De aluna a presidente. "O Politécnico de Setúbal chegará a Sines e já tem presença no centro do país"

Tem pela frente, pelo menos, quatro anos na presidência do Instituto Politécnico de Setúbal (IPS) e, pelo meio, a fundação de uma nova escola superior. Com 24 anos de carreira no IPS, Ângela Lemos afirma-se preparada para "testar se é capaz" de gerir uma instituição presente num terço de Portugal Continental, através de 85 cursos.
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De aluna a educadora, como era o Instituto Politécnico de Setúbal entre 1987 e 1990?
Fui aluna do primeiro grupo de educadores de infância formados pelo IPS, com entrada em 1987. Nessa época, para mim, o IPS era apenas a Escola Superior de Educação, a funcionar em pequenas instalações e com um sentido muito familiar, embora as aulas do IPS já tivessem começado em 1981, na Escola Superior de Tecnologias.

Tínhamos dificuldade em entender o que era o ensino superior, porque estávamos deslocados dessa pequena comunidade já formada no campus da Estefanilha.
Só a meio do curso, quando também passámos para a Escola Superior de Tecnologias, começou a nascer uma comunidade académica. Num tempo em que ainda não havia educadores de infância com formação superior e lutava-se pelo reconhecimento da profissão, surgiram também obstáculos. Fomos a primeira fornada de bacharéis da região nesta área e nem sempre aceites para estágio, até porque quem nos ensinava não tinha formação superior. Um caminho longo até nos tornarmos finalistas, em 1990.

A presidência do Politécnico de Setúbal sempre foi uma meta?
Depois de ser aluna, em 1998 regressei ao IPS como professora. Desde o início da carreira mantive-me ligada à gestão de unidades curriculares, de cursos e, por fim, na direção da Escola Superior de Educação. O caminho e o conhecimento adquirido podiam levar-me à presidência do IPS.

Há quatro anos, Pedro Dominguinhos [ex-presidente do IPS] convidou-me para a vice-presidência do politécnico. Durante o tempo do seu último mandato começou a ser espectável que um dia eu passaria pela presidência. Quando a oportunidade surgiu tinha de saber se era capaz. Agora tenho quatro anos para testar.

Passados 35 anos desde o seu primeiro dia de aulas no IPS desbravou-se caminho para engenheiros, educadores, professores e gestores chegarem onde?
De algumas dezenas de alunos em 1987, passámos para cerca de 8200, em 2022. A relação com a região mantém-se a principal linha do Instituto Politécnico de Setúbal e, à medida que foram constituídas, as escolas foram moldadas às necessidades de talento na região. Hoje não temos só cursos "pronto a vestir", temos cursos "feitos à medida", alguns até voltados para parcerias específicas com empresas como a SONAE e a Deloitte.

O Instituto Politécnico de Setúbal chegará a Sines, onde nascerá a nova escola, e já tem presença no centro do país. O curso técnico superior profissional (CTeSP) na área da Aeronáutica coloca ainda o IPS em Ponte de Sor. Na captação de alunos, a Península de Setúbal continua como território principal, seguindo-se o Alentejo, mas já há quem venha dos concelhos do norte da Área Metropolitana de Lisboa, assim como do Algarve.

Em 2026, no final do seu primeiro mandato, o IPS será vizinho da Cidade do Conhecimento, um projeto futurista voltado para a captação desse talento formado de Sines a Tomar...

A Cidade do Conhecimento é um projeto muito ambicioso, mas tem todas as condições para sair do papel. O Politécnico de Setúbal é parceiro e espera que nesse espaço futurista a vivência seja muito voltada para os profissionais formados nas suas escolas. Um caminho que começámos a preparar muito antes das ideias fomentadas pela pandemia, quando implementámos formações b-learning, de regime presencial na prática em ambiente de trabalho e regime online nas aulas. Para concretizar o sonho da Cidade do Conhecimento, Setúbal tem de se abrir à área das Tecnologias da Informação e às novas gerações de trabalhadores. Assim como às inúmeras capacidades da frente ribeirinha. Uma mudança necessária, porque se enfiarmos investidores e profissionais no tecido industrial que temos hoje eles não permanecem.

Se tiver essa visão, a Cidade do Conhecimento será implementada com todo o apoio do IPS. Não se concretiza na totalidade até 2026, mas em 2030 estará a funcionar plenamente, com toda a certeza.

Para acompanhar este sonho, que licenciaturas e mestrados faltam Levar a cabo?
Precisamos de mais professores para implementar novos cursos, o país já está a ter problemas de recrutamento de professores. Para acompanhar esse mercado nacional e a nossa região vamos abrir mestrados para professores do 1.º e 2.º ciclo em Ciências e Matemáticas e em História e Geografia de Portugal.

O Plano de Recuperação e Resiliência tem um papel fundamental na reformulação académica, com financiamento para ajudar a implementar essas novas formações e outras já aprovadas, como o mestrado em Práticas Artísticas.

Com as escolas cheias temos ainda de repensar a nossa capacidade, o que pode passar por extinguir ou reformular alguns cursos.

Até porque indústrias como a de conversão de lítio, com um investimento de 700 milhões anunciado para Setúbal, também exigem essa adaptação.

E para quando uma renovação do campus?
No campus de Setúbal do IPS a novidade é a construção da Escola Superior de Saúde esperada há 20 anos e a funcionar sempre temporariamente no edifício da Escola Superior de Ciências Empresariais. Inscrita no Plano de Recuperação e Resiliência tem um financiamento de 4,5 milhões de euros. Está ainda prevista a construção de um edifício para empresas start-up, um laboratório de Desporto e outro de Audiovisual.

Fora de Setúbal, a Escola Superior de Sines é o maior investimento, com aprovação prevista ainda em 2022 e acesso a financiamento comunitário. Uma escola voltada para a tecnologia, engenharia, logística e energias renováveis que envolvem o porto de Sines e o litoral alentejano.

A nova escola será concretizável mesmo com a Península de Setúbal limitada no acesso a fundos comunitários?
Parte da Escola Superior de Sines será financiada por fundos do POR [Plano Operacional Regional] Alentejo, captados pela Câmara de Sines. Mas, a componente científica da nova escola depende de fundos comunitários captados por Setúbal. Por isso dizemos que o nascimento da Escola Superior de Sines também está pendente da alteração da NUTS [Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos] II e III em que a Península de Setúbal está inserida, para um modelo independente de Lisboa. Essa alteração permitirá acesso a maior financiamento comunitário. Uma promessa de António Costa que, a concretizar-se com o aval da Comissão Europeia, trará resultados a partir de 2027.

Nesse caso fica comprometida a candidatura ao quadro comunitário 2027-2034?

Para entrar nas negociações do Quadro Comunitário 2027-2034, que começam em já em 2024, temos de alterar a NUTS II e III no máximo nos próximos dois anos. Aguardamos resposta em contacto permanente com a Associação da Indústria da Península de Setúbal e com a ministra Ana Mendes Godinho, que tem apoiado muito esta causa.

dnot@dn.pt

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