Natural de Coimbra e filho de professores da escola pública, André Pestana, de 45 anos, é o novo rosto da luta dos professores. O coordenador nacional do S.T.O.P é professor contratado há 21 anos e passou por dezenas de escolas desde que terminou o curso de Biologia. Um percurso igual ao de milhares de docentes de "casa às costas" que o levou à criação, em 2018, do sindicato que tem estado na origem da maioria das ações de protesto dos professores este ano letivo..André Pestana começou como estudante de Bioquímica, em 1995, mudando para o curso de Biologia (via ensino) dois anos depois. Na Universidade de Coimbra já era conhecido pela sua veia reivindicativa, tendo feito parte de listas para a Associação Académica, mas acabou por não concordar com alguns dos métodos da associação e criou listas alternativas, juntamente com o ex-ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues. "Éramos relativamente próximos, mas houve um afastamento natural", conta ao DN. Afastamento que surgiu quando Tiago Brandão Rodrigues assumiu a pasta da Educação e, segundo André Pestana, "revelou falta de cultura democrática".."Quando se rouba tempo de serviço e se manda inspetores para as escolas para controlar quem fazia greve em 2018, é impossível passar em branco. Durante 18 meses, o S.T.O.P deixou de ser convidado pelo Ministério da Educação (ME) para as reuniões onde estavam as outras plataformas sindicais. Não quebramos nenhuma lei. Podemos ter diferenças de opinião, mas não podemos intimidar as pessoas", sublinha..Ainda nos seus primeiros anos de ensino e devido à elevada média de licenciatura que tinha, o dirigente do S.T.O.P ganhou uma bolsa de doutoramento, o que o levou a fazer trabalho de investigação na Amazónia. Diploma que não lhe trouxe vantagens porque as novas certificações só contam para efeitos de progressão na carreira quando os docentes efetivam. Se já forem doutorados antes do ingresso nos quadros, o doutoramento não conta para subida de escalão. "A argumentação do ME sobre excelência não corresponde, por isso, à realidade", afirma..André Pestana ainda não ingressou na carreira e é professor contratado, tendo passado por escolas em Serpa, Cascais, Lisboa, Oeiras, Montemor-o-Velho, entre outras. Com dois filhos pequenos, faz questão de dizer que há milhares de professores na mesma situação, que "quase pagam para trabalhar e estão afastados da família"..O dirigente sindical explica que foi sentido e ouvindo as dificuldades dos colegas nas escolas por onde passou, o que o levou, em 2017, a fazer um manifesto para inquirir se havia necessidade de criar um novo sindicato, com "uma forma diferente de fazer sindicalismo e onde o processo de decisão seria completamente democrático e apartidário". Subscreveram o manifesto cerca de 200 docentes e a criação do S.T.O.P tornou-se real em fevereiro de 2018.."Só avançámos porque vimos que havia recetividade. Se não tivéssemos recolhido tantas assinaturas, não teríamos decidido avançar. O feedback que tínhamos era o da vontade de pautar pela diferença. A título de exemplo, nesta greve que iniciámos a 9 de dezembro, a forma de luta foi decidida por sondagem e todos os professores, sindicalizados ou não, puderam dar a sua opinião. A forma escolhida até nem era aquela que o S.T.O.P defendia, mas a democracia é isto mesmo", justifica..Uma das primeiras lutas daquele que é o mais recente de 23 sindicatos existentes no setor da educação, foi a tentativa de acabar com o amianto nas escolas. Seguiu-se a greve às avaliações, a medida que trouxe "notoriedade ao S.T.O.P"..Sobre o que tem levado tantos docentes a aderir aos protestos organizados pelo S.T.O.P, André Pestana não tem dúvidas. "Acredito que é esta forma diferente de sindicalismo que leva tantos colegas a juntar-se às nossas iniciativas. Os nossos aparelhos de som estão disponíveis para qualquer colega, o que não acontece com os outros. Foi o que fizemos na manifestação de 17 de dezembro. Qualquer pessoa podia falar, não só professores, como alunos ou pais. Uma prova de que não temos uma agenda secreta. Na manifestação, as pessoas levaram os seus próprios cartazes, não os de sindicatos e todos tiveram voz. As pessoas sentem que não há controlo, sentem que connosco é diferente, é apartidário e todos os que defendem a escola pública são bem vindos", explica..O S.T.O.P tem nove dirigentes e o coordenador nacional é o único que está inteiramente dedicado ao sindicato. Algo que só poderá acontecer por tempo limitado, visto que os estatutos apenas permitem mandatos de 9 anos. "No S.T.O.P ninguém faz carreira de dirigente sindical e somos o único sindicato com mandatos finitos. Mais cedo ou mais tarde teremos de voltar às escolas e o que ganharmos ou perdemos na luta pela classe será igual para nós", explica André Pestana..André Pestana diz que tem sido acusado de pertencer "a este ou aquele partido". Na última manifestação de professores, o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, cumprimentou o dirigente. Um momento registado pelas televisões que levou à suspeita de ligações ao PSD. Contudo, o histórico político de André Pestana é de esquerda..O líder do S.T.O.P esteve vários anos na JCP, de onde saiu por ser "completamente contra o apoio ao antigo bloco de Leste e ao que se passava em países comunistas". Esteve, depois, na fundação do Bloco de Esquerda", em 1999. "No início foi uma lufada de ar fresco na política portuguesa, mas a forma como veem o sindicalismo, com uma perspetiva de controlo do movimento sindical, levou-me a sair. Saímos cerca de 200 e tal e fundámos o MAS (Movimento Alternativa Socialista) que claramente tem como uma das linhas mestras a separação total dos sindicatos. Quem decide as lutas dos professores são os professores e quem decide se cedemos a um acordo são os professores e não o sindicato. É fundamental esta independência", sublinha. Sobre o "episódio" com Carlos Moedas, André Pestana afirma ver com bons olhos que qualquer partido (exceto o Chega) se junte à luta dos professores na defesa da escola pública..Garcia Pereira, ex-dirigente do MRPP, e uma das vozes do S.T.O.P foi um dos "convidados" a falar aos manifestantes, há duas semanas. Também Santana Castilho, professor universitário e antigo membro de um governo do PSD, tem defendido a luta do S.T.O.P. Para o líder do sindicato, apenas o Chega não tem lugar numa luta que "é de todos". "Não aceitamos partidos racistas e xenófobos", sublinha André Pestana..Quem conhece o coordenador nacional do S.T.O.P caracteriza o sindicalista como "um professor igual aos outros, que sente na pele a dificuldade da docência e que luta por todos e não por convicções políticas". "Não sou sindicalizada, nem nunca fui. Sempre olhei para sindicatos com desconfiança, por acreditar que existe uma agenda política por trás das suas ações. Algo que mudou, para mim, em 2018, quando surgiu o S.T.O.P e conseguiu dar voz aos nossos problemas. O André tem um perfil diferente e olhamos para ele como um colega. Ouve o que temos a dizer e decide de forma democrática. No fundo, era o que devia acontecer em todos os sindicatos", diz Maria Silva, professora do 1.º ciclo..Apesar de não ser sindicalizada, a docente tem marcado presença em encontros virtuais, de onde partiram as decisões de greve este mês e as que irão acontecer em janeiro. Mês que ficará marcado também por uma marcha pela escola pública (dia 14) e pela greve de pessoal não docente. Recorde-se que o S.T.O.P mudou recentemente de nome. Passou de Sindicato de Todos os Professores para Sindicato de Todos os Profissionais de Educação..O líder do S.T.O.P vai processar o ministro da Educação, depois de João Costa ter afirmado que a manifestação de professores, a 17 de dezembro, foi convocada com base numa mentira. Em causa está o novo modelo de concurso de professores, que passará, alegadamente, por um processo de municipalização da contratação. "Isso é falso e o líder do sindicato que convoca esta greve sabe que é falso. Já lhe foi dito olhos nos olhos que é falso, mas ele insiste em mentir e por isso só podemos repudiar uma campanha assente na mentira, na desinformação e na manipulação da opinião dos professores", afirmou o ministro..dnot@dn.pt