"É mandatório que se crie um cordão humanitário dentro da Ucrânia para tratar quem lá está"

Ordem dos Médicos criou um Gabinete de Apoio Humanitário com destino aos refugiados e a quem necessitar de ajuda no terreno. Bastonário disse ao DN haver médicos portugueses, ucranianos e russos disponíveis para este gabinete e que os ministérios da Saúde e dos Negócios Estrangeiros já sabem que poderão contar com esta ajuda.
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Há médicos que estão dispostos a ir para o placo do conflito para ajudar quem precisa, outros para irem até às zonas de fronteiras, quer seja na Polónia ou na Roménia, para levar medicamentos e outro material, dando logo aí apoio médico aos refugiados que pretendem vir para Portugal. E outros ainda que estão disponíveis para observar, acompanhar e tratar todas as pessoas que cheguem ao nosso país vindos fugidos do conflito desencadeado há uma semana pela Rússia contra a Ucrânia.

Isto mesmo foi referido ao DN pelo bastonário dos Médicos, Miguel Guimarães, que, nesta semana, reuniu com mais de duas centenas de médicos ucranianos e russos para saber quais eram as suas reflexões sobre a situação que se desenvolve no Leste da Europa e quais as suas maiores preocupações. E, o mais importante, é que estes médicos mostraram-se disponíveis para responder ao apelo da Ordem. Neste momento, "temos médicos portugueses, ucranianos e russos que se mostraram disponíveis para ajudar esta população".

Para Miguel Guimarães "é mandatório que se crie um cordão humanitário para se fazer chegar aos profissionais que estão no palco do conflito medicamentos, material médico e cirúrgico e até mesmo médicos para que se continue a poder tratar os doentes que já existiam e os feridos desta guerra".

Aliás, e como referiu ao DN, esta foi precisamente uma das preocupações manifestadas pelos médicos que reuniram com a Ordem durante esta semana. "Os profissionais transmitiram-nos que a ajuda pode ser feita a vários níveis, não só através do envio de alimentos, mas também de medicamentos, sabendo-se ao certo que tipo de medicamento ou de material é necessário e para que grupos de doentes - se para crianças, grávidas, idosos ou feridos da guerra", acrescentando que os médicos em causa concordaram em participar nesta iniciativa e que tal "será decisivo para cuidar dos feridos entre a população civil e militar e dos refugiados".

Contudo, e para que tal possa ser feito de forma organizada, era "necessário criar uma logística que respondesse concretamente às necessidades". Daí a ideia de se criar um Gabinete de Apoio Humanitário e que a Ordem "está já a organizar e a planear a logística necessária ao nível da prestação de cuidados quer do material necessário e como fazê-lo chegar", explicando que neste aspeto a Ordem está a ter a ajuda de alguns médicos portugueses militares, bem como a ajuda de médicos ucranianos que também têm formação militar.

O bastonário referiu ainda ao DN que a criação deste Gabinete de Apoio Humanitário e os objetivos que pretende alcançar já foram dados a conhecer aos ministérios da Saúde e dos Negócios Estrangeiros para "poderem saber com o que contam e como os poderemos ajudar no que for necessário", exemplificando: "Imagine que sai de Portugal uma equipa que vai buscar refugiados e que é necessário ir logo um médico ucraniano para fazer a ponte com a população na sua língua mãe".

Miguel Guimarães reforça que considera esta vertente "muito importante, pois cria logo outra empatia e relação com as pessoas". Por outro lado, em Portugal, "tudo está a ser preparado para se observar e acompanhar os refugiados que cheguem. Tenho médicos ucranianos que já nos disseram que fazem questão de serem eles a observar todas as pessoas que cheguem para que estas se possam expressar na própria língua, a não ser que tal não seja possível se se der o caso de ser um número muito elevado".

Segundo os dados disponibilizados ao DN pela Ordem dos Médicos, em Portugal há 319 médicos ucranianos a exercer e 149 russos, sendo os primeiros uma das maiores comunidades na área médica e muitos deles já com dupla nacionalidade. "Não há nenhuma sub-região no país que não tenha um médico ucraniano", referiu o bastonário. O DN sabe que dos 319 clínicos, 192 encontram-se em funções na região do Sul e Ilhas, 84 no Norte e 43 no Centro, estando a maioria a exercer nas áreas de Saúde Pública, Medicina Geral e Familiar, Urgências e Medicina do Trabalho.

Em relação aos médicos russos, dos 149 a maioria, 100, também está na região Sul e Ilhas, os restantes estão espalhados pelo Norte (37) e pelo Centro (12). À semelhança do que acontece com a comunidade médica ucraniana, a maioria dos clínicos russos também está nas áreas de cuidados primários, havendo só 17 especialistas em Medicina Geral e Familiar, dez em Medicina Interna e oito em Medicina do Trabalho.

A Ordem recorda que todos estes médicos de nacionalidade estrangeira e inscritos na organização portuguesa tiverem de se submeter a provas teóricas e práticas para conseguirem a validação dos seus diplomas, bem como a um teste de língua portuguesa.

Daí que o bastonário tenha sublinhado: "Portugal tem a sorte de ter uma comunidade médica oriundo de muitos países, mas particularmente do país de que estamos a falar e com o conhecimento profundo do que são as características daquela região. E todos eles estão disponíveis para apoiar quem está no palco de guerra. Só temos de aproveitar esta ajuda", comentou ao DN.

De acordo com dados das organizações internacionais, e em apenas uma semana, estima-se que mais de um milhão de ucranianos tenha saído do seu país para fugir à guerra. Mais de meio milhão serão crianças, segundo anunciou ontem a Unicef. Mas estes números poderão aumentar muito ainda mais se o conflito perdurar por mais tempo. O próprio Governo ucraniano estima que este número possa ir até um total de mais de cinco milhões.

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