Diretores e pais pedem grandes mudanças no acesso ao Ensino Superior
Um secundário onde os alunos lutam por cada décima e onde o foco está centrado apenas na média. É este o cenário que pais e diretores de escola, do ensino privado e do ensino público, querem que mude. No Programa do Governo, divulgado no início do mês, o Executivo prometeu reavaliar o modelo de acesso ao ensino superior, com o objetivo de separar "a certificação do ensino secundário e o acesso ao ensino superior". As medidas concretas ainda não são conhecidas, mas a comunidade escolar espera alterações significativas num processo de acesso ao ensino superior que não é revisto há quase duas décadas.
Rodrigo Queiroz e Melo, diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), lamenta o facto de os alunos do ensino secundário serem "reféns das médias, contadas décima a décima". "Neste momento, não basta ser bom aluno. É preciso trabalhar para a décima. Não faz sentido que o foco dos estudantes seja apenas esse. Trabalham apenas para alcançar uma determinada média e ficam reféns dessa necessidade nos três anos de secundário", sublinha.
CitaçãocitacaoNo atual modelo, os três anos do secundário são anos quase perdidos em que os alunos já sabem que só conta a obtenção de uma média.esquerda
Um sistema que, na sua opinião, deixa alunos merecedores e com grandes capacidades à porta das universidades. "Defendemos que deve haver exames no secundário para acesso, mas esse não deve ser o único critério para a entrada no ensino superior. Especialmente nos cursos mais competitivos, a entrada devia ser feita por patamares. Por exemplo, num determinado curso, fixar-se um patamar de média, e a partir da obtenção dessa média mínima, a escolha ser feita, depois, nas universidades. O critério de seleção inicial seria feito por patamares, por exemplo, todos os alunos que tenham mais de 17 valores podem candidatar-se a um determinado curso, sendo a escolha final do candidato feita a nível de instituição superior, a quem caberia a escolha final", explica.
Questionado sobre a alegada vantagem de ser estudante de uma instituição de ensino particular, o responsável diz não fazer qualquer sentido e salienta que as alterações de acesso ao ensino superior, defendidas pela AEEP, tornaram o processo de entrada ainda mais justo e equitativo. "Os alunos do privado e do público estão exatamente na mesma situação. É um mito dizer-se que os do privado são beneficiados nesta questão. Todos fazem os mesmos exames nacionais de acesso ao superior. Em todo o caso, estamos à vontade nesta questão porque sempre fomos a favor de mudar os critérios de entrada e o que defendemos é vantajoso para todos os alunos, quer sejam do público ou do privado", sustenta.
Opinião partilhada por Filinto Lima, presidente Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas (ANDAEP), para quem "a questão de fundo é mais profunda do que a alegada diferença das notas internas entre os alunos do público e do privado" no contexto do acesso ao ensino superior. "Devemos debater de uma vez por todas o modelo de acesso. Este modelo torna subserviente o ensino secundário em relação ao superior. É um secundário feito para obter uma nota de acesso, e isso é redutor. Trata-se de um ensino para o marranço e o grande objetivo é obter a melhor nota no exame nacional. Temos de discutir este problema de forma aberta, pois os três anos do secundário são anos quase perdidos em que os alunos já sabem que só conta a obtenção de uma média. É um enorme constrangimento para os alunos e para um ensino que devia ir mais além da preocupação pela décima", afirma.
O presidente da ANDAEP pede diálogo para rever este modelo "entre o Ministério da Educação (ME) e os reitores das universidades. "O trabalho todo é feito por nós, no ensino secundário, e as universidades só abrem as portas. É isto que temos de discutir. Este problema também deveria ser um objetivo do atual ministro. O atual ministro deve promover esse debate", conclui.
Os exames nacionais do secundário mantêm-se só para acesso ao superior. As provas do 11.º e 12.º anos terão as condições excecionais aplicadas nos dois últimos anos letivos. Os alunos podem ir a exame só às disciplinas para melhoria de nota ou utilizá-las como prova de ingresso no ensino superior.
Habitualmente, a realização destes exames seria obrigatória e a nota obtida era contabilizada da classificação final à respetiva disciplina.
A CNIPE (Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação) vai mais além e quer, no imediato, que "todos os alunos tenham acesso ao ensino superior". Nestes anos de grandes constrangimentos por causa da pandemia, qualquer aluno deveria poder prosseguir estudos, independentemente das médias. Queremos que ninguém seja sacrificado", explica Rui Martins, presidente da CNIPE. Para o responsável, deve ser feita "uma reforma significativa no modelo de acesso ao ensino superior e, nesta situação de pandemia, com efeitos imediatos".