Patrícia é uma das doentes com AVC, é o terceiro que sofre, faz reabilitação com a terapeuta Paula Santos.
Patrícia é uma das doentes com AVC, é o terceiro que sofre, faz reabilitação com a terapeuta Paula Santos. Leonardo Negrão

E depois do AVC? “É fazer tudo para voltar a ter uma vida boa, mesmo que não seja igual à anterior”

A cada hora, três portugueses sofrem um AVC, um não sobrevive e metade fica com marcas para a vida. No Dia Nacional do Doente, há quem agradeça aos médicos da Unidade de Santa Maria o “estar viva”.
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Do dia 22 de outubro de 2024, Fátima apenas se lembra de “ter dormido lindamente”, acordado “muito bem”, “ter tomado o pequeno almoço” e, de repente, sem aviso, quando já se arranjava para ir trabalhar, começar “a ficar mal disposta”, faltando-lhe força na perna esquerda. “Sentei-me, mas o meu corpo inclinava-se para o lado esquerdo sem eu fazer nada. Levantei-me de novo, sentei-me e aconteceu o mesmo. O meu marido percebeu logo o que poderia estar acontecer e ligou para o 112, mas a partir daqui não me lembro de mais nada, até acordar no hospital após a cirurgia”, conta ao DN cinco meses depois, durante mais uma sessão de terapia da fala na Unidade do Acidente Vascular Cerebral (UAVC), que integra o Serviço de Neurologia do Hospital Santa Maria, em Lisboa .

Fátima acabou por perder os sentidos, o marido vestiu-a enquanto aguardava pelo INEM, que “foram super rápidos”, recorda a cunhada que a acompanha aos tratamentos, e às 09:21, dava entrada na urgência deste hospital pela Via Verde do AVC, vinda de casa em Vila Franca de Xira.

Patrícia é uma das doentes com AVC, é o terceiro que sofre, faz reabilitação com a terapeuta Paula Santos.
Via Verde já salva vidas, mas há que “melhorar transporte intra-hospitalar”

Da ficha clínica consta, “mulher de 55 anos saudável”, ao que ela acrescenta: “Sem nunca ter tido uma doença ou tomar comprimidos para o que quer que fosse”. Hoje, sem sinais de que alguma vez passou pela doença, “a não ser o cabelo curto, devido à operação, porque sempre o usei comprido”, não se cansa de dizer: “Tive muita sorte. Se estou viva devo-o aos médicos, aos que me operaram e a todo o pessoal que me tem tratado”, ao mesmo tempo que abraça a neurologista Teresa Melo e Pinho, coordenadora da UAVC.

Fátima Graça teve uma AVC há cinco meses e, hoje, agradece a todos que a trataram (e tratam), como a terapeuta da fala Beatriz Stein, por estar viva.
Fátima Graça teve uma AVC há cinco meses e, hoje, agradece a todos que a trataram (e tratam), como a terapeuta da fala Beatriz Stein, por estar viva.Leonardo Negrão

No dia em que falamos, vésperas do Dia Nacional do Doente com AVC, que hoje se assinala, as duas riem-se, mas a médica recorda: “Era um quadro gravíssimo. Uma lesão intracraniana, uma hemorragia extensa no cérebro, mas tudo correu bem. O marido ligou logo para o INEM, ela chegou rapidamente ao hospital e, depois, o mais importante neste caso, foi a decisão médica que, mesmo perante a extensão da hemorragia, decidiu-se avançar para a operação.”

Nem todos os doentes que sofrem um AVC têm a sorte de Fátima Graça, cabeleireira de profissão, porque poderia não ter sobrevivido, poderia ter ficado hemiplégica (com uma parte do corpo paralisado) e poderia ter ficado sem falar. A médica explica: “O AVC é uma lesão no cérebro, no sistema nervoso central, onde estão todas as nossas funções, a da visão, da linguagem, dos movimentos. E muitas pessoas não sabem sequer que é uma lesão cerebral, acham que é no coração e é preciso que cada vez mais a população consiga identificar alguns sintomas da doença para quando estes surgem o doente chegue mais rapidamente ao hospital”.

O retrato traçado pela Sociedade Portuguesa do AVC comprova que “a cada hora, três portugueses sofrem um AVC, um não sobrevive e metade fica com sequelas graves”. É uma das doenças mais imprevisíveis, pode dizer-se que aparece sem aviso, “e continua a ser a principal causa de morte e a doença mais incapacitante para os portugueses”. Contudo, os especialistas acreditam que “80% do casos podem ser prevenidos”.


14 dias de internamento que não foram fáceis

A médica Teresa Melo defende mesmo que se há mensagem apropriada, para este dia dedicado ao doente, é o apelo à literacia da população para que estejam atentos aos fatores de risco, prevenindo-os, e para que saibam identificar os sinais de um AVC. “Quanto mais cedo doente chegar ao hospital, mais cedo se faz o diagnóstico e se começa o tratamento”, porque, volta a sublinhar, “o milagre da vida num AVC está no tempo até ao diagnóstico, na decisão médica e no tratamento dado ao doente”, afirma.

Fátima entrou no hospital na manhã de 22 de outubro pela porta da urgência geral. À sua espera já tinha uma equipa, que confirmou o AVC e decidiu que iria operá-la. Foi e Correu bem. Ficou dois dias nos cuidados intensivos e no dia 24 já estava no internamento da unidade AVC, onde ficou até 4 de novembro, dia da alta clínica e do regresso a casa, mas com reabilitação marcada em ambulatório. “Fui para casa, mas continuei a vir regularmente ao hospital para tratamento”, sustenta.

Ao DN lembra que os 14 dias de internamento não foram fáceis, já que ficou mais tempo do que é normal para um doente agudo, o internamento pode ir de cinco a 10 dias. “Questionei-me muitas vezes. Porquê eu? Nunca tinha tido nada de doenças. Acabei por me sentir um pouco triste”, mas rapidamente assumiu que tinha de continuar em frente e começou a surpreender-se a si própria e aos outros, com a recuperação que estava a alcançar. “O médico ficava admirado quando dias depois da operação me pedia para levantar um braço e depois o outro e eu conseguia, quando me pedia para fazer o mesmo com as pernas e eu também conseguia, até me levantar sozinha e andar. Só a fala me falhava às vezes”.

Teresa Pinho e Melo é a coordenadora da Unidade AVC do Hospital Santa Maria.
Teresa Pinho e Melo é a coordenadora da Unidade AVC do Hospital Santa Maria. Leonardo Negrão

Hoje, já não é assim. A terapeuta que a acompanha confirma-o: “A Fátima representa muito o que é o nosso trabalho, que começa logo com uma avaliação dos doentes ainda na fase aguda, para fazermos o levantamento das suas necessidades e iniciarmos a intervenção. Num AVC é tudo uma questão de tempo, até na reabilitação. Se começarmos no tempo correto, a probabilidade de termos resultados melhores é claramente superior”.

No caso de Fátima, explica, “o maior problema era a dificuldade em encontrar as palavras que queria usar. E dizia muitas vezes: 'Eu sei a palavra, ela está cá algures, mas parece que de repente perdi tudo'. E eu repetia e repito sempre aos doentes: 'Não perdeu, a palavra está lá, bem guardada. É como se tivéssemos que fazer um caminho maior para a ir buscar, mas, no fundo, a reabilitação é isto, treinar, para tornar o discurso mais fluente”.

Fátima soube desde o início o impacto que a doença poderia ter tido em si, embora não tivesse sabido qual a causa concreta para chegar aos 55 anos sem uma doença e ter tido um AVC, mas um dos fatores de risco é o tabaco, e “fumava”. Agora, já não. Agradece vezes sem conta a quem a tratou e “a Deus”, mas depois do AVC “só quer continuar a fazer tudo para ter uma vida boa, para continuar a fazer as coisas que gosto, mesmo que não seja uma vida igual à de antes”.

Sabe que se a sua reabilitação tem sido “espetacular”, como lhe dizem os médicos, mas tal “também se deve a mim e ao meu espírito”, admite. “Em dezembro comecei a ir ao meu cabeleireiro, ficava lá aos bocadinhos, em janeiro comecei a ir uma manhã ou uma tarde e a tentar agarrar no secador e a tentar secar cabelos, agora já os estou a pentear”, ri-se, satisfeita.

Quem a vê, não diz que é uma doente AVC, mas vai continuar a ser até estar completamente bem, mas é preciso fazer tudo para evitar os riscos, porque há quem passe pela experiência mais do que uma vez.

Patrícia já tem alta clínica da UAVC de Santa Maria, mas aguarda vaga para reabilitação intensiva no Alcoitão.
Patrícia já tem alta clínica da UAVC de Santa Maria, mas aguarda vaga para reabilitação intensiva no Alcoitão.

Aos 45 anos, Patrícia sofreu o terceiro AVC

Aos poucos, Patrícia Estrela vai conseguindo levantar-se da cama de internamento na Unidade AVC de Santa Maria, onde está há um mês e meio, e dar alguns passos, mas sabe que o caminho da reabilitação vai ser longo. É a terceira vez que passa pelo mesmo. “Em 2015, tive dois AVC, e não estava à espera disto agora”, desabafa. Só que desta vez, “foi mais forte”. “Sou operadora especializada num hipermercado e, naquele dia, ia entrar à tarde. Chamei um Uber e quando já ia na viagem comecei a deixar de sentir o braço esquerdo e a perna. Achei que conseguia chegar ao trabalho, mas quando o carro parou tentei sair e caí no chão, já não me levantei. Foram clientes que estavam à porta do hipermercado que chamaram o 112”, conta. Entrou na urgência do Hospital São Francisco Xavier pela Linha Verde para o AVC. Ali fez o tratamento inicial e esteve uma noite, só depois foi transferida para Santa Maria, que é o hospital da sua área de residência.

Patrícia conta que quando começou a sentir que estava a ficar paralisada se recordou do que já lhe tinha acontecido, mas “não tive tempo para nada”. “É o terceiro”, repete. “E não sei porque voltou a acontecer”. Sabe que teve um AVC hemorrágico.

Desta vez, teve de ser operada. Ficou paralisada do lado esquerdo, mas já consegue mexer o braço e colocar-se de pé. “A fala não foi muito afetada”, explica-nos. Permanece na UAVC, embora já tenha tido alta clínica, porque aguarda vaga numa unidade de cuidados continuados. “O caso da Patrícia já foi referenciado para reabilitação intensiva no Alcoitão, mas ainda não teve vaga”, explica Paula Santos, a terapeuta que a acompanha.

É uma das doentes que se encontra nesta situação naquela unidade. A coordenadora, Teresa Melo, explica: “Temos três nesta situação, mas já tiveram vagas em unidades de continuados, fora da área de Lisboa e recusaram. A Patrícia já podia estar a ser fazer reabilitação numa unidade na Lourinhã, mas recusou”. E se o diz é porque tem uma razão: “A nossa unidade não é uma unidade de reabilitação, onde os doentes ficam internados para fazer fisioterapia. É uma unidade de tratamento agudo e de investigação da doença. Depois deste processo estar concluído, o doente deve ter alta”, explica.

Mas, na prática, a alta clínica só acontece quando o doente tem condições para o regresso a casa e para a reabilitação em ambulatório. Neste momento, continua a médica, “são três, mas há dias em que temos mais e são camas ocupadas que podem fazer falta para doentes agudos”, porque um “AVC é imprevisível. Num dia, podemos receber dois doentes, noutro cinco ou dez”.

A capacidade da UAVC é de 13 camas, que são extensíveis até às 20 ou 22, como acontece frequentemente. “Termos menos de 13 doentes internados é raríssimo”, refere Teresa Melo. Naquele dia, havia 14 doentes internados, já contando com os três à espera de vaga nos cuidados continuados, o que “é ótimo”, assume.

“Chegamos a ter 22 doentes internados, usando camas emprestadas de outros serviços. É assim que vamos gerindo. A doença é imprevisível”, sublinha. E quanto a isto, pouco há a fazer, a não ser a prevenção, quer dos fatores de risco quer estando atento aos sintomas quando há sinal da doença, porque “é fundamental que qualquer AVC, hemorrágico ou isquémico, chegue aos cuidados adequados o mais rapidamente possível”.

Os doentes mais graves, têm de ser monitorizados pelas máquinas e pelos enfermeiros.
Os doentes mais graves, têm de ser monitorizados pelas máquinas e pelos enfermeiros. Leonardo Negrão

Volta-se a ser a mesma pessoa?

Quem passa pelo piso 6 da Unidade do AVC faz muitas vezes a pergunta: ”Vou voltar a ser a mesma pessoas?”. A médica Teresa Melo não tem dúvidas quanto à resposta que deve dar. “O nosso fim não é ficar igual ao que era. É, a cada dia, ficar melhor. É fazer um caminho para uma vida boa, e não quer dizer que essa vida boa seja igual à que tinha, mas é uma vida boa. É para isto que devemos incentivar as pessoas a seguirem o seu percurso: já ando, já apanho o autocarro, já corro, já consigo sair de casa sozinha. Há pessoas fantásticas que, mesmo com algumas sequelas, têm vidas boas. Há outras que, mesmo sem sequelas, não conseguem atingir este estado. A reabilitação depende do tratamento, mas também de cada doente. Há muitas variáveis emocionais”.

Portanto, há quem volte a ser a mesma pessoa, e até mais atenta à saúde e à doença, e há quem não o consiga. A sobrevivência a um AVC continua a depender do tempo dos sintomas até ao diagnóstico e depois do tratamento, mas hoje em dia há uma vantagem: “Os tratamentos são muito diferentes dos de há 10 ou 15 anos. Estamos sempre a melhorar”, conclui a médica.

Os estudos feitos sobre a doença ao longo dos tempos vieram demonstrar que há cinco sintomas que são os mais comuns, sendo estes já comummente conhecidos pelos '5 F’s'. “Face descaída, assimetria num dos lados do rosto; diminuição da Força, num dos braços, acompanhada ou não também pela diminuição da força na perna; dificuldade na Fala, discurso sem sentido; Falta súbita de visão, alteração da visão ou diminuição abrupta num ou em ambos os olhos ou visão dupla; Forte dor de cabeça”.

Teresa Melo reforça que a presença de um destes sintomas deve levar o doente ou quem está à sua volta a contactar o 112 de imediato, mas que a prevenção deve incidir nos fatores de risco, e um dos mais prevalentes “é a hipertensão arterial”. “Há muitas pessoas que são hipertensas e não sabem. Há quem tenha tido sempre tensão baixa, mas chega a uma altura na vida que isso pode mudar. Portanto, a partir de uma certa idade, é aconselhável que cada pessoa vá medir a tensão arterial”, alertando mesmo: “Os dois fatores de risco mais importantes para um AVC, sobretudo hemorrágico, são o álcool em excesso e a hipertensão arterial. O tabaco também é, mas, nesta área, os governos têm-se empenhado com muitas campanhas para os problemas do consumo”.

O colesterol elevado é outro fator de risco. “Atualmente há um grande número de pessoas a fazerem medicação para o colesterol. Aceitam fazer um comprimido de estatina, mas não têm cuidado com a alimentação”, destaca.

Na Neurorradiologia, tratava-se uma Via Verde, uma mulher, saudável, de 93 anos, mas com um AVC
Na Neurorradiologia, tratava-se uma Via Verde, uma mulher, saudável, de 93 anos, mas com um AVC Leonardo Negrão

Mas um dos fatores mais prevalentes na população idosa “é a fibrilhação auricular, um tipo de arritmia que facilita a ocorrência de trombos dentro do coração, que depois se libertam na circulação e que podem provocar uma embolia, não só para o cérebro, e a partir de uma certa idade esta é a causa mais frequente dos acidentes vasculares, como para outras partes do corpo”.

Por isto mesmo, Teresa Melo afirma: “No caso de ser identificada uma fibrilhação auricular, o doente terá que fazer tratamento com anticoagulantes. A deteção desta causa é muito importante, quer na prevenção primária, em doentes que nunca tiveram AVC, quer na prevenção secundária, nos doentes que já tivera e que tem de ser prevenido o segundo ou o terceiro. Esta é a forma correta de se fazer a prevenção nos doentes que têm a fibrilhação auricular”.

À pergunta se hoje há mais Acidentes Vasculares Cerebrais ou se a doença está a afetar mais os jovens, a médica considera que não. “Há mais interesse neste tipo de patologia, fala-se mais e as pessoas ficam chocadas quando se sabe de um AVC numa pessoa mais jovem, mas não quer dizer que existam mais. Passou a ser do conhecimento público, as causas é que podem ser diferentes”. Ou seja, “no idoso o fator de risco mais prevalente é a fibrilhação auricular, num jovem é relativamente frequente detetarmos causas raras, como a dissecção da artéria carótida ou da artéria vertebral”.

Nos jovens, “não é raro diagnosticar-se outras doenças, como uma neoplasia no pulmão, depois de AVC, ou Sífilis. E isto é possível porque após este evento faz-se a investigação da causa, que pode ser mais ou menos complexa, até esgotarmos todas as hipóteses de causa para aquele acidente vascular cerebral”.

Na Neurorradiologia, entra mais um doente: "Mulher saudável, de 93 anos"

Um piso abaixo da Unidade AVC, está o serviço de Neurorradiologia. É por aqui que passam muitos doentes com AVC. E, naquela quinta-feira, não havia mãos a medir. Luísa Biscoito, médica neurorradiologista, sai de uma das salas após intervenção num doente para se preparar para outra. “Vem aí uma Via Verde. Uma mulher, 93 anos, é uma doente saudável, está muito bem do ponto de vista de outras doenças. Tem uma artéria basilar afetada e está com alteração no estado de consciência. Tivemos de pedir a sala da Radiologia para a tratar”, diz à coordenadora da Unidade do AVC, Teresa Melo, quando a encontra no corredor.

Na sala da Neurorradiologia, está a ser tratado um homem com um aneurisma cerebral, portanto “se não conseguíssemos a sala da Radiologia teríamos de transferir a doente para ser tratada numa unidade de outro hospital, nos centrais, por exemplo”, explica ainda.

Entre isto e a chegada do caso, sobram poucos minutos a Luísa Biscoito, mas chegam para nos dizer que, “na Neurorradiologia podemos ter um plano para o dia e saber como é que o dia vai começar, mas nunca sabemos como vai acabar”, ri-se, assumindo que “não é um trabalho monótono. E compensa-nos quando conseguimos fazer a diferença e mudar a história natural destes doentes, quando tratamos artérias de quatro milímetros”.

A médica neurorradiologista, Luís Biscoito, tem de fazer nova intervenção. Observa o caso, assumindo: "Não temos um trabalho monótono".
A médica neurorradiologista, Luís Biscoito, tem de fazer nova intervenção. Observa o caso, assumindo: "Não temos um trabalho monótono".

Desde que o doente chegue ao hospital dentro do período, que é considerado a janela terapêutica, “conseguimos alterar completamente a vida dos doentes”, mesmo com alguma idade, 90 ou mais anos. “O importante é o diagnóstico e a decisão médica no momento certo”, afirma.

No dia em que se assinala o doente com AVC, as médicas Teresa Melo e Luísa Biscoito concordam que muito “mudou nos últimos anos no tratamento do doente AVC”. Além da Via Verde na emergência pré-hospitalar, os hospitais organizaram-se também com uma Via Verde intra-hospitalar, em que as equipas já sabem que um doente suspeito de AVC vai chegar à urgência e um neurologista tem de estar à sua espera.

Depois, é o tempo do diagnóstico e do início do tratamento. Mas “é preciso mais, queremos que os doentes cheguem cada vez mais cedo para os tratarmos melhor”, diz Teresa Melo. Ou, como diz Luísa Biscoito, “é preciso melhorar o que ainda há a melhorar, como o transporte intrahospital. Um doente que chegue mais rapidamente ao hospital é melhor tratado”.

Tudo sobre o AVC

TIPOS

Existem dois tipos de Acidente Vascular Cerebral (AVC), como se pode ver na imagem, que são classificados segundo a causa que está na origem da diminuição do fluxo sanguíneo para uma determinada região do cérebro - o isquémico, que surge quando um coágulo obstruí uma artéria cerebral e interrompe a circulação do sangue; e o hemorrágico, quando se rompe uma artéria inundando o cérebro de sangue e diminuindo a quantidade que passa por essa artéria.

SINTOMAS

As causas são diferentes, mas os sintomas de um e de outro são idênticos. Aliás, o AVC é conhecido como a doença que pode ser detetada pelos ‘5F’s’ (Face, Força, Fala, Falta súbita de Visão, Forte dor de cabeça). Na presença destes sintomas, deve ligar-se para o 112 pedindo ajuda.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico só pode ser confirmado no hospital através de uma TAC ou de uma Ressonância. Por isto, um AVC é uma emergência médica, com uma Via Verde própria para prestar assistência, quer a nível pré-hospitalar, quer a nível hospitalar. Quanto mais depressa o doente chegar aos cuidados e iniciar o tratamento, maior é a possibilidade de sucesso e menores as sequelas que a doença pode deixar.

TRATAMENTO

O tratamento de um AVC pode ser feito por medicamentos, como antihipertensivos e anticoagulantes, ou por trombólise, cateterismo cerebral e terapia hemostática. A escolha depende do tipo e da gravidade. Mas, como dizem os especialistas, a decisão médica no tempo correto salva vidas e melhora-as, deixando os doentes com menos sequelas.

PREVENÇÃO

De acordo com os dados da Sociedade Portuguesa do AVC, 80% dos eventos registados em Portugal poderiam ser evitados. Neste sentido, e no dia em que se dedica ao doente, a SPAVC lança um apelo “Junte-se a Nós no AVC”. Ou seja, “a prevenção depende de todos nós”.

FATORES De RISCO

Há fatores mais difíceis de controlar, como a idade, já que há maior probabilidade de sofrer um AVC a partir dos 65 anos, ou como ter outro tipo de doenças, como Fibrilhação Auricular (Arritmia), ou a própria história familiar - se tiver pai, avô ou um irmão que tenham sofrido um AVC antes dos 65 anos corre maior risco de ter um evento deste tipo também. Mas há fatores que se podem controlar, como a Tensão Arterial (fazer a medição frequente após 65 anos), o colesterol elevado, o consumo de tabaco e de álcool excessivo e a alimentação desequilibrada.

PERSPETIVAS.

De acordo com a Sociedade Europeia de AVC, estima-se que o peso do AVC aumente nas próximas décadas, sobretudo devido ao aumento do número de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, cujo o aumento até 2030 na Europa deve ser de 23%. E foi para atenuar as consequências desta realidade que esta sociedade associada a outras organizações elaboraram um plano de ação para o AVC na Europa, que estabelece metas a atingir para cada um dos domínios de intervenção no AVC. A saber: melhorar prevenção primária, organização de cuidados no AVC, cuidados agudos no AVC, prevenção secundária, reabilitação, avaliação de resultados e vida pós-AVC.

METAS.

Até 2030, é é preciso: Reduzir em 10% o número absoluto de AVC na Europa; Tratar pelo menos 90% de todos os doentes que sofrerem um AVC na Europa numa unidade de AVC dedicada, como primeiro nível de cuidados; Ter planos nacionais para o AVC que abranjam toda a cadeia de cuidados, desde a prevenção primária até à vida pós-AVC; Implementar estratégias nacionais para intervenções multissetoriais de saúde pública para promover e facilitar um estilo de vida saudável e reduzir os fatores ambientais (incluindo a poluição atmosférica), socioeconómicos e educacionais que aumentam o risco de AVC.

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