenda que seja adotado “um procedimento para o reencaminhamento imediato de todos os pré-avisos de greve recebidos de entidades sindicais ou dos gabinetes ministeriais às entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde”.
A IGAS informa ainda que este relatório preliminar foi já enviado às autoridades envolvidas para procederem ao contraditório.