Autotestagem é "muito importante para termos a sociedade o mais possível rastreada"
A testagem massiva é fundamental para o controlo da infeção por SARS-Cov-2 e da pandemia. Isto mesmo disseram os especialistas no início de fevereiro quando os casos de infeção começaram a descer em Portugal e se começou a falar na necessidade de se preparar o desconfinamento. Foi numa reunião do Infarmed que o epidemiologista da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Manuel Carmo Gomes referiu a medida como uma estratégia fundamental. A ministra da Saúde, Marta Temido, aceitou e de imediato solicitou à Direção-Geral da Saúde que alargasse os critérios para a testagem integrando todos os contactos, quer de maior ou menor risco, dos casos positivos.
Hoje já não se fala de desconfinamento sem testagem massiva, porque, como explica ao DN o coordenador da task force criada para esta semana pelo governo para trabalhar nesta área, esta "nos permitirá criar mecanismos de antecipação à possível ação do vírus". Fernando de Almeida, presidente do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge, (INSA), sublinha: "O nosso objetivo é criar uma estratégia massiva e sistemática, com planeamento, inclusiva e participativa, que envolve todas as populações e todas organizações dos vários setores, para que possamos detetar o mais rápido possível situações de surto e quebrar as cadeias de transmissão."
A primeira reunião formal deste grupo decorreu ontem no INSA com o objetivo de definir tarefas, de alinhar prioridades e formas de atuação, na próxima semana voltarão a reunir-se para definir estratégias, mas como diz Fernando de Almeida já há trabalho feito nesta área, até porque "o despacho publicado esta semana pelo governo só vem formalizar um trabalho que já vinha a ser desenvolvido há muito pelas mesmas entidades e do qual é exemplo o rastreio de testagem nos serviços de saúde e nos lares, nas prisões e nas escolas".
O objetivo imediato é mesmo "antecipar-nos sempre ao vírus. Este tem uma palavra a dizer, mas estou convencido que com uma testagem com critério e com planeamento, sabendo para onde vamos, e é para isso que todos vamos trabalhar, que conseguiremos resultados" no que respeita ao controlo da doença.
O coordenador da task force diz estar otimista na missão que tem pela frente e nos resultados que poderão ser obtidos, senão não teria aceite o convite que lhe foi endereçado, acreditando plenamente na colaboração dos portugueses e de todas as instituições dos vários setores no sentido de uma ação concertada para a promoção de uma estratégia para a testagem massiva e sistemática. Só desta forma, e como têm explicado os especialistas, é possível identificar casos assintomáticos que possam passar despercebidos no sistema de controlo da doença. Por isto mesmo uma das missões da task force "é a elaboração de uma estratégia de promoção de testagem massiva e sistemática para que o país à mínima alteração da situação epidemiológica possa desencadear uma atuação rápida".
Uma estratégia que irá assentar em três eixos de intervenção. A saber: rastreio generalizado, dirigido e programado. O primeiro tem por base a autotestagem que, segundo Fernando de Almeida, "depende mais do sentido de cidadania e da vontade individual de cada um, mas que será muito importante para termos a sociedade o mais possível rastreada". Neste sentido, assume ao DN que "todos desejamos que os autotestes cheguem o mais rápido possível ao mercado e às farmácias".
O segundo tipo de intervenção será dirigida para populações mais vulneráveis, como trabalhadores sazonais, migrantes, sem-abrigo, populações com maior dificuldade no acesso aos serviços de saúde e, portanto, que correm maiores riscos. Ou seja, será uma testagem para grupos específicos de forma a ser possível "detetar precocemente alguns casos ou surtos e atuar rapidamente".
O terceiro e último tipo de rastreio, designado como programado, dirige-se a serviços e a profissões mais expostas ao risco, como na área da saúde, ensino, segurança, em que tem de haver testagem frequente de tanto em tanto tempo. "É o caso da testagem que tem estado a ser feita nas escolas ao pessoal docente e não docente e alunos."
À task force, e segundo explicou o coordenador, compete redirecionar a testagem conforme a situação epidemiológica. "A nossa ação terá sempre que ver com o fator prioridade e com a situação epidemiológica do país. Se houver maior incidência numa freguesia ou num concelho é aqui que me dirijo, se houver maior incidência nos transportes públicos ou no meio laboral é para aqui que terá de ir a atenção das equipas de testagem."
Por isto mesmo, Fernando de Almeida sublinha que é preciso ter a noção de que esta task force não é um grupo de trabalho que irá realizar testes. Cabe-lhes "definir estratégias e planear". A execução terá de ser levada a cabo por todas as entidades existentes na sociedade desde as privadas, como empresas, que terão de ter um programa de testagem, até às do setor social, como misericórdias e IPSS, e às do Estado, administração central e local, como ministérios e autarquias.
"Cada um terá o seu papel e responsabilidade", refere o coordenador, sublinhando que ao nível de instituições "os ministérios têm já modelos e programas de testagem, empresas como CP, Fertagus e outras também".
Mas esta estratégia exige ainda que "todos resultados sejam notificados. É fundamental para sabermos o que estamos a fazer e como os profissionais de saúde que estão no terreno podem atuar rapidamente", argumenta Fernando de Almeida, que, explica ainda que não se trata de uma obrigação, mas acredita que mesmo a nível individual, os portugueses que se dispõe a fazer um autoteste depois irão fazer a notificação do resultado quer seja negativo ou positivo. "Confio nos portugueses, se uma pessoa faz o teste é porque a sua motivação o levará também a proceder à notificar dos resultados. É uma confiança óbvia que se está a dar às populações."
No fundo, o objetivo desta task force é fazer cumprir o que já há muito também estava indicado como fundamental para o controlo da doença: "Alargar a testagem a toda a população."