Há mais crianças internadas com covid-19 do que por causa da covid-19

Mais de 100 mil crianças entre os 0 e os 9 anos foram infetadas pelo SARS-CoV-2, mas são raros os internamentos por esta causa. A pediatra Tânia Russo defende ao DN que a vacinação tem de continuar. Este fim de semana é dedicado à vacinação entre os 5 e os 11 anos
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Desde 10 de janeiro, dia em que as escolas abriram as portas para o segundo período, que mais de 100 mil crianças dos 0 aos 9 anos contraíram a infeção por SARS-CoV-2. E esta taxa de positividade também se tem refletido nos hospitais e nos internamentos. "O que temos estado a assistir nos serviços de urgência é a uma taxa de positividade muito superior em relação à que tínhamos há uns meses ou há um ano", confirma ao DN a pediatra Tânia Russo.

Mas, segundo a especialista, "temos muito mais crianças internadas com covid-19 do que por covid-19. Ou seja, são internadas por outro motivo, mas acabam por testar positivo à covid quando fazemos o rastreio obrigatório para garantir a segurança de todos os que estão internados e de todos os que trabalham no ambiente hospitalar", explica a médica, que exerce funções numa unidade pediátrica da Grande Lisboa.

No fundo, e como ressalva, temos uma situação muito semelhante à que se tem assistido nos internamentos dos adultos nesta fase da pandemia, marcada por infeções da nova variante Ómicron, que é mais contagiosa, mas menos severa do que a Delta. Contudo, destaca: "Não quer dizer que não tenhamos um ou outro caso de doença aguda ou pós-aguda provocada pela covid-19, mas esses casos são raros, e, até agora, os internamentos que temos tido por este motivo têm-se resolvido sem consequências piores."

Destaquedestaque301 105. Este é o número de crianças que já receberam uma dose da vacina contra a covid-19, segundo o boletim diário de vacinação de ontem. Tendo em conta que o universo total na faixa etária dos 5 aos 11 anos é de 626 mil crianças, que 100 mil adquiriram a infeção nas últimas semanas, faltam vacinar 225 mil. Só 21 mil se inscreveram para a vacinação neste fim de semana.

Quanto a números que possam sustentar esta fase da infeção na faixa etária mais nova, Tânia Russo confessa não os ter. "Não temos esse levantamento feito, mas, de uma forma empírica, é a isto que temos assistido nas urgências dos hospitais." Uma situação que, e apesar de não haver grande pressão nos serviços saúde, na faixa pediátrica, já causou alguns constrangimentos na gestão de vagas, explicando o porquê.

"As crianças entram, são observadas e ficam com a indicação para internamento. Depois são testadas, dão positivo e, muitas vezes, os pais ou os educadores que as acompanham também, e todos eles têm de ficar isolados de todas as outras crianças internadas. E isto tem criado alguma dificuldade em gerir as vagas nos internamentos."

A boa notícia, como faz questão de salientar, é que se hoje em dia é possível viver a pandemia de "uma forma mais atenuada" - apesar dos milhares de casos ainda detetados diariamente - "devido à vacinação". A médica lembra que "a infeção por SARS-CoV-2 tem menos gravidade na faixa etária pediátrica do que na idade adulta, sobretudo nos mais idosos, e que, mesmo em relação aos casos mais graves, como os de miocardites, que até foram muito falados por alguns que assumiram uma atitude mais cautelosa em relação à vacinação, já se percebeu que a sua incidência é maior quando há infeção do que na sequência da vacina".

Por isso mesmo, admite, "quando sou confrontada por alguns pais sobre a vacinação e os seus efeitos tenho passado sempre a mesma mensagem: a doença não é tão grave em idade pediátrica, mas sabemos que as crianças são transmissoras, levando a infeção aos pais ou a outros cuidadores, que têm de ficar em isolamento. Isto tem custos para os adultos, quer pessoais quer laborais, e também para as próprias crianças, em termos de aprendizagem. E é importante garantirmos que as pessoas possam continuar a exercer a sua atividade profissional e que as crianças possam continuar a ir à escola, para fazerem a sua aprendizagem e para manterem a sua socialização".

Destaquedestaque47 199. Este é o número de infeções por SARS CoV-2 registadas ontem. Portugal soma 2 843 029 de infetados. Houve ainda 50 óbitos, sendo agora o total de 20 127. Em termos de internamentos, houve mais cinco do que no dia anterior, havendo agora 2445 internados, dos quais 174 em unidades de cuidados intensivos, mais 19 do que no dia anterior. A incidência mantém-se elevada, mas o R(t) está a descer, mais próximo de 1. (1.05) a nível nacional.

Para a pediatra estes são motivos suficientes que justificam a vacinação, defendendo que "temos de continuar a vacinar-nos. Não podemos desistir, nem em Portugal, nem na Europa, nem no resto de mundo. A vacinação tem de chegar a todo o lado para se conseguir atenuar cada vez mais a pandemia".

A médica apresenta outro argumento: "A vacina recomendada tem sido estudada nesta faixa etária em que está autorizada. A decisão de recomendar foi tomada por peritos da Comissão Técnica de Vacinação com base em estudos internacionais sobre a eficácia e a segurança da vacina. E sabemos que, de uma maneira geral, a vacina é segura. Isso já se viu nos adultos como até nos adolescentes que foram vacinados, muito antes das crianças mais pequenas. Até agora, não têm sido registadas reações adversas com grande frequência, nem graves, que nos levem a recuar na posição assumida pelas autoridades de saúde e a não recomendar a vacina."

A especialista Tânia Russo considera, por isso, que "os pais devem manter a vacinação dos filhos. Este é o conselho que dou". Os centros de vacinação vão estar, neste fim de semana, em exclusivo a vacinar crianças dos 5 aos 11 anos.

De acordo com dados fornecidos ao DN pelo Núcleo de Apoio à Vacinação, para a segunda dose foram convocadas 57 mil crianças e para primeiras doses foram feitos 21 mil autoagendamentos. Porém, e como referiu ontem à comunicação social a diretora-geral da Saúde, mesmo que haja crianças que não tenham sido convocadas por SMS para a segunda dose ou que não tenham feito autoagendamento para a primeira, os pais podem levá-las para serem vacinadas na modalidade casa aberta. Aliás, nos últimos dias, Graça Freitas fez de novo um apelo aos pais das crianças desta faixa etária para que adiram à vacinação.

O processo de vacinação desta faixa etária teve início no fim de semana de 18 e 19 de dezembro de 2021. O universo elegível de crianças para a vacinação era de 626 mil crianças, já foram vacinadas 301 mil, tendo em conta que nas últimas mais de 100 mil contraíram a infeção, e estima-se que ainda há por vacinar cerca de 225 mil. A vacinação nesta faixa etária tem sido das mais contestadas, com alguns pediatras a solicitarem insistentemente para que o processo seja revisto. O argumento não tem que ver com a segurança da vacina, mas com o facto de se estar a administrar uma vacina em crianças saudáveis e numa faixa etária em que a doença tem pouca gravidade.

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