Béhen. "Quatro anos não é nada nesta indústria, porque estamos sempre a aprender"
Rita Chantre / Global Imagens (Arquivo)

Béhen. "Quatro anos não é nada nesta indústria, porque estamos sempre a aprender"

Joana Duarte, a criadora do projeto Béhen, apresentou este domingo na ModaLisboa a sua coleção FW24/25, intitulada Não Te Quero, revela-se uma contradição relativamente às coleções anteriores e uma celebração dos quatro de marca.
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Porquê a escolha do nome Não Te Quero para a nova coleção que apresentou na ModaLisboa?
O nome em si é um bocadinho uma contradição àquilo que fizemos nas coleções passadas. Isto porque eu encontrei um um saquinho que tinha exatamente as palavras Não Te Quero bordadas. Isso é o oposto das peças que normalmente encontro porque normalmente os bordados do meu arquivo são feitos muito na base no querer. Portanto, quero-te muito, amo-te muito, amizade são coisas que costumam estar nos bordados. E este dizer exatamente Não Te Quero é peculiar porque deu imenso trabalho só para dizer Não Te Quero. Portanto, achei interessante ser o oposto daquilo que normalmente encontro.

Qual é que foi o maior desafio no processo criativo?
Todas as técnicas com que nós trabalhamos são sempre um desafio. Mesmo aquelas com que já estamos habituadas a trabalhar há muito tempo, não deixam de ter as suas complicações. Por exemplo, nós nas últimas seasons temos estado a apostar em trabalhar com materiais diferentes. Portanto, no caso do bordado à madeira que normalmente é feito sobre o linho ou sobre o algodão, nós estamos a tentar introduzir materiais que são desenvolvidos industrialmente. Por exemplo, a season passada trabalhámos com a cortiça, e esta season estamos a trabalhar com ganga, e são materiais que as senhoras, as bordadeiras, nunca tinham sequer experimentado trabalhar. O maior desafio é, sem dúvida, trabalhar com as técnicas e a pressão do tempo. Isto são coisas que demoram muito tempo a serem desenvolvidas, não só os desenhos, mas o próprio bordado em si. Estamos a trabalhar com os bordados da Glória do Ribatejo, que é muito tradicional e quase ninguém conhece.

Relativamente aos materiais, para além da ganga, quais foram os mais utilizados? 
Na verdade já tínhamos trabalhado com ganga antes, mas nunca com os bordados.Então queríamos desafiar também as bordadeiras a trabalhar com este material. Mas também introduzimos a lã, que também nunca tínhamos trabalhado.Os dois materiais principais foram sem dúvida a ganga e a lã. Foi o que apostamos mais nesta coleção.

Quais são as peças destaque desta coleção? 
Todas as peças são diferentes umas das outras. É muito difícil, mesmo para mim, quando estou a criar uma coleção, conseguir repetir o mesmo estilo de peça, as mesmas cores, o mesmo tipo de técnica. Portanto, destacar só uma peça seria ingrato para as outras, porque são mesmo pensadas uma a uma e não só na coleção geral. Mas sem dúvida que o bordado da Glória do Ribatejo, porque foi a primeira vez que estamos a trabalhar com ele. 

O projeto Béhen faz este ano quatro anos.Esta coleção acaba por também ser uma forma de comemoração de quatro anos da marca? 
Sim, mas quatro anos não deixa de ser algo muito recente. Quatro anos não é nada nesta indústria, porque estamos sempre a aprender. Acho que cada coleção é mesmo uma aprendizagem daquilo que foi as últimas. Em termos da coleção em si, nós focamo-nos, desde o ano passado, no desenvolvimento das silhuetas e revisitar aquilo que para nós eram as peças-chave. Portanto, há aqui um trabalho muito grande, desde o ano passado, a revisitar e a melhorar algumas peças que já temos desenvolvidas.

A sustentabilidade é algo que faz parte do vosso processo criativo? 
Sim, mas podemos apontar aqui uma sustentabilidade em termos ambientais, nas coisas materiais e na parte social através do trabalho com estas técnicas e com comunidades.É claro que depois os materiais, em termos de sustentabilidade ambiental, também é fundamental, porque é o que faz sentido para nós enquanto projeto. 

Há uma grande aposta em técnicas tipicamente portuguesas, principalmente nos bordados. Porquê essa aposta? 
Isto está relacionado com a origem do projeto em si. Eu venho de uma família de bordadeiras que estão ligadas a estas artes e para mim fazia sentido de mostrar, principalmente à nova geração e às minhas irmãs estas técnicas. Quando criei o projeto, percebi que as minhas irmãs não demonstravam algum interesse pelo enxoval da família. A minha avó e a minha bisavó deixaram muitas coisas e depois estavam sempre a pensar que ia tudo desaparecer, que ninguém queria aprender e que as coisas iam para o lixo. Então, quando o projeto começou, foi nesse sentido. E depois o projeto evoluiu, não é? Não comecei logo a trabalhar com candidatos de artesãos pelo país inteiro. Isto depois foi uma rede que se foi criando.

Qual o objetivo desta coleção? 
Acho que o nosso objetivo, que continuamos a desenvolver, é que seja uma coleção divertida, no sentido em que, comparando com a última coleção, não é tão pesada, em termos de conceito. É mais divertido. Nós só apresentamos na ModaLisboa uma vez ao ano, porque é o que faz sentido também para o projeto e porque demora muito tempo a planear estas técnicas todas e a trabalhar com elas e a convencer as artesãs a fazerem as coisas nestes materiais. E isso demora muito tempo, mesmo a própria pesquisa no terreno, onde há todo um contexto também cultural que eu tenho que ter em conta.

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