Combate aos incêndios melhorou mas governo falhou medidas

Nem todas as recomendações que o governo se comprometeu a seguir depois dos trágicos incêndios de 2017 foram ainda cumpridas, alerta um relatório do Tribunal de Contas
Publicado a
Atualizado a

As boas notícias da auditoria do Tribunal de Contas sobre o "Dispositivo Especial de Combate aos Incêndios Rurais (DECIR)" são praticamente todas acompanhadas de um "mas".

Os juízes e peritos que analisaram os "progressos e vulnerabilidades" das medidas que o governo se comprometeu executar depois dos trágicos incêndios de 2017 consideram que "o planeamento e a execução do combate a incêndios rurais melhoraram, mas carecem de uma visão mais integrada e de melhorias de desempenho no terreno", porque esse "planeamento assenta nas disponibilidades das entidades intervenientes e em diretivas operacionais próprias de cada uma delas, que não são uniformes".

O relatório divulgado esta sexta-feira salienta como "aspetos positivos a resposta de todas as entidades em caso de necessidade, o desenvolvimento de ferramentas coordenadas de recolha de informação para apoio à decisão operacional, o empenhamento operacional durante o ano inteiro em função do grau de perigo de incêndio e a definição do pré-posicionamento de meios de acordo com esse mesmo grau".

No entanto, é destacada "a necessidade de melhorar a homogeneidade territorial do posicionamento estratégico, a capacidade para o ataque precoce aos incêndios e sua consolidação com a intervenção do combate noturno, bem como a antecipação da fase de ataque ampliado de acordo com a evolução do incêndio e respetivo dano potencial gerado".

Nesta auditoria é reconhecido que "os dispositivos de combate a incêndios rurais têm vindo a ser reforçados em meios humanos, terrestres e aéreos, tendo passado a organizar-se ao longo de todo o ano em função de níveis de empenhamento operacional", com destaque para o reforço acrescido da GNR, apesar dos bombeiros serem a "principal força que sustenta o DECIR", mas há um alerta para necessidade de mais formação.

"Sendo a inserção profissional e a qualificação dos meios humanos implicados no combate aos incêndios um aspeto chave, verifica-se que as medidas relacionadas com essa matéria apresentam uma execução de 50% e 70%, respetivamente, de acordo com o ponto de situação de setembro de 2020 da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Florestais", revela a auditoria, assinalando uma "deterioração do regime de voluntariado em termos de número de agentes e de formação dos mesmos" e um " limitado efetivo das forças profissionais de intervenção".

Na anterior legislatura o governo se comprometeu, através de uma Resolução de Conselho de Ministros, a 21 de outubro de 2017, a implementar várias medidas e que a auditoria constata que estão por cumprir.

"O Tribunal de Contas registou progressos (...) embora com persistentes vulnerabilidades, nomeadamente na gestão do território e da vegetação. (...) As medidas de prevenção e combate aos incêndios decididas em 2017 ainda não foram completamente concretizadas e várias áreas carecem ainda de aperfeiçoamento, mesmo tendo havido reforço dos meios humanos, terrestres e aéreos afetos ao combate a incêndios e melhorias no respetivo planeamento e coordenação".

Uma das medidas cuja execução também tarda é a da transferência dos seis helicópteros Kamov para a Força Aérea, determinada pelo governo desde 2018 e que estão parados à guarda da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil há três anos.

A 24 de fevereiro último, o ministro da Defesa Nacional, proferiu um despacho a determinar que a FAP "assuma a responsabilidade pelos trabalhos necessários à execução da auditoria e à avaliação sobre as condições de aeronavegabilidade e o consequente plano técnico e financeiro para reposição da condição de voo das aeronaves, por forma a garantir a operacionalização da transferência dos seis helicópteros Kamov".

O Tribunal reitera "a importância de solucionar esta situação dentro de um horizonte temporal definido", não deixando de notar que "o despacho do ministro da Defesa Nacional não define o prazo para a realização daquelas operações".

Uma nota positiva vai para o SIRESP, o sistema de comunicações de usado pelos agentes da Proteção Civil, com os auditores a considerarem que "satisfaz atualmente as principais necessidades de comunicação de emergência", registando que "as falhas ocorridas até 2017 foram corrigidas com a implementação de sistemas de redundância de transmissão e de energia" e que "desde 2018 que não há interrupções significativas".

Para Duarte Marques, deputado social-democrata que mais se tem dedicado a esta área, a auditoria sobre o DECIR "vem comprovar que tudo o que o PSD tem dito e alertado se verifica: desde a enorme fragilidade que ainda se verifica de formação nos bombeiros, que foi considerada crucial, à incoerência territorial, no sentido de que todos os agentes de proteção civil possuam a mesma organização, passando pela situação inacreditável dos Kamov".

Para o deputado "esta auditoria vem destapar a careca ao ministro Eduardo Cabrita". Reconhece que "houve melhorias - outra coisa não seria admissível depois do que aconteceu em 2017 - mas continua-se a multiplicar recursos e forças que em vez de trazer tranquilidade têm sido potenciadoras de conflitos".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt