Espião: investigação sem acesso a dossiers secretos NATO

Primeiro-ministro António Costa felicitou as autoridades policiais e judiciais portuguesas pela detenção do espião do SIS, em Itália, quando vendia segredos a um agente russo
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Os investigadores do caso "Top Secret"- que levou à detenção de um espião português que vendia segredos à ex-KGB - podem vir a deparar-se com um problema, semelhante ao que tem acontecido com o segredo de Estado, no caso de Jorge Silva Carvalho. Parte dos documentos apreendidos e que constituem a parte mais forte da prova contra Frederico Carvalhão Gil têm origem na NATO e as regras de segurança são muito apertadas: só quem tem uma credenciação específica do Gabinete Nacional de Segurança (GNS), entidade que é a "guardiã" dos segredos das organizações internacionais a que Portugal pertence, como a Aliança Atlântica ou a União Europeia (UE), é que os poder ler.

Será uma situação que a PJ pode até resolver, bastando para isso credenciar no GNS os inspetores da Unidade Nacional de Contraterrorismo, responsável pela investigação, mas o caso complica-se quando os documentos tiverem de ser incluídos no processo para ir a tribunal, podendo, portanto ser acessíveis a mais gente, como os advogados. E o processo de credenciação é complexo. Implica por exemplo, diz a lei, "determinar se o interessado é de lealdade e honestidade indubitáveis" (ver texto ao lado).

O DN contactou o GNS para que explicasse como pode ser ultrapassada esta questão, mas não obteve resposta. Também não foi possível saber se e quando o GNS foi informado da quebra de segurança no SIS.

Segundo a lei, o GNS, que funciona na tutela direta de Maria Manuel Leitão Marques, a ministra "Simplex" da Presidência, devia ter sido "imediatamente" informado quando houve suspeita de que o espião podia ter tido acesso aos documentos NATO para os passar aos russos. É o GNS quem tem de responder à NATO pela segurança dos documentos desta organização.

Extradição pode demorar

Mas há outras questões burocráticas que podem atrasar o processo. O Ministério Público e a PJ admitem que os processos de extradição do espião português e do seu contacto russo poderão demorar vários meses nos tribunais italianos. O regime de cumprimento dos Mandados de Detenção Europeu, emitidos para ambos os suspeitos, são idênticos a Portugal, porém, um procurador do MP disse ao DN que tudo dependerá da forma como correr o processo em Itália, sobretudo se ambos os suspeitos forem representados por advogados capazes de levantar todo o tipo de problemas legais.

De acordo com informações recolhidas pelo DN, Frederico Carvalhão Gil e o cidadão russo vão ser ouvidos por um juiz de uma "Corte d"Appello" de Roma, o equivalente a um Tribunal da Relação em Portugal. Depois de lhes terem sido comunicados os factos, os suspeitos dispõem de um prazo para responder e manifestar-se contra o cumprimento do Mandado de Detenção Europeu. Os juízes da "Corte d"Apello", após a resposta, decidirão se estão ou não cumpridos todos os requisitos legais para a "extradição" dos suspeitos para Portugal. Sendo que, desta decisão, os arguidos ainda podem recorrer para a Corte Suprema de Cassazione, o supremo tribunal italiano. No mandado de detenção europeu, os procuradores Vítor Magalhães e João Melo do Departamento Central de Investigação e Ação Penal alegaram que estavam em causa crimes de espionagem, violação do segredo de Estado, corrupção e branqueamento de capitais.

O primeiro-ministro elogiou o "sucesso" da operação e garantiu não haver motivos para preocupação sobre o nível de segurança e a qualidade dos serviços. Foi um caso único", sublinhou Costa.

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