Investigadores da PJ: "Parece que o PS tem uma fixação em controlar a investigação criminal"
António Costa decidiu transferir as bases da Europol e da Interpol, que estão na PJ, para o Sistema de Segurança Interna, sob sua tutela
"Perplexidade" é a primeira palavra do comunicado, de seis páginas, da Associação Sindicato dos Funcionários de Investigação Criminal (ASFIC), que representa os inspetores da Polícia Judiciária (PJ). Em causa está a decisão, tomada esta semana pelo Conselho Superior de Segurança Interna
(CSSI), presidido pelo primeiro-ministro, António Costa, de transferir as bases de dados da Europol e da Interpol, atualmente localizadas na PJ, para a tutela da secretária-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI). "Parece que o PS tem uma fixação em controlar a investigação criminal", lamenta o presidente da ASFIC, recordando o "pecado original" que foi a criação do próprio SSI, "no tempo em que era primeiro-ministro José Sócrates".
Esta medida decorre de orientações europeias que visam centralizar estes canais internacionais de cooperação numa só estrutura para melhorar a coordenação da informação transmitida. O SSI já tem sob a sua égide o gabinete Sirene, que contém dados relativos à circulação de pessoas no espaço Shengen. Uma vez executada a decisão do governo seria criada nesta estrutura, atualmente dirigida por uma magistrada (a procuradora-geral adjunta Helena Fazenda) um "Ponto de Contacto Nacional Único", agregando todos os canais de cooperação policial internacional. Praticamente em todos os estados-membros ele já existe. Em países próximos do nosso, porém, não está localizado numa estrutura político administrativa como é o SSI, mas na dependências da polícia de investigação criminal.
Daí a "perplexidade" dos inspetores, considerando a decisão "um atentado à integridade da investigação e uma mutilação da PJ". A ASFIC sublinha que a informação criminal, seja a constante das diversas bases de dados das polícias, seja a resultante do intercâmbio do GNI e da EUROPOL abrange dados em segredo de justiça, motivo bastante, para não poder ficar na dependência, ser gerida e controlada por um órgão dependente do poder executivo". Os investigadores que lideram a investigação criminal dos crimes mais violentos, graves e complexos - aos quais diz respeito a esmagadora maioria dos dados trocados pela Europol e Interpol - consideram que "é politicamente errada e perigosa para a democracia, potencialmente violadora de um principio básico de um Estado de Direito, o da separação dos poderes, a concentração deste poder (o da informação criminal naquelas várias vertentes) num órgão que depende diretamente do Primeiro-Ministro, o qual, desta forma, pode se quiser e quando quiser, com os laços de dependências que sempre se criam, invadir o território da investigação criminal e da Justiça, mesmo que jure que nunca o fará ou que nunca o fez".
Argumentos "falaciosos" e o "pretexto" do terrorismo
Para os investigadores da Judiciária " "o incremento do terrorismo "jihadista" no "coração" da Europa, "transformou-se" no pretexto perfeito para fazer vingar uma resposta com soluções de natureza securitária/militarista, em detrimento duma resposta judiciária, que, por discreta, consideram branda e ineficaz". Contestam um a um os argumentos, no seu entender "falaciosos", que têm sido utilizados "para justificar a decisão".
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Primeiro, "para a criação do orgão (SSI), em que se reclamava por uma maior cooperação e articulação entre os diversos Órgãos de Polícia Criminal; agora, e sem que se tenha feito uma necessária e rigorosa avaliação da utilidade dessa inovadora criação, o argumento é o da necessidade de partilha da informação criminal".Só que, sublinham,"é importante que se perceba que essa informação, a que circula nos canais da Cooperação Internacional e que agora se pretende extorquir à Polícia Judiciária, são informações que maioritariamente respeitam aos crimes mais graves, complexos e organizados que são da sua exclusiva competência e que nunca esteve em causa a sua partilha, porque nunca a PJ se negou ou poderia negar-se a partilhá-la! Aliás, foi a própria PJ que sugeriu a criação da UCAT (Unidade de Coordenação Contra-Terrorismo), que visa unicamente a cooperação e a partilha de informação".
Para sustentar, com factos, a sua posição, apresentam números oficiais sobre o número de pedidos feitos por outras polícias às estruturas de cooperação internacional da PJ:à Europol apenas 24% do total (76% foram da PJ), à Interpol apenas 26% (74% foram da PJ).
Terminam com um apelo ao diretor nacional da PJ, Almeida Rodrigues, para que reaja à "afronta" que se prepara, garantindo que terá o "apoio incondicional da ASFIC, o mesmo é dizer que do investigadores criminais". E outro Pa Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem: "esperamos de si a necessária acção conformadora destinada à reposição, afirmação e reforço dos valores essenciais para que no nosso País continue a existir uma investigação criminal rigorosa, isenta e por isso confiável e de referência como até aqui".