Desempregada e doente, Maria não deixou o filho viver

Ingestão de pesticida foi a forma usada por uma mulher madeirense, de 53 anos, doente de cancro e desempregada, para matar o filho de 11 anos e a seguir se suicidar
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Dois corpos, mãe e filho, na cama de um quarto, mortos por ingestão de veneno. Quando os bombeiros chegaram ao local, uma casa no Lombo de São João, freguesia da Ponta do Sol, Madeira, já não puderam fazer. A corporação dos Bombeiros Voluntários da Ribeira Brava recebeu o alerta às 02.30 de ontem, dado pela filha adulta de Maria Violante Pontes, que chegou a casa e encontrou os corpos da mãe e do irmão Gabriel, de 11 anos, disse ao DN o graduado de serviço dos bombeiros, José Ribeiro.

A mãe terá primeiro dado o pesticida ao filho e depois ingeriu o mesmo veneno para se matar. É a chamada "morte por misericórdia ou por altruísmo": tirar a vida a um filho por entender que este ficaria muito infeliz a viver sem si.

A Polícia Judiciária (PJ) do Funchal, que ficou a cargo da investigação, ainda não apurou se Gabriel tomou o pesticida num alimento e nem se apercebeu do que ia acontecer, ou se a mãe o forçou.

Pela casa, Maria Violante deixou "vários escritos" espalhados, como explicou fonte da PJ ao DN, nos quais justificava o ato trágico. Nessas cartas ou bilhetes à família, a mulher recordou que estava doente com cancro e desempregada. A agravar o quadro depressivo, o seu último companheiro, padrasto dos filhos, tinha-se suicidado recentemente. Maria Violante já estava separada do pai dos filhos.

Veneno: instrumento feminino

À frente, esta mulher só viu o abismo. Escolheu o veneno para matar Gabriel, provavelmente para o filho não perceber o fim que lhe estava reservado. "O veneno sempre foi uma arma ou instrumento feminino", descreve o psiquiatra forense Fernando Almeida, do hospital Magalhães Lemos, no Porto. "Quem utiliza o veneno parte do princípio de que este pode provocar uma morte menos atroz ou dolorosa". Esse princípio não podia estar mais errado. "A ingestão de pesticida provoca uma morte dolorosa. É um método muito usado nos países com algum atraso de desenvolvimento. Nos países mais desenvolvidos, são antes usados os medicamentos, nomeadamente barbitúricos, que não provocam uma morte tão angustiante", explicou ao DN uma fonte especialista em Medicina Legal, que preferiu não se identificar.

O veneno tem ainda o fator acrescido de "não requerer a mesma coragem que é preciso para o contacto físico com o corpo de outra pessoa através do uso de uma faca ou das mãos", comenta o psiquiatra forense Fernando Almeida. Este especialista sugere um quadro mais do que provável de "depressão grave" na vida de Maria Violante Pontes. "O seu ato aponta para um desespero que pode ou não ter contornos psicóticos". Nos casos de "morte por altruísmo", como este parece ser, a "mãe podia estar perfeitamente convicta, no sentido delirante ou psicótico, de que o filho iria passar muito mal se ficasse sozinho no mundo sem ela".

Mães que matam por depressão

Há dois anos, em janeiro de 2013, Eliana Sanchez, uma professora de Artes Visuais, de 40 anos, que sofria de depressão, matou os filhos, de 13 e 12 anos, com bolos envenenados e a seguir suicidou-se por asfixia, com um saco de plástico na cabeça, na mata da Cruz Quebrada em Oeiras. O tribunal tinha-a obrigado a entregar os filhos ao pai e estava proibida de os visitar sem supervisão. Eliana deixou três cartas a explicar o ato. Também em 2013, um mês depois, em fevereiro, uma professora de Matemática de 47 anos, foi vista a atirar o filho, de 12 anos, da janela do 4º andar de um hotel em Bragança, e a atirar-se de seguida para a morte. A mulher também deixou uma carta.

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